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segunda-feira, agosto 26, 2013

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Gente em função de uma alteração na configuração da ferramenta de Blogue os comentários do BLOG foram integrados ao Google Plus, mas, isso foi diferente do que eu imaginava que seria.

Voltei ao normal, de maneira que os comentários voltam a ficar livres de você estar logado no Google plus.

Esta semana vou fazer nova postagem

sexta-feira, agosto 09, 2013

Os cargos de Obariaté que são distribuidos por dinheiro, apenas



 A FALSA CERIMÔNIA DE OBA ORIATÉ


(não existe nenhuma que seja verdadeira...)

Como brasileiro e oriundo do Candomblé eu tenho inúmeros reparos e observações a fazer em relação a prática do Ifá cubano carregando a variante Lukumi aqui no Brasil, mas, o tema não merece nenhuma insistência ou direcionamento de minha parte. Minhas posições críticas surgem naturalmente nos textos que são publicados. Contudo, alguns assuntos podem sim merecer um tratamento mais especial. Este é o caso da distribuição dos Oba Oriaté que é feita aqui no Brasil, como aliás em outros lugares.

No meu restrito conhecimento de lukumi, todo ele oriundo apenas de conversas com pessoas do culto Lukumi, nunca me permitiu compreender a possibilidade e o sentido da distribuição de cargos de Oriaté para brasileiros que se aventuram no Ifá Cubano. Eu ouvi algumas explicações, mas, não aceito nem mesmos as ponderações das razões, e vejam que eu perguntei diretamente sobre isso.

Na minha visão o Oriaté é um cargo que um Olorisha atinge com a maturidade, conhecimento e experiência. É requerido notável saber para uma pessoa ser um Oriaté. Um Oriaté, na minha visão é aquela pessoa que conduz todas as liturgias e desta forma domina toda a sua tradição religiosa. Eu havia entendido que haviam 2 tipos de sacerdotes, os babalorisha e os Oriaté, sendo que apenas os segundo tinham o completo domínio da liturgia. Entendi que você podia ser um Babalorisha, ter seus afilhados e requisitar o suporte de um Oriaté toda vez que necessitasse.

É um modelo distinto do usado no Candomblé, mas, um modelo possível, tanto que eles fazem assim lá e esse modelo também se repete no Ifá Cubano, onde você pode ser padrinho de uma pessoa sem ter ainda o direito de fazer isso sozinho, você "aluga" isso.

Este meu entendimento, contudo, é contrariado pelo fato de, algumas pessoas, que nada sabem a fundo de Lukumi terem ganho esse cargo aqui, no Brasil, sem prática, neófitos de fato e ainda mais através de Ifá!

Bom, sem saber o que falar eu ficava na minha. ...

Mas, nas últimas semanas, por acaso tive acesso a um livro escrito por um Cubano no qual ele critica justamente a mesma coisa que eu criticava, a distribuição a troco de dinheiro de cargos de Oriaté. Claro que continuo sendo uma pessoa de pouco conhecimento em Lukumi, mas, fiquei satisfeito por saber que não sou idiota, porque consegui entender o que me explicaram antes.

Dessa maneira faço uma tradução livre de um trecho do livro de Miguel Ramos, chamado Obì agbón: lukumi divination with coconut, que pode ser facilmente comprado em edição digital na loja kindle da amazon.com. Eu gostei do livro e recomendo para quem quer conhecer o uso de cocos como oráculo.

Eu sei que o Sr. Miguel Ramos não é por assim dizer uma pessoa muito bem conceituada, em alguns aspectos. É um típico comerciante de liturgias, como os muito que nós mesmos temos aqui aqui no Brasil vindo de Cuba. Mas, enfim, a parte dessas cubanices dele, que não são muito diferentes das nossas, ele é um acadêmico, é Lukumi e uma pessoa que produz conteúdo Lukumi.

O que importa não é o que ele faz e sim o conteúdo que ele gera que, sendo dele mesmo ou copiado de outros não faz diferença se o que retrata é real. A questão de autoria, não me interessa, o que importa é o conteúdo ser consistente, lembrando sempre que, como estamos falando todos da mesma religião, falar de conteúdo original é bem difícil.

O trecho que vou destacar a seguir e comentar, não é nenhum conteúdo especial, está no prefácio do livro, de forma que é então uma mensagem do autor que vou ajudar a passar.


Aqueles que não gostarem, principalmente os que receberam o cargo de Oba oriaté aqui no Brasil ou que estão dando esses cargos, peço que direcionem suas reclamações para o Sr. Miguel “Willie” Ramos, o autor do livro, que é quem escreveu isso, eu apenas estou reproduzindo.

“... Para ser uma Iyá ou babalorisha, um Oriaté ou um Babalawo, o indivíduo deve ter Odus específicos na sua ordenação (iniciação) Itá, que determinam que isto é possível e acima de tido isto ser sancionado pelos Orisha. Na religião Lukumi, status, títulos e hierarquia são baseados em um Odù, e em muito rituais, Iyalorisha, Babalorishas, Oriatés e de muitas formas os Babalawos são nascidos, eles não são feitos ou forçados for ego, vaidade e outros fatores.

** é interessante observar que os Lukumi tem uma aproximação muito séria com Ifá lá e usam Ifá de uma forma integrada, levando a sério a questão de Odù. Isso é diferente aqui no Candomblé e por isso que muitas pessoas se impressionam com eles. Odù e Ifá viraram um sinônimo de sofisticação e por eles se expressarem assim impressionam os menos informados *** 


O que faz esse problema ser mais sombrio é que muitos poucos tem o treinamento adequado para exercer o ofício que eles tão obsessivamente imploram e frequentemente praticam sem nenhum profissionalismo, ética ou conhecimento, que são partes intrínsecas e indispensáveis destas hierarquias e status. Esses fanáticos jamais entendem, ou possivelmente não se preocupam, que eles estão colocando a vida de outras pessoas em risco.

Podem me chamar de pessimista se você quiser, mas hoje nós estamos debaixo de um desafio de uma grande desastre e sofrimento...


