AS RELIGIÕES ABRAÂMICAS CONTRA A GRANDEZA DE DEUS
Voltando
a questão da visão da propriedade de deus, a posição judaica
sobre esse tema seria irrelevante se não tivesse sido estendida para
a teologia cristão, como explicarei a seguir. O judeus são menos
que um traço na estatística, conforme eu mostrei no início, o que
eles criaram para eles mesmo não faria a menor diferença ao mundo.
Mas essa visão fechada deles fez diferença, porque foi a partir
dela que surgiu o cristianismo e essa corrente influencia 55% da
humanidade e o cristianismo é proselitista.
Dessa
forma, para chegarmos a origem do problema que estou tratando aqui,
temos que descobrir como os judeus chegaram a essa posição
da propriedade de deus.
Depois
de tanto texto, vale relembrar o que eu chamo de propriedade de deus.
A bíblia reflete uma visão personalizada de deus. Ela inicia
descrevendo deus como o supremo que criador de tudo, do universo
inteiro da terra e da humanidade e todos o seres que aqui habitam,
mas, esse deus supremo, se dirige diretamente a este povo específico,
os judeus, dizendo que entre tudo o que ele criou eles eram os
escolhidos dele.
Essa
escolha faz deles especiais em detrimento ao resto da humanidade.
Esse
deus passa então a se dirigir a eles e orientar os passos deles em
um rumo planejado a uma coisa boa, mas, que em troca, exigia deles
adoração única a ele, o verdadeiro deus, o cara.
Assim,
o deus supremo que criou tudo e todos, o senhor dos céus e da
existência dirige os judeus contra o resto da humanidade ou apesar
do resto da humanidade. As demais pessoas e povos passam a ser
opositores que precisam ser superados e vencidos, pelo preferidos,
sem uma razão específica.
O
deus supremo vira um “coach” dos judeus, com sucessivos profetas.
Mas um deus com poderes finitos e limitados. Ele não consegue mudar
nada sozinho, não estala o dedo, pisca os olhos ou torce o nariz
para realizar nada. Em determinados momento cria pragas, manda anjos
que matam milhares de inimigos, derruba muralhas, mas, em outros
precisa que os judeus façam o trabalho sujo e depende 100% da boa
vontade dos judeus fazerem as coisas.
Ele
tem que convencer os judeus a fazer o que ele quer e muitas vezes os
judeus não concordam e fazem o que acham certo e não o que deus
disse.
Ele
também se preocupa em mandar matar 1 homem que não cumpriu o
sábado, recrimina outro porque errou nas instruções de oferendas e
é o tempo todo contrariado pelo povo judeu, que apesar de tudo o que
ele faz continua deixando ele para lá. Esse deus supremo parece
demonstrar um poder limitado, sempre para punir.
Posso
estar exagerando um pouco, mas, uma leitura literária da bíblia, do
AT, com sinceridade, mostra 2 coisas. A primeira é um deus pessoal,
dedicado aos judeus. Supremo na definição deles, mas, pessoal e
restrito na dedicação aos judeus. De outro lado, para mim, a
descrição do AT, não mostra um deus supremo. Mais uma vez, a
leitura literária, me mostra um Djinn, tipo o que sai da garrafa,
faz desejos, tem reações humanas, quer ser bajulado, etc. Me mostra
um deus sem o domínio do todo de fato e inicialmente muito ocupado
com os judeus, mas, depois enjoa e se afasta um pouco.
Lembro
que o relato da Torat é absolutamente tardio e mitológico. Se você
esquecer o Genesis, não sei se pelo resto do relato você
identificaria um deus supremo ou um deus menor. Pense nisso.
Mas,
o ponto aqui é que os judeus definiram em seu livro sagrado, a Torat
que virou a Bíblia, um deus que lhes é pessoal e assim se afasta do
que qualquer pessoa com um pouco de bom senso poderia fazer de um
deus supremo, um deus de todos e de tudo.
Lembro
a todos que, em termos de religião, não existe nenhuma garantia de
nada e não tem nada sagrado, porque a religião, os textos e a
teologia são processos humanos, o que é sagrado é deus. O AT
mostra basicamente, no pentateuco, as instruções de deus para o
povo deles e, esse, sem dúvida, é o livro mais importante deles.
Mas a religião judaica não está contida nesse livro e é
estruturada com muito mais livros e relatos dependendo da corrente ou
seita judaica.