...A religião Lukumi foi capaz de sobreviver a inúmeros obstáculos que a confrontaram devido aos nós que a própria comunidade sofre. Conhecimento, respeito e senso de propósito foram os princípios de resistência e continuidade que permitiram a unidade do coletivo mesmo nos momentos onde o individualismo prevaleceu em todos os níveis. Orientação foi um elemento importante. Cada classe de sacerdotes aprendeu sobre suas funções sacerdotais por causa da estrutura que havia em volta deles, de casas e mais velhos que os pressionavam. Olorishas foram ensinados pelos seus mais velhos e foram focados no seu propósito que era o de reconhecer a importância dos Orisha e na pratica de uma religião.
O aprendizado começava de baixo. Os olorishas começavam tirando penas de aves, limpando o chão e sujando suas mãos nos trabalhos mais duros e cansativos. Uma vez ordenados eles continuavam seu caminho do fim da fila, ascendendo, demonstrando respeito pelos mais velhos, ganhando conhecimento e respeito. Somente o verdadeiro interesse, dedicação e humildades eram recompensados e tudo se transformava em amor a sua religião.

Oriatés foram selecionados e treinados por seus mentores, um reconhecido Oriaté. Por longos anos. Os candidatos trabalhavam junto com um Oriaté mais velho e ficavam por longas horas com trabalho duro e pressão. Quando esse Oriaté mais velhor entendia que o aprendiz estava maduro ele seria “iniciado”. Esta “iniciação” era basicamente a apresentação do novo ORIATÉ para a comunidade, quando o candidato deveria fazer um Itá na frente de todos e depois ser julgado pela própria comunidade se ele já estava apto.

** Notem que o entendimento deles não é distinto do nosso para o processo de aprendizado **

Ao contrário do que se faz atualmente, não existe nenhum outro processo para se tornar um ORIATÉ. O ORIATÉ é o produto de aprendizado e treinamento e demonstração pública da capacidade e habilidade de fazer o seu ofício. Não existe nenhuma cerimonia ou ritual de iniciação.
….
No Brasil, Ifá e os Babalawo estão extintos desde o fim do século XIX. Babalawos Nigerianos começaram a influenciar o Brasil depois de 1960 quando muitos viajaram para ensinar Yorùbá em universidades. Este processo iniciou uma Africanização tardia do Candomblé no Brasil. Depois os próprio Babalawo Cubanos vieram para o Brasil e introduziram a variante cubana. No Brasil, os Babalawo cubanos estão causando uma divisão devido a introdução de novos rituais de Ifá que não tem lugar na tradição e na região, como é o caso da FALSA CERIMÔNIA DE ORIATÉ.


Candidatos que não são considerados dignos para serem iniciados em Ifá e principalmente sacerdotes homosexuais, são orientados através de uma divinação de Ifá que devem receber o cargo de OBÁ ORIATÉ e assim pagam e são submetidos a essa FALSA CERIMÔNIA que não tem lugar no Lukumi...”


Eu destaquei apenas algumas partes do texto. O relato é mais rico em detalhes em substantivos e também adjetivos. Quem quiser ter acesso ao conteúdo integral que é bem esclarecedor deve procurar o livro na AMAZON.COM.

O autor explica que em um momento de Cuba, pessoas que haviam sido deportadas voltam a ilha e iniciam esse processo não tradicional de criar cerimônias que não existem e vender o que não deveria ser vendido. O fluxo entre os EUA e Cuba permitiu que essas pessoas buscassem conhecimento ou legitimassem um comércio de coisas que não eram adequadas pela tradição da ilha.

O mesmo ocorreu aqui no Brasil com a vinda de cubanos e Nigerianos. Ambos fazem aqui coisas que não fazem dentro de suas tradições. Idiotas são aqueles que não procuram sabem o que é certo e compram coisas que são ilegítimas.

Dentro dessa ilegitimidade, segundo Miguel Ramos está a criação de uma FALSA CERIMÔNIA de Obá Oriaté, criada apenas para tirar dinheiro de incautos. Ele também comenta que essa função, de Oriaté não tem lugar no Candomblé. Essas pessoas não são reconhecidas no Candomblé como sacerdotes. 





Chamo a atenção para o aspecto que o autor destacou que não existe cerimônia verdadeira de Oba Oriaté, todas são falsas.

Aqueles que se sentirem atingidos pelos comentários, lamento, procurem o Miguel Ramos. Esse Blog não tinha posição sobre o assunto, mas, visto ao exposto entende que o Miguel Ramos deve estar correto

segunda-feira, agosto 05, 2013

Cerimônias de Nascimento Yorùbá Parte 3 de 3

Cerimônias de Nascimento Yorùbá

Parte 3 de 3

A cerimônia de Imori


Esta cerimônia significa “conhecendo o Ori”. É um complemento da primeira cerimônia o Ikoxewaye e não tem ligação com a segunda, a cerimônia de nome.

Vamos revisar esses conceitos. A primeira cerimônia descrita, o Ikoxewaye é o momento que se conhece o Odù de nascimento do recém-nascido. É realizada entre o terceiro e o oitavo dia de nascido. Esta cerimônia não é exclusiva de adeptos da religião. Pode ser feita pelo Bàbáláwo para qualquer criança de qualquer religião.

A segunda cerimônia, a de nome esta ligada a religião da criança, não tem sentido ela ser feita pelo rito Yorùbá se a criança é católica ou muçulmana. Assim a criança pode passar pela primeira cerimônia e depois seguir os ritos de sua religião.

A terceira cerimônia, o Imori, esta ligada a religião Yorùbá. Não vejo muito sentido ela ser feita para crianças de outra religião.

Depois da criança pisar no mundo e receber o seu nome, chega a vez dela colocar a cabeça no mundo. Os Yorùbá entendem que até o terceiro mês aquela alma ainda está entrando nesse mundo e naquele Ori. Existe um processo de adaptação a este mundo em curso e a alma ainda neste momento tem muita informação da sua origem para passar. Quando ela se unir definitivamente com o seu Orì interior vai esquecer do Órun (ọ̀run) será impossível resgatar as informações sobre suas origens. Esta é a razão que leva essas cerimônias serem realizadas tão cedo e serem impossíveis de serem realizadas mais tarde.

A cerimônia se inicia novamente com a presença da criança e da mãe na esteira. A cerimônia será feita no início da manhã. Na noite anterior a criança deve dormir com uma fita preta e branca colocada nos seus pulsos, cotovelo, calcanhar, joelho e pescoço. Isto é um sinal para preparar o espírito da criança para o ritual do dia seguinte.

O ritual inicia nas primeiras horas da manhã, com uma oferenda de Gin e dendê no assentamento dos ancestres do Bàbáláwo, usando um Obì para determinar se isso foi aceito. A mãe também pode trazer oferendas, como canjica, Cará ou peixe seco. O pai da criança pode estar ou não presente e pode também trazer alguma oferenda para seus ancestres.

As oferendas são colocadas de cada lado do ópón (ọpọ́n). No lado direito o da família do pai e no lado esquerdo o da família da mãe.

O Bàbáláwo fará a abertura do seu Ifá e ao terminar riscará e rezará no seu ópón (ọpọ́n) o odì Ogbè Méjì. Ele vai pegar a criança da mãe, como fez na primeira cerimônia e vai tocar a cabeça dela no chão e depois no ópón (ọpọ́n). Dessa forma a cabeça entrará no mundo.

A cabeça da criança deve ser aspergida com água. A água deve ser jogada no chão e a criança deve beber também um gole de água. Depois dela o Bàbáláwo, a mãe, o pai (se presente) e todos os demais.

O Bàbáláwo tomará 2 pequenos gravetos feitos com árvores especiais. O graveto da família do pai, chamado de Ixémokurin (Iṣẹmọkurin) será de Akoko, uma árvore intimamente ligada com a ancestralidade masculina. O da família da mãe, chamado de ixémobirin (iṣẹmobirin) será de uma árvore de frutos doces e com muitas sementes. Na áfrica é feito de uma árvore chamada de maçã de estrela branca (chrysophyllum albidum, sapotaceae), de fruto doce e com uma semente vem negra. Esta semente é um importante instrumento de ìbò em Ifá, usado para perguntas a Órunmilá (Ọ̀rúnmìlà).

Claro que não vamos encontrar aqui a African white star apple, mas deve ser usada uma árvore de frutos doces, pode ser de uma laranjeira.

Cada um dos gravetos fica do seu lado da família.

O Bàbáláwo, como é tradicional em Ifá deve explicar o propósito da cerimônia e desejar as bençãos para a criança. Pega então os 2 gravetos, toca no Ikins, na testa da criança. No chão e os circula no ar 3 vezes.

Ifá não será usado para tirar um Odù. O Odù que prevalece é o Odù do nascimento que pode ser riscado e rezado.

Ifá será tirado em uma consulta múltipla para definir de qual lado da família vem o espírito da criança. Ele pode vir do lado da família da mãe, do pai ou vir de orixá (Òrìṣà) e nesse caso será um espírito novo na família. São traçados 3 Odù um para cada parte, sendo o mais à direita a família do pai, o do meio o orixá (Òrìṣà) e o da esquerda a família da mãe.

Depois de definido isso pode ser feita ou não exploração adicional para determina que ancestre específico estase manifestando na criança, se ela é um bàbá tunde ou uma iyabode.

Outra consulta múltipla deve ser definido através dos Ìbò qual caminho de benção deve a criança vem abençoada na sua vida:



Ìbò
Representa
Significado
apaadì
vitória e sucesso
Diz respeito a vitória na vida sobre os seus inimigos e podemos aqui incluir as relações de trabalho e negócios
Egun
saúde
Indica que o Odù se refere a saúde do consulente ou de sua família, ou seja, mulher e filhos.
Irú
fartura e felicidade
Filhos, felicidade e fartura
okoto
mulher
Representa os relacionamentos, a casa ou o casamento
owó-ẹyọ
dinheiro
Indica que o Odù se refere a questões de negócios
okúta
destino e a vida
Indica que o Odù se refere a questões da vida do consulente



O Bàbáláwo poderá então perguntar sobre o orixá (Òrìṣà) da criança e qual o orixá (Òrìṣà) de família que ela deverá também prestar homenagem. Essa parte é muito especial porque envolve o Bàbáláwo conhecer bem o culto de orixá (Òrìṣà) e Orì o que não é comum.

Cada pessoa vem apenas com um único orixá (Òrìṣà) de Ori. Existe um segundo orixá (Òrìṣà) de proteção que complementa o orixá (Òrìṣà) de Orì que pode ser de qualquer gênero, não existe regra de que é um orixá (Òrìṣà) de cada gênero. Isso é falta de conhecimento.

Adicionalmente a criança pode ter um orixá (Òrìṣà) de família e também um orixá (Òrìṣà) de ancestralidade, de herança que vem com este espírito. Estes orixá (Òrìṣà) adicionais não são o orixá (Òrìṣà) de Orì mas complementam a vida espiritual da criança.

Por último, o Bàbáláwo pega 3 folhas de Akoko e coloca em cima delas um pouco de cada elemento que foi usado como sacrifício. Antes de colocar nas folhas ele deve tocar o elemento nos ikin, na testa da criança e na sua boca. Cola então nas folhas. Quando todos os elementos já estiverem representados, ele joga em cima o pó de yerosun (Yẹ̀ròsùn) e fecha as folhas formando um pacote bem amarrado com as fitas que foram colocadas na criança para ela dormir.

Esse pacote será colocado em um prato branco no meio do opon (ọpọ́n) e girado primeiro no sentido do relógio e depois no sentido contrário. Ele então pergunta a todos:

“- a criança veio ao mundo ou a criança não veio o mundo?”

Os pais devem responder: “- a criança veio ao mundo!”

Ele então rodando o prato deve dizer “- A criança veio ao mundo para ser feliz e aproveitar de todas as coisas boas do mundo”.

Ele pega o prato com o pacote e o entrega para a mãe. Ele vai rezar agora pela felicidade da criança. Após concluir ele pega de novo o pó de yerosun (Yẹ̀ròsùn) e joga sobre o prato de pacote. Nesse momento o pó se torna a manifestação material das preces.

Esse pacote deve ser guardado pela mãe com todo o cuidado e será uma proteção para a criança e poderá ser usado com a orientação do Bàbáláwo.

Conclusão


As 3 cerimônias são muitos importantes sob o ponto de vista desta religião como de qualquer outra. Coo explicado algumas delas podem ser feitas para qualquer criança, independente da religião dos pais. Mesmo no caso de pais que tem religiões diferentes as cerimônias podem ser aplicadas.

Claro que a criança deve ser batizada apenas através de uma religião. Não existe sentido em batizar a mesma criança em várias religiões. A primeira água é aquela que abençoa e não existe necessidade de mais nenhuma outra.

A cerimônia de Imori, poder aplicada com algumas reduções para crianças de outras religiões, no que pese no meu entender ela ser mais aplicada às crianças de pais ou de um dos pais da religião Yorùbá.

Num ponto em que o Candomblé carece de cerimônias autênticas, estas cerimônias através de Ifá são importantes para a afirmação de uma religião plena e autônoma. Já basta o Candomblé ficar copiando cerimônias católicas ou submetendo seus seguidores às cerimônias católicas.