Muitos,
hoje, acreditam na versão de que a bíblia é um livro antigo
escrito pelos próprios personagens, que mostra a história como ela
ocorreu de verdade. Existem arqueólogos que andam com a bíblia
debaixo do braço para demonstrar através de supostas descobertas
que a bíblia é um relato verídico e não apenas mitos.
Atenção,
essa é uma preocupação que somente judeus e cristãos têm. As
demais religiões não estão preocupadas se seus relatos são reais
ou mitológicos.
Aqui
temos, então, a primeira peça deste jogo. Para eles e para muitos,
a bíblia é documento, é a história como ela ocorreu. Essas
pessoas não conseguem separar o que é história de teologia.
Contudo a realidade é que a bíblia é um relato teológico e
mitológico, com personagens misturados com pessoas, mitos com
história. Os judeus e também os cristãos, se consideram diferentes
das demais religiões por causa disso, eles são melhores porque não
tem um livro de mitos simbólicos e fantásticos como as outras
religiões, eles têm a bíblia e também o próprio deus que foi até
eles.
A
verdade, contudo, é outra. A Torat não foi escrita pelos nomeados
autores dos livros. Moisés nunca escreveu nada, nem Salomão, nem
Davi. Esses 2 últimos, apesar de sua importância não têm
registros históricos de existência. A Torat foi escrita no século
V AEC e, assim, é absolutamente recente considerando os 6.000 anos
de história que ela deveria retratar. Nenhum dos personagens
originais escreveu nada. Todos os personagens eram analfabetos e não
tinham acesso à escrita. Papel era inexistente. Papiro era caríssimo
e a tinta mais cara ainda. Escrever e ler era um luxo de ricos e de
reis, saber ler não tinha utilidade.
O
AT é uma produção literária milimetricamente desenhada
posteriormente. A bíblia, na verdade, é composta de mitos
teológicos misturados ou romantizados com história e com mitos
vindos de outros povos. É um livro importante, mas, não é história
e ali não está a palavra de deus.
A
bíblia não é diferente dos livros sagrados de outras religiões e
os livros vedas são mais antigos e mais originais.
O
meu objetivo aqui ao fazer essas afirmações é nivelar as coisas. O
judaísmo e o cristianismo não são diferentes de outras religiões.
O livro sagrado deles não é diferente de outras religiões.
Em
relação ao monoteísmo, apesar do que está escrito na bíblia
falar outra coisa, os judeus continuaram sendo politeístas, mais
provavelmente henoteístas ou no final monolatristas por milhares de
ano, somente se convertendo ao monoteísmo no exílio Babilônico.
Nesse exílio, finalmente em torno do século V e IV AEC, eles
escreveram a Torat, que contou a versão que interessava a eles.
Acreditem, eles resumiram 6.000 anos de história só de lembranças
e da criatividade dos escribas.
Sobre
definições de religiões, nenhuma é exatamente igual a outra, mas,
existem alguns termos para facilitar o entendimento geral. Assim,
Henoteísmo é quando a religião acredita em um deus supremo que
merece o culto, mas, podem ter outras divindades menores que também
podem merecer o culto, mas, o culto é dedicado ao deus supremo como
regra. A monolatria é como no Henoteísmo com um deus supremo e
outras divindades, mas, apenas o deus supremo pode ter culto, não
sendo admitido culto a nenhuma outra divindade menor. O monoteísmo
deveria ser quando a religião apenas admite a existência de uma
única divindade.
O
politeísmo é muito raro de existir, foi abandonado com a evolução
da humanidade, valeria um capítulo todo para comentar sobre a razão
disso. No politeísmo não tem nenhum deus supremo, todos os deus são
supremos com poderes e influências delimitados mas totalmente
independentes. Nas demais classificações um deus supremo é
responsável por tudo.
Outra
questão a explicar, para nivelar conhecimento é essa questão de
porque religiões tem várias divindades. Vou ser breve, mas, é um
assunto que merece um capítulo.
O
que diferencia, principalmente, o politeísmo do henoteísmo e
monolatria é a qualidade das relações e não a quantidade de
divindades. Ter um deus supremos significa que existe uma hierarquia.
As divindades adicionais a esse deus supremo são emanações desse
deus supremo,, ministros que o representam e possuem parte de seus
poderes supremos. As divindades não substituem o deus supremo,
apenas o humanizam e o tornam onipresente.