Minha posição é que nenhum Babalorixá deveria fazer qualquer batizado ou casamento se a família submeteu a criança a um batizado católico ou pretende submeter. De fato não dá para saber o que será feito depois, mas, perguntar se a criança já foi batizada antes sem dúvida é mais fácil.

Por último, faço a mesmo recomendação de sempre. Essa cerimônia deve ser feita por um Bàbáláwo mesmo que junto com o Babalorixá ( Bàbálórìṣà) da família. Mas tome muito cuidado com ambos os sacerdotes. Não escolha gente que vende sua mão para fazer feitiços e amarrações, que vende qualquer favor por dinheiro e que não tenha reputação ilibada. Você não vai colocar uma mão suja para fazer isso para seu filho.

domingo, julho 28, 2013

As cerimonias de Nascimento Yorùbá Parte 2 de 3 A cerimonia de nome

As cerimonias de Nascimento Yorùbá

Parte 2 de 3

A cerimonia de nome

Introdução

Algumas pessoas, tipicamente acadêmicos, me questionam as vezes sobre as fontes que uso para os textos que escrevo. Eu entendo que muitos deles estudam alguma coisa lendo livros de outros. Muitos são compiladores e pouquíssimos, como Verger por exemplo fazem qualquer pesquisa de campo ou vivenciam qualquer coisa sobre a qual escrevem. Eu acho que tem um tal princípio que não podem, ou não devem, se envolver com o pesquisado.
Em religião isso é muito curioso porque não estamos tratando de ciência e sim de fé e também do supernatural. Além disso estamos tratando das mesmas coisas repetidas por diversos, enfim, é o mesmo assunto. Mas, eu tenho sempre o cuidado de citar autores quando faço transcrições literais. Faço isso porque não acho nada mais brilhante a dizer do que aquela pessoa já disse. Na maior parte das vezes o que escrevo vem de mim mesmo influenciado pelas “N” coisas que leio.
Sou cuidadoso com fontes. É muito fácil inventar coisas nesta religião.
A cerimônia a seguir foi descrita por Ayo Salami. Não encontrei esta descrição em nenhum outro lugar.

Cerimonia de Nome

A cerimônia de nome é um evento basicamente social. É a apresentação para a sociedade da criança que nasceu. A família apresentará a criança e seus nomes. Uma criança Yorùbá pode ter até 3 nomes. O nome de deus, o nome do oráculo e o seu nome civil.
O nome de deus é dado em função de situações ligados ao nascimento. É muito aplicável quando se trata de crianças que nasceram em condições não normais, com dificuldades no nascimento, etc. Imagino que os Yorùbá sempre tenham uma boa frase que se comprime em um nome para caracterizar ao nascimento de qualquer criança.
O segundo nome é escolhido pelo Bàbáláwo através do Odù que foi riscado. É uma questão muito subjetiva. O Bàbáláwo supõe alguma coisa e submete a Ifá. O terceiro nome é o nome civil.
É uma cerimônia bem simples. A parte litúrgica envolve alimentar a boca da criança com uma série de alimentos importantes. Este é o ritual importante. Para as pessoas convidadas será oferecida uma refeição baseada em uma comida votiva.
A questão da data e cerimônia é bastante confusa nas referências. Quando eu vejo essas referências sempre levo em consideração que quem escreve pode não saber de fato tudo sobre o que escreve ou não quer dizer. Eu vou dizer aqui o que considero ser o razoável.
A cerimônia para determinar o Odù, chamada de Ikoxéwaiye ou Éxéntaye ou Ikoxedaye deve ser feita entre o terceiro e o oitavo dia após o nascimento. Após esta cerimônia até um período de até 3 meses após o nascimento deve ser feita a cerimônia de nome e a de Imori. A cerimônia de Imori pode ser feita junta com a primeira cerimônia.
A cerimônia de nome assume maior importância para os meninos do que para as meninas. O primeiro motivo é que o menino não troca de nome. A menina vai trocar de nome quando se casar. Além disso a menina deixa a casa dos pais e vai viver com a família do noivo, as pessoas entendem que as meninas deixam a família e se transferem para outra família, por esta razão tudo para os meninos tem mais importância, ele permanece na família.
Esta cerimônia, socialmente falando, mostra para a comunidade que a linhagem da família se preserva através do nascimento de uma nova criança, um presente de Olodumare.
O segundo simbolismo é a alimentação da boca. Eles entendem que após saciada a boca rezará pelo bem de quem a alimentou. Dessa maneira a primeira coisa que fazemos é alimentar a boca da criança.
Em relação a ser feito alimento para ser oferecido à comunidade isto tem relação com Oxun, que segundo Ayo Salami, no Odù Oxéotuwa, criou a ideia de cozinhar para visitantes no dia do nome. Isto foi na cerimônia de nome do filho de Oxun, Oxéotuwa. Ela se ofereceu para cozinhar para todos os Orixá como um sinal de boas vindas para eles, buscando assim a bênçãos deles para o seu filho. Mais uma vez, se você alimenta uma pessoa esta pessoa depois de saciada irá agradecê-lo por isso. Deve ser feita uma comida votiva, uma comida de Oxun.
A Cerimônia de nome é uma cerimônia pública e social. Os seguintes elementos devem ser reunidos:
  • Mel
  • Sal
  • Pimenta da costa (atare)
  • Azeite (dende ou oliva)
  • Agua
  • Dinheiro
  • Doces
  • Obì
  • Gin
  • Orogbo
De cada elemento deste deve ser reunido apenas uma pequena quantidade. Todos esses materiais devem ser colocados em um prato ou bandeja e cobertos. Serão colocados na frente do moderador ou sacerdote.
A agenda é a seguinte:
  • Iwure Ibere (preces de abertura)
  • Prece para cada elemento sendo colocado na boca da criança
  • A explicação do Odù da cerimônia Ikoxéwaye com o nome escolhido nessa cerimônia.
  • O nome civil da criança
  • As preces de conclusão
  • A festa
A cerimônia inicia com o moderador explicando a todos os presentes o motivo deles estarem ali, como toda a liturgia Yorùbá inicia. Logo a seguir ele fará as preces de abertura e poderá cantar versos de Ifá que tenham a finalidade de abençoar e proteger a criança.
Cada um dos alimentos que estão no prato será então colocado na boca da criança, junto com uma reza específica para cada um deles, no tradicional estilo Yorùbá que também temos no Candomblé.
Esta colocação de alimentos na boca da criança é simbólica. Uma pequena porção do alimente deve ser colocada na boca da criança, não é necessário que ela coma ou engula.
A cerimônia segue conforme a agenda estabelecida e se conclui com a confraternização de todos com a comida servida.


A SEGUIR A CERIMONIA DE IMORI

quarta-feira, julho 24, 2013

Cerimonias que envolvem o nascimento na religião Yorùbá Parte 1 de 3

Cerimonias que envolvem o nascimento na religião Yorùbá 

Parte 1 de 3


Introdução

Em postagem anterior eu comentei o que está sendo feito errado em termos de Odù de Nascimento no Brasil, seja por Babalorixás que sem ter o conhecimento adequado adotaram um processo fantasioso de determinar esse Odù, como também por Bàbáláwo inescrupulosos que tem por obrigação saber o que é o certo de também adotam um processo fantasioso de determinar Odù de nascimento e até orixá (Òrìṣà) de pessoas adultas.

No texto anterior expliquei porque não é da forma como dizem, nesse aqui eu vou quebrar o galho de um monte de gente e dizer como se faz isso. Um dia esse BLOG vai ser indicado como de utilidade pública do Candomblé e Ifá...



O contexto religioso

A religião Yorùbá carece no aspecto litúrgico de cerimônias bem elaboradas para alguns momentos seculares importantes. Estas cerimônias existem em boa quantidade no catolicismo e isso faz com que essa religião arrebanhe muitos adeptos por conta disso. Faz também que ela seja considerada a religião de verdade enquanto as demais apenas arremedos (seitas, cultos, etc..)

Quem abre mão de batizar um filho quando nasce em uma igreja? Que mulher abre mão, com facilidade, do sonho de entrar de noiva em uma bela igreja?

As pessoas podem considerar essas cerimônias como sociais, mas, dentro do contexto religioso em geral e da igreja católica, estes são ritos litúrgicos importantes e que requerem que outros ritos sejam feitos antes, como os cursos de doutrina, a primeira comunhão, a crisma, confissão, etc.

As pessoas que se submetem a esse conjunto de liturgias devem se considerar como membros desta igreja. Além disso o Batismo e o casamento são por si só liturgias importantes e partes de uma religião completamente iniciática.

A Igreja católica é iniciática, assim como o Candomblé e Ifá. Você não pode simplesmente fazer parte dela. Claro que pode entrar em uma igreja, afinal a porta está sempre aberta. Mas tudo ali é iniciático. Você é iniciado dentro dela e o batismo é a primeira cerimônia. A primeira água que cai na sua cabeça determina tudo. A grande diferença é que as cerimônias do Candomblé são sempre grandes e muito internas, o catolicismo conseguiu depois de muitos séculos chegar a um formato padrão de missa e de liturgias que se integram facilmente com a sociedade onde ela existe e as pessoas se submetem a isso sem perceber o que estão fazendo.

Apesar de serem ritos iniciáticos importantes, tão importantes quando os do Candomblé, as pessoas aceitam isso com facilidade. Todos aceitam com facilidade beber o sangue de cristo quando o padre, liturgicamente transforma o sangue em vinho. Todos aceitam com facilidade comer a carne do sacrifício quando o padre transforma a hóstia no corpo do cristo, o sacrifício primordial que evita todos os demais.

Não perceberam isso? Não se lembram que naquele momento estão bebendo sangue e carne de sacrifício?

Se você não acredita nisso então, o que o padre esta fazendo lá? O que o padre fez por 30 a 45 minutos de missa e rezas? O ponto culminante de uma missa é ele transformar o vinho no sangue e a hóstia no corpo do cristo. Se você não acredita nisso não tem fé na sua religião e nem sabe onde está.

Pois bem, superada esta questão, a de que toda missa envolve um sacrifício e seu consumo, volto ao tema que o Candomblé carece dessas cerimônias litúrgicas-sociais. O casamento que fazem no Candomblé é uma invenção de pais de santo brasileiros. Não guarda qualquer referência com a matriz religiosa Yoruba, onde o casamento é uma festa eminentemente civil com algumas pequenas cerimônias ou simbolismos religiosos.

O objetivo deste texto não é falar de missas ou de casamentos, estes serviram apenas para estabelecer o contexto social e religioso.

A mais importante cerimônia dentro da religião, junto com o rito de passagem da morte, o axexê, sem dúvida é o batizado, ou melhor, o seu equivalente Yorùbá que é a cerimônia de nome.

Os Yorùbá dão muita importância a essa cerimônia isso por alguns motivos. O primeiro é porque nessa cerimônia marca o nascimento, a entrada da pessoa no àiyé. Esse é o principal simbolismo. Como parte disso será determinado o Odù de nascimento da criança e esse Odù é muito importante para orientar a vida da criança e também resolver coisas imediatas ligadas a sua sobrevivência.

Em seguida temos a questão da ancestralidade. Os Yorùbá e sua religião acreditam que vivemos em reencarnações sucessivas e assim somos sempre, ou quase sempre a reencarnação de um ancestre. Nesta cerimônia determinamos essa origem.

Existem também a questão do orixá (Òrìṣà). Podemos nesta cerimônia em especial determinar o orixá (Òrìṣà) da criança. Por fim existe a importante questão do nome religioso que se adiciona ao nome cível. Dessa forma a cerimônia de nome, equivalente ao batizado católico é muito importante.

Para aqueles que acreditam nesta religião e a seguem, esta deve ser a primeira cerimônia que o recém-nascido se submete. Jamais leve uma criança em uma Igreja católica ou evangélica, por imposição de partes de sua família ou do cônjuge, sem antes fazer os ritos adequados de sua religião.

Eu considero questionável uma criança ser batizada em mais de uma religião. Batizado é uma vez só. Quem fez o primeiro é quem fez o que vale, não existem 2 apresentações para deus. Mas as pessoas tem seus motivos para não assumir a religião que tem e podem até mesmo não terem entendimento do quão tolo é batizar uma criança em 2 religiões.

Sendo a religião católica iniciática ao passar pelo batismo você iniciará a criança nesta religião. Como depois disso ir em outra? Ela já foi iniciada.

É claro que a cerimônia de nome que eu vou explicar aqui não existe no Candomblé. Se o Candomblé se preocupasse em ser uma religião mais ampla, saindo de guetos étnicos, como tem ocorrido nos últimos anos, o sacerdote da casa já deveria ter buscado uma alternativa para isso, que não fosse copiar o formato que os católicos já fazem.