Várias
religiões se enquadram nessas categorias de henoteísmo e
monolatria, mas, na de monoteísmo existe apenas uma, o judaísmo.
Classificar o cristianismo como monoteísmo é absolutamente
questionável, é um henoteísmo ou no máximo uma monolatria.
O
conceito de onisciência e onipresença do deus judaico é apenas
deles mesmos. Nenhuma outra religião tem isso e acredite nisso quem
quiser.
Voltando
aos judeus, não é verdade que eles eram os únicos monoteístas ou
monolatristas. Já haviam no mesmo período da história, várias
iniciativas no sentido de estabelecer monolatria, henoteísmos e até
monoteísmos em vários povos. Deus se movimentava, ao redor, com
várias iniciativas, mas esbarrava no amadurecimento da própria
população que resistia a ideia de um deus único. A ideia de que
todo mundo era politeísta e só eles eram diferente é basicamente
criatividade dos judeus.
O
Zoroastrismo ou o Masdeísmo e depois o mitraísmo eram religiões
que se desenvolveram mais ao oriente, não eram étnicas, possuíam
muita similaridades até litúrgicas entre si e com o judaismo e, sem
dúvida, eram outras apostas de deus para a humanidade. Não eram
politeístas, ficando entre monolatrias e henoteísmos. Essas eram
correntes mais orientais, mas haviam outras iniciativas mais antigas
na própria região.
Ninguém
pode afirmar nada sobre a história antiga, o trabalho histórico é
baseado em investigação, busca de evidência e construção de
modelos a partir disso. Essas evidências levam as pessoas a
encontrar inúmeras similaridades teológicas e rituais do judaísmo
com essas religiões, cultos egípcios, sumérios e caananitas. Tem
pessoas que dizem que, como a bíblia judaica foi escrita
tardiamente, na falta de lembranças ela pode ter intencionalmente
sido feita usando mitos e ritos dessas religiões.
Claro
que existe outra possibilidade, que também acho muito plausível,
como estamos lidando com o mesmo deus supremo é natural que as
religiões sejam similares ou tenham coincidências. Muitos críticos
de religiões esquecem que todas as religiões se comunicam através
do mesmo deus e não porque, necessariamente, copiam coisa uma das
outras.
Estou
citando isso tudo superficialmente para dizer que esta tese de que os
judeus sejam escolhidos e que deus os escolheu é uma versão deles
para eles mesmos.
Sob
o ponto de vista de um deus supremo, isso faz sentido?
Sim,
uma vez que vocês aceitem que, como relatei, o deus supremo levava a
religião a muitos povos, eles foram um desses povos.
Mas,
não, para aqueles que pensam que isso foi feito só para
eles, visto que isso é uma estupidez.
A
visão judaica é absolutamente obtusa no aspecto de definir deus
como sua propriedade e espelho humano deles mesmos, com reações
emocionais pequenas que permeiam o AT. Nisso, Bento de Espinoza que
era judeu, foi definitivo ao apontar a falta de visão da grandeza de
deus e sofreu por causa disso.
A
teologia cristã, na minha visão, tem 2 momentos distintos.
O
primeiro é o helênico, com a formação do que seria depois o NT,
uma colcha de retalhos de tudo. Os novos cristãos, todos helênicos,
não ligados a influência judaica de Jerusalém se viram obrigados a
construir os mitos de Jesus, porque a população exigia mais
informações, detalhes e uma história completa e não relatos
parciais. Eles estavam habituados com a mitologia grega, com mitos
bem construídos e com muito significado e simbologia. A mensagem do
Cristo era forte mas precisava-se estabelecer sua divindade através
da história.
Nesse
momento é evidente a influência helênica nos mitos, com repetições
de construções dos mitos gregos. Mas essa criação era
independente dos judeus e do AT, a preocupação era apenas de
estabelecer Jesus como o novo deus ou, mais certamente como um
semi-deus. Os elementos do NT foram criados para convencer o povo
romano e helenizado de que Jesus era um deus melhor do que eles já
tinham. Não existe entendimento sério do cristianismo que despreze
a construção helênica do novo testamento, que é absolutamente
independente do AT.
Essa
base helênica se consolida, bem posteriormente, com Agostinho de
Ipona e Tomas de Aquino que trouxeram formalmente Platão para a
teologia, lembrando que o modelo cristão inicial focava somente em
jesus e não na religião judaica.