Quando uma religião copia o formato da outra para uma liturgia ou processo ela se coloca como uma religião menor e coloca também a outra como uma religião maior, superior.

Mas vamos esquecer essas críticas que não acrescentam muito, não tem muita graça bater em morto. O fato é que não existe um processo adequado no Candomblé. Isso ocorre pelo desconhecimento do que deve ser feito, do seu simbolismo, como também devido a ausência do culto primordial para fazê-lo que é o culto de Ifá.

Mesmo na Nigéria onde as religiões dominantes são o cristianismo e o islamismo, pessoas de religiões diferentes como os muçulmanos procuram os Babaláwo para fazerem a cerimônia de nome ou pelo menos o primeiro passo que é a entrada da criança no mundo.

Com a vinda de Ifá e também com o maior conhecimento teológico da religião Yorùbá a gente passa a ter acesso e conhecimento de liturgias importantes da religião que não foram refletidas antes no Candomblé mas que podem agora ser incorporadas. É necessário, claro, uma integração ecumênica entre os cultos para que o Babaláwo junto com o Babalorixá (Bàbálórìṣà) conduzam essas cerimônias sem prejuízo para o Egbé do terreiro. O Babaláwo não pertence a comunidade do terreiro, via religião ele se integra no ecumenismo que se faz necessário.

Esta cerimônia tem um significado tão importante e uma utilidade tão grande que se isso for bem adotado e praticado poderia substituir o desejo de o batizado católico ser a primeira cerimônia a ser procurada pelas pessoas.

Claro que além de encontrar quem saiba fazê-la, que é muito simples, o mais importante é encontrar uma pessoa com bons valores e ética para que esta pessoa saiba fazer isso sem induzir a quem o procura a alguma coisa e sem violar outras crenças e valores importante do consulente.

Sem dúvida a capacidade de análise e interpretação do Babaláwo é o fator mais relevante para que o consulente obtenha desse processo um suporte importante para a vida da criança. Essas pessoas que apenas decoram tratados e repetem explicações e são confusas teologicamente, pouco podemo contribuir em um momento tão importante da vida de um recém-nascido.

Mesmo na Nigéria, terra dos Babaláwo existem os Babaláwo e os babalawo. Tem aqueles que sabem interpretar e aqueles que servem para passar ebó.



Pisando no mundo - ikoxéwaye



A primeira cerimônia que se faz tem o significado de fazer a criança pisar pela primeira vez no mundo. Ela é feita com o recém-nascido, a partir do terceiro dia até no máximo o oitavo dia. Esta deve ser a primeira vez que o recém-nascido coloca os seus pés no àiyé. Assim ele pisará no mundo.

Não preciso lembrar que o reencarnacionismo é um dos pilares da religião Yorùbá. A religião acredita que todos queremos viver no àiyé, porque aqui vivemos com nossa família e temos acesso a todos os prazeres e mistérios do mundo. Eu deduzo que a vida no Órun (ọ̀run) deve ser bastante desinteressante porque o motivo alegado para a reencarnação é apenas que queremos viver juntos no àiyé. Claro que em cada vida teremos objetivos pessoais diferente e também objetivos que podem ser passador por Olódùmarè, mas, vivemos porque gostamos de viver.

Por essa razão é muito importante as pessoas se casarem e terem filhos. Casar e ter filhos é considerado o curso de vida natural pela religião Yorùbá e talvez mais do que isso, o curso necessário. Para as mulheres não ter filhos não é considerada uma coisa boa e nenhuma delas quer isso para si. As mulheres precisam ter filhos para que os ancestres possam reencarnar, por isso se cobram e são cobradas.

Esta religião, como muitas outras estabelece a família como um núcleo importante e a capacidade de gerar filhos como um fator primordial, permitindo a continuidade da linhagem de descendência.

Um dos problemas que mais aparece em Ifá é a preocupação das mulheres em ter filhos, ou seja, resolver o problema de infertilidade e também o de sustentação da vida de crianças, para evitar a mortalidade infantil.

Quando uma criança nasce o espírito que veio do Órun (ọ̀run) inicia um processo de se habituar com o àiyé e assumir sua posição naquele corpo. Nos primeiros dias ainda existe uma ligação muito forte com o Órun (ọ̀run). O espírito que renasce ainda guarda as lembranças do Órun (ọ̀run) porque aquele espírito acabou de vir o Órun (ọ̀run). Ele ainda está no processo de vir. Esta é a razão desta cerimônia ser feita tão cedo.

Podemos entender isso como o que ocorre em uma viagem de férias, por exemplo, ou quando você muda de emprego. Nos primeiros dias você ainda guarda muita ligação com o que deixou. Você leva alguns dias para se afastar daquelas lembranças e se focar na sua nova vida. Com o passar do tempo você se liga no seu destino e na vida neste destino e se esqueça da sua origem.

Quando saímos de férias do trabalho também é assim. Nos primeiros dias ainda ficamos preocupados com o que deixamos, mas depois esquecemos e passamos apenas a viver nossas férias.

O recém-nascido deve ser trazido ao Babaláwo ou ele deverá ir até sua casa, entre o terceiro e o oitavo dia após o nascimento. Será feita uma divinização com Ifá para a criança e na esteira de Ifá estarão apenas a criança e a mãe.

Esta cerimônia de pisar dentro do mundo, chama-se “Ikóxewaye”. A divinização é feita com o nascer do sol, nas primeiras horas da manhã, porque é presumido que nestas horas a alma da criança (ori inu) estará mais atenta.

É feito o posicionamento normal de uma consulta tradicional a Ifá com o Babaláwo de frente para o leste. A mãe fica na esteira à frente do Babaláwo junto com a criança.

Dois Obì serão sacrificados para o Ori da criança, fazendo-se todas as rezas necessárias para isso. Após eles serem sacrificados serão jogados no meio do Opon Ifá, para confirmar que o Ori da criança aceita os Obì e a cerimônia que vai se realizar. Se não houver aceitação se deve investigar o motivo e eventualmente suspender a cerimônia.

Os motivos para isso podem ser desde o Babaláwo não ter se preparado adequadamente para o que vai fazer como também o Ori da criança não estar o aceitando para este trabalho. Se isto ocorre, ou se troca o Babaláwo ou se marca outro dia. A investigação da resposta indicará o que deve ser feito. Dessa maneira nunca deixe a cerimônia para o último dia, faça o mais cedo possível. Também não tenha pressa, procure bem antes a pessoa certa e acredite no que o oráculo responde.