A
epopeia cristã para formação da religião, o contexto da época,
as dificuldades com as religiões existentes é, por si só, uma
capítulo muito interessante da história, totalmente desvinculado de
Jerusalém e da origem judaica, com desafios próprios. O efeito
disso que gerou o amontoado de documentos do NT e também criou
teologias não existentes ainda é bastante interessante para
entender como iniciou esse processo de construção teológico
cristão.
Retomando
a minha visão sobre a teologia cristã, o segundo momento, já com a
igreja católica organizada, entra a influência judaica, porque era
necessário montar a religião completa. É nesse ponto que eles
herdam e inserem esse entendimento, sem sentido, de propriedade e
escolha de deus.
Os
primeiros cristãos helênicos não estavam preocupados com isso.
A
discussão do AT ocorreu entre os séculos IV a V, sendo definidos no
concílio de Florença e reconfirmados no concílio de trento. Cabe
chamar a atenção de que esse cristianismo já estruturava
sucessivos movimentos organizados, até aproximadamente o século III
ou IV EC, para se desvincular da teologia judaica, criando uma
teologia própria.
Com
a igreja romana, o modelo cristão para uma religião, volta a trazer
a origem judaica. Uma das primeiras ações políticas-teológicas
foi transformar o Cristo no próprio deus, o que nunca tinha sido
antes. No primeiro concílio de Niceia, eles estabelecem a tese da
co-substância. Essa foi uma discussão pesada e baixa na igreja
porque havia a tese ariana que não concordava com isso. Foram os
concílios que definiram a teologia católica. Os concílios, na
minha visão, eram principalmente políticos e não teológicos. O
primeiro deles, o de Nicéia já iniciou com a decisão de
transformar cristo no próprio deus, não houve discussão teológica,
houve apenas expurgo dos opositores.
Mas
por que essa questão do cristo-deus eram tão importante para ter
sido o primeiro debate teológico? Porque com o cristo-deus, eles
continuam a usar o AT mas se libertam das 12 tribos e passam a ter um
deus só deles, um deus para chamar de seu. Eles passam a se
equivaler aos judeus sem pertencer as 12 tribos e ao povo dito como
escolhido no AT.
Lembro,
mais uma vez, que o cristianismo foi construído inicialmente apenas
sobre o cristo, sobre sua existência, obra, palavras e
principalmente ressurreição. Isso foi o suficiente para criar a
religião.
Mas
a igreja precisava de uma cosmogonia completa, sem isso não seria
uma religião de fato, ai recorreram a origem judaica de jesus que
traz junto a Torat.
Mas
a Torat define uma teologia que os judeus fizeram para eles mesmos,
como já expliquei e coloca eles, os judeus, no centro de tudo. Os
judeus e não os gentios eram o povo escolhido por deus. Assim, para
ter a Torat e sua cosmogonia eles precisam tirar os judeus do papel
que eles deram para eles mesmos, de povo escolhido.
Foi
nesse sentido que jesus precisava virar o próprio deus e o argumento
da co-substância foi o que eles usaram.
Além
dessa questão de terem que substituir o deus que estava no AT e que
escolheu apenas os judeus, existe também a questão do monoteísmo.
Os
cristão, como os judeus se consideravam monoteístas e desta maneira
superior as demais religiões da terra. Superior porque eles foram
escolhidos e se dirigiam ao próprio deus superior, o chefe de tudo,
assim eles eram especiais, não tinha intermediários ou subalternos
entre eles e deus, na verdade “o” deus.
Jesus
entra nesse contexto religioso como sendo um semi-deus. Foi assim que
os helenos aceitaram ele. Jesus era equivalente a outros deuses que
os helenos já cultuavam, equivalente mas superior. Jesus era uma
mistura de deus e homem, um semi-deus, que veio de deus mas nasceu
humano, isso era a definição grega de um semi-deus.
Considerando
que era necessário manter essa definição de monoteísmo,
equivalente aos judeus, porque senão o cristianismo seria (como é
de fato) um henoteísmo, era imperativo unificar Jesus e o próprio
deus, assim, independente da lógica e do bom senso gritarem o
oposto, Jesus e deus passam a ser um só, via o concílio de Nicéia.