O Obì deve ser tocado no Ori, na testa, atrás do pescoço e na sola dos 2 pés antes de ser aberto e jogado.

Com a permissão para realizar a cerimônia, o Babaláwo deve pegar a criança descalça e tocar os pés dela no chão. Depois disso a criança deve tocar os pés no centro do Opon Ifá. O Opon ifá é considerado uma representação do próprio mundo, do próprio universo e o portal entre o aiye e o orun. Ao pisar no centro do chão e depois no centro do Opon a criança estará então pela primeira vez pisando e entrando no próprio mundo.

Esta cerimônia deve ser feita junto ao chão e não em andares superiores de prédios. Se não é possível fazer junto ao chão, é indicado que seja levada terra para que a criança pisa em terra real antes de pisar no opon. Se a cerimônia estiver sendo feita no andar térreo então isso não é necessário.

A criança deve ainda, pelas mãos do Babaláwo, pisar nos Ikin que estarão no Ajere, no Opele e também nos Ìbò. Todos os instrumentos que forem ser usados deverão ser tocados pelos pés da criança.

A criança é devolvida aos cuidados da mãe e antes de ser iniciar a consulta deve ser feita uma louvação aos Orixá e todos os 16 Odù Meji devem ser rezados. Os Ikin devem ser tocados na testa da criança e deve ser feita a divinização tradicional, determinando o Odù principal, os 2 testemunhos, os estados de Iré ou Ayewo e sua origem.

Deve ser rezado o Odù principal que foi determinado.

O Babaláwo deverá interpretar o conjunto de Odù no sentido de um Odù de nascimento e não de uma consulta comum, dando explicações sobre a anergia que cerca a criança, que dificuldades ou facilidades ela pode esperar, que atenções ela deverá ter.

Existem casos de Odù que indicam envolvimento com Abiku, Egbé Orun, Ajé e egungun que devem ser explorados e entendidos para que sejam feitas a melhores recomendações. Mas nem sempre existem essas situações delicadas. Para poder fazer essas explicações e interpretações o Babaláwo deve ter um conhecimento consistente da teologia da religião para que ele possa entender com o que está lidando e com as mensagens do oráculo.

Observem é muito diferente a abordagem de um Babaláwo que sabe tratados e faz recomendações imediatas, indicando e passando ebós para um outro que tenha o entendimento da religião e dos significados da religião. É necessário muito bom senso e cuidado na interpretação de um Odù de nascimento. Mesmo na Nigéria existem sacerdotes e sacerdotes, quanto mais aqui no Brasil com todo o tipo de gente que finge ser o que não, que finge ter o conhecimento que não tem e que está acostumado a misturar ao mesmo tempo candomblé, Ifá, umbanda, kardecismos, cristianismo como se tudo isso fosse a mesma coisa.

Em função do Odù poderá ser escolhido um nome religioso para esta criança. Esta escolha depende muito do conhecimento de Yorùbá do Babaláwo porque ele terá que ser capaz de com as informações que tem de construir um nome a partir de uma combinação de palavras ou frase. A intuição do Babaláwo também será muito importante. O nome escolhido é submetido ao ori da criança, através do oráculo, até que se encontre um nome que seja aceito.

O Babaláwo pode adicionar outros detalhes nesta cerimonia que julgar adequados, sem exageros e sempre respeitando a posição, origem ou formação do consulente.

No fim da consulta, já com o ebó determinado, o Babaláwo ira pegar um pouco do Iyerosun colocar nas mãos da mãe da criança que esfregará suas mãos e colocar ela mesma um pouco do pó na sua língua.

O restante do pó deve ser guardado e dado para a mãe da criança guardar para usar em momentos de necessidade da criança.



Continua... A seguir a cerimônia do nome

domingo, julho 21, 2013

Odù de Nascimento Como se determina o Odù de Nascimento


Odù de Nascimento

Como se determina o Odù de Nascimento


O candomblé desenvolveu um hábito sem sentido de determinar Odù através de número. É uma prática sem nenhuma razão e que virou verdade apenas porque uma legião de pessoas, Babalorixás e Iyalorixás, que não entendo Ifá e não sabendo o que é um Odù, encontraram, ingenuamente, nessa numerologia uma forma de expressar o que não sabiam.

Sim, na ausência de conhecimento e na falta de condições de buscar conhecimento se agarraram a uma coisa sem propósito (mais bem simples), que é traduzir um Odù através de uma operação aritmética. Isso é muito conveniente, porque substitui conhecimento e aprendizado por algo que qualquer criança pode fazer. As pessoas em vez de aprenderem de fato, substituíram conhecimento por invenção.

Claro que havia dificuldade para aprender, o conhecimento não era facilmente disponível e essa aritmética assim como outras explicações bobas sobre Odù acabaram surgindo e foi dado crédito a elas. Crédito demais.

Como todos passaram a adotar isso, essa aritmética idiota virou uma verdade. Sim, se todos repetem a mesma mentira, aquela mentira vira verdade no contexto daquelas pessoas. Foi isso o que ocorreu no Candomblé com essa questão de Odù.

Eu sempre comento esse assunto e vou continuar comentando porque isso tem que acabar.
Com a vinda de Ifá para o Brasil através de Cubanos e Nigerianos os brasileiros tiveram mais facilidade para aprender e entender o que é de fato Ifá e Odù. Viram a prática, viram como é o oráculo de fato e como são os processos de trabalhar com Odù. 

A primeira coisa que a gente entende é o quanto é boba a conta de determinar Odù através de números e principalmente da data de nascimento das pessoas. Gente, eu aprendi no Candomblé assim e já fiz centenas de cruzinhas com os tais 4 Odù. Mas, quando aprendi primeiro Yorùbá e depois Ifá, entendi que aquela aritmética não tem o menor sentido.

Então, a primeira informação para quem quer aprender: NÃO se determina Odù através de números. A segunda informação: não existe relação entre Odù e números.

Em Ifá, que é o oráculo original, não se usam números, apenas símbolos gráficos. Sem dúvida Odù envolve alguma complexidade. Não é um significado simples, é um contexto, com um significado complexo, mas, não é complicado, entretanto não vamos tratar desse significado aqui, apenas da forma como se apresenta.

Em Ifá, um Odù se traduz por uma marca gráfica, composta por 2 colunas. Cada coluna tem 4 elementos e esses elementos podem ser 1 traço vertical sozinho ( I ) ou 2 traços juntos ( II ). No total, 8 elementos gráficos em 2 colunas lado a lado formam um Odù.

Essa é a representação de um Odù.