O
Jesus-deus mantinha o culto a Jesus mas não o estabelecia como um
sub-deus ou um semi-deus, como deveria ser, mas, como o próprio
deus, mantendo assim, porque eles queriam a denominação de
monoteísmo. Assim você poderia se dirigir a deus e a Jesus também
e ainda falar que é um monoteísmo.
Essa
discussão teológica tem que ser feita se distanciando das
auto-definições que os cristãos fizeram para si mesmo através dos
concílios. Apesar de toda a subjetividade envolvida, não tem lógica
que sobreviva a ter que discutir isso com a hermenêutica tirada do
rabo do diabo que nasceu dos concílios.
Jesus
foi entendido como um semi-deus pelos primeiros cristãos, os
helenos. O cristianismo, com sua trindade, Maria, Santos e Anjos é
estruturado como um henoteísmo ou monolatria e não como um
monoteísmo.
Voltando
ao Jesus-deus, ao criarem essa definição, que foi necessária por
esses 2 motivos que eu apresentei, os cristãos passam a adotar a
mesma versão do deus pessoal e menor dos judeus. Veja no caso do
Jesus-deus, ele veio fisicamente até nós e assim é de fato
pessoal.
Mais
uma vez, deus perde sua grandeza. Como deus veio pessoalmente até
eles, como o cristo, então, igualmente, só eles tem razão e só
eles sabem o que é certo. Segundo eles mesmos, nas demais religiões
o próprio deus não vem até nós, só na deles. Ou seja, eles
inventam do fundo do anus, essa tese maluca que não vem de nenhum
profeta e desta forma não veio de deus e, com isso, se veem
obrigados a desprezar as demais religiões, ignorando assim, sem
nenhum pudor a grandeza de deus.
Essa
manobra teológica resolve a questão que eles tinham com os judeus e
o AT, mas, cria um monte de complexidades teológicas e coloca o
cristianismo contra o resto da humanidade.
Aliás
repetindo o modelo judaico, que nos relatos do AT eram eles contra o
resto do mundo também. Existe assim um problema teológico de base
na religião que estabelece o conflito como caminho.
Essa
visão de cristo ser deus é algo absolutamente humano e
discricionário, aliás como toda a teologia conciliar. Não existe
nenhuma base profética nisso, eles apenas decidiram baseados em
argumentos convenientes e sinuosos que era isso.
Cabe
observar que o AT é baseado em profetas. Assim, a história é
construída sempre com essa ligação com deus através dos profetas
e escolhidos por deus, existe, literariamente a mão de deus
conduzindo a história.
A
partir de cristo isso se perde. O NT não é feito por profetas e
muito menos os livros são de autoria de profetas. Eles apenas são
feitos por pessoas. Igualmente as decisões teológicas conciliares e
sinodais são tomadas por homens. Para resolver isso eles criam o
conceito de inspiração divina, assim o papa é inspirado por deus e
os bispos no concílio, todos, são igualmente inspirados em seus
pensamentos e decisões.
Na
minha visão, não tenho nada a me opor a esta tese do cristo-deus,
se eles entendem que foi assim, ótimo. O que eu estou repetindo
incessantemente aqui é que, apesar dos católicos terem inventado
isso, o bom senso mostra que a grandeza de deus jamais se limitaria a
essa única ação ou mesmo a essa ação.
Uma
avaliação teológica mais responsável e menos política deveria
ter pesado a falta do senso do que eles estavam fazendo ao definir
isso para substituir os judeus, o quanto isso complicaria, como
ocorreu, a teologia deles. Além disso, como relatou Espinoza, isso
traz a absoluta falta de reconhecimento da grandeza de deus.
Mas
os cristãos foram além, como era fácil, bastava se reunirem e
eles, da cabeça deles, criaram teologias muito convenientes, como o
pecado original, a vida única, o medo do pecado, o diabo, o inferno,
o apocalipse e a necessidade imperativa de ser salvo por deus senão
você vai para o inferno.
Eles
substituíram o sentimento espontâneo de pertencer a uma religião
por este ser o caminho para se tornar uma pessoa melhor, viver melhor
em sociedade e harmonizar sua vida com as orientações de deus para
ter suas bençãos, para um outro no qual você tinha que estar na
religião pela obrigação de ser salvo, o medo do inferno. Além
disso, os protestantes principalmente, substituíram a busca do bom
caráter e a auto-crítica pela muleta de que seus erros são
causados pelo diabo.
Inclusive
a teologia do diabo e inferno que conhecemos hoje é uma invenção
medieval. Não está no AT da bíblia. No NT o diabo assim como o
inferno eterno é criação do livro do apocalipse que nem deveria
estar na bíblia devido a ser um relato feito por João, o
visionário, para criticar o império romano. Nada que está no AT
nos remete ao personagem e atuação do diabo medieval. O nome
Lúcifer era um nome comum. A igreja tem um Santo chamado São
Lúcifer que viveu, na Sardenha, no século IV. Os luciferianos, seus
seguidores que se opunham aos arianos, permaneceram após sua morte e
foram liderados por outro santo, São Gregório de Elvira. A razão
de eu explicar isso é para mostrar que essa invenção de diabo,
lúcifer e inferno eterno é criação tardia da igreja, teologia
inventada. O satã que está no AT, nada tem a ver com o diabo
medieval.
Os
protestantes, baseados em pessoas com formação insuficiente ou
deficiente como Lutero e Calvino, inventaram coisas piores, como a
dupla predestinação que condena pessoas ao inferno eterno (que já
é uma invenção) por nascimento. Deus decide fazer pessoas que
independente do que sejam ou façam vão para o inferno. Os
protestantes conseguiram piorar muito a teologia católica.
Protestantes
principalmente, mas também católicos passam a usar a colcha de
retalhos que é o NT e também (mas, menos) o AT para a partir de
pequenas frases ou parágrafos criar interpretações malucas e gerar
a teologia que eles queriam. As cartas de Paulo, cuja a minoria foi
escrita pelo próprio, mais o livro do apocalipse cuja introdução
no cânone é absolutamente política e sem sentido são as
principais bases para essa teologia maluca e conveniente que hoje se
baseia o cristianismo.
Observe
que foi essa teologia que trouxe para o foco da religião a dualidade
bem e mal, com a criação do diabo e do inferno, que são
absolutamente artificiais, como o destino dos não fiéis. Assim a
opção pela igreja e cristo passou a ser obrigação, o mundo passou
a ser nessa visão um palco da luta entre o bem e o mal.
Observe
que essa dualidade bem e mal era o foco de outras religiões
orientais próximas aos cristianismo, como o zoroastrismo, o
mitraísmo e o maniqueísmo. Não podemos dizer que bem versus o mal
não seja uma dualidade teológica presente em várias religiões.
Até mesmo em Ifá é
assim a dualidade é parte do entendimento do mundo e do seu
componente energético, o axé (àṣẹ).
Mas
trata-se de uma luta interior. Como eu descrevi antes, somos a
própria balança, de um lado temos o livre arbítrio e de outro a
religião e cabe a nós manter esse equilíbrio. O mal é resultado
de nossas escolhas pelo lado do livre arbítrio.
O
que o cristianismo medieval fez foi elevar esse conflito para a arena
exterior, retirou de nós o mal porque deus não pode ser mau e como
somos criados a sua semelhança não podemos ter alguma coisa que ele
também não tenha, assim o mal não pode pertencer a deus e nem a
nós. Neste contexto o diabo é necessário porque é ele que
justifica o mal, um elemento externo, maligno que traz para nós
temporariamente o mal.
Assim
bem x mal, passou a se tratar uma disputa divina com a igreja sendo a
necessária para nos livrar.
A
disputa do bem x mal, um conflito interno humano baseado no livre
arbítrio, comum a todas as religiões, no cristianismo saiu a arena
interior da pessoa. O diabo é o responsável, sua alma está
condenada desde o nascimento e a igreja é a salvação obrigatória.
Com
pouca inteligência você olha para isso e vê que se trata de uma
corrente de consequências naturalmente amarradas, que tem origem em
dogmas teológicos artificiais. A escolha errada do dogma gera toda
sinuosa e confusa teologia consequente.
Uma
teologia conveniente, sem dúvida, porque nesse contexto de pecado
original, diabo, uma única vida e inferno eterno a igreja passa a
ser essencial.
Voltando
ao nosso início, isso é um castelo de cartas teológico.
Se
você tira disso o deus pessoal e dedicado que traz o único certo,
você desmonta a teologia consequente. Porque outras religiões não
tem esse modelo teológico, oferecem uma vida muito mais natural e
harmoniosa com o deus supremo.