Não existe dentro de Ifá, seja com o ikin ou com o Opele nenhuma correspondência de número com Odù. Não existe nenhuma forma de se determinar um Odù através de um número. O Odù nasce, sempre, como uma marca gráfica composta. Se existe um número associado a Odù, estes seriam 1 e 2, usados para contar os ikins...  e estariam associados a todos os Odù, mas isso apenas para criar as marcas gráficas.

Sob o ponto de vista da sociedade Yorùbá, não existe aritmética decimal. Números são substantivos, palavras.

Em nenhum momento, qualquer Odù, é associado e um número.
 
Essa relação foi inventada fora de Ifá, fora da religião Yorùbá, provavelmente no novo mundo (ilação minha). Isso é apenas uma prática de numerologia. Eu não tenho como entrar no mérito ou não dos que acreditam ou praticam numerologia, pelo contrário, existe uma mística sobre números enquanto símbolos. Mas no que diz respeito à religião Yorùbá isso não ocorre.
Os números são palavras, substantivos e a aritmética é coisa de árabes. 

Em algum momento da história alguém associou uma coisa a outra, tenho quase certeza que isso é bem recente e está ligado ao uso dos búzios uma vez que em Ifá não existe como se associar número a Odù. Por isso que eu digo que deve ter surgido no novo mundo. Aqui nas tradições da diáspora, os jogos de búzios são muito populares.

No jogo de búzios sim, por acaso, os números são associados aos Odù devido a quantidade de búzios aberto definir o Odù. Contudo, isso é assim por acaso. Qualquer ligação entre búzios abertos e Odùs poderia ser feita. Não existe nenhuma obrigatoriedade de associar determinada quantidade de búzios abertos com um Odù. Isto é uma convenção arbitrada.

Lamento dar essa má notícia. Mas não seja mais idiota em acreditar nisso. Porque ai não é mais falta de informação e sim burrice mesmo.

Não existe na religião Yoruba ou mesmo na cultura Yoruba qualquer operação que se faça com data de nascimento.

A evolução desta bobagem, associar Odù a um número, culminou com a elaboração de uma cruz onde são feitos Odùs para a pessoa. Isso virou regra junto aos Babalorixás e Iyalorixás, infelizmente e depois de forma geral dentro do Candomblé.

Mas esses Odùs fajutos não determinam o Odù de nascimento da pessoa.

Este processo é fajuto. Não de nenhuma atenção a isso e não dê atenção em quem diz para você Odù baseado em data de nascimento. Canso de ver isso em programas de rádios, pessoas nitidamente desinformadas.

Mas, para continuar, ou piorar, a marmotagem, aparecem uns Babalawo dizendo que determinam o Odù de nascimento das pessoas. Isso também é bobagem. Não acredite em idiotice só porque muda quem fala, porque no caso destes é muito grave porque ele tem obrigação de saber.

Não caia também nessa conversa só porque o cara diz que é Babalawo. Não acredite que ele vai dizer o seu Odù de nascimento e muito menos dizer qual o seu Orixá. São outros enganadores, do mesmo tipo que fazem isso com Búzios e dizem que são Babalorixás.

A determinação do Odù de nascimento de uma pessoa SOMENTE pode ser feita entre o terceiro e o oitavo dia de nascimento. Ela é realizada por um Bàbáláwo. Não pode ser realizada depois disso. 

Assim, somente neste período pode ser saber o Odù de nascimento. Quem não fez isso neste período nunca mais saberá o Odù de nascimento. Quem quiser saber o Odù de nascimento do seu filho que procure um Bàbáláwo neste período. Depois disso não é mais possível.
Existem 2 cerimônias importantes que um recém-nascido deve passar através de Ifá que visam determinar o Odù de nascimento e também a ascendência daquela criança (se pelo lado da mãe ou do pai), seus orixá (Òrìṣà).

E mais, nunca vi essa cerimônia em Tratado cubano de Ifá. Minha opinião é que os Cubanos desconhecem isso, assim, como desconheciam fazer Bori, tiveram que aprender a fazer aqui no Candomblé, de forma bem torta, pagando para receberem  Bori e prestando atenção em tudo para depois copiar.

Eu vou explicar essas cerimônias de nome aqui no blog na próxima postagem.

Nesta primeira postagem eu quero apenas voltar ao assunto para dizer que Odù de nascimento Não é determinado pela data de nascimento. Também não será determinado quando a pessoa já esta adulta.

Isso é feito por Babalorixás sem conhecimento (no caso do Odù por data de nascimento) e por Babalawo fajuto, no caso de determinar por Ifá o Odù de nascimento de pessoas adultas.

Na próxima postagem vou explicar as cerimônias que são feitas


Não deixe de comprar o livro "Oráculos Yoruba: dos Búzios ao Obì"  na Amazon.com.br

terça-feira, julho 16, 2013

Oráculos Yorùbá: dos búzios ao Obì

Finalmente publicado o meu livro, na loja Kindle da www.amazon.com.br

Procurem por este título:

Oráculos Yorùbá: dos búzios ao Obì

Pode também ser comprado em qualquer loja Kindle da Amazon.

Você não precisa ter um kindle para ler. Basta baixar o leitor de Kindle em software e APP que está disponível para Windows, Mac, iPads e Androids.


Para fazer perguntas e pedir explicações adicionais podem usar a comunidade: Ifá - blog.orunmila-ifa   Que pode ser procurada eu acessada a partir do meu perfil do G+ - Procurem por Marcos Arino


Sobre o livro, ele é o resultado de anos de pratica contínua e de pesquisa sobre o assunto dentro da religião. Não é um livro teórico e não é um copy and paste de outros livros. Todo material é inédito. Explica com detalhes como se usam os principais oráculos litúrgicos. 





Todo o material é original, mas, como estamos lidando com o mesmo oráculo e técnica muita coisa vai parecer com outras fontes, de fato é impossível ser completamente original. Mas podem ter certeza de que tive o cuidado de que este livro tivesse tudo o que os demais não tem. Espero que seja considerado uma obra completa.
 

Tem explicações, diagramas e fotos. Me perdoem pela diagramação meio amadora, mas, trabalhar com o formato de eBooks não é fácil. Muito complicado, nada fica como você planeja,

Pertence a uma série de livros. O próximo será sobre o eerindinlogun através de Ifá.
 

Quem quiser aprender a usar os oráculos vai ter no livro, na minha opinião o melhor material disponível. Os demais vão poder ter a oportunidade de falar de mim.

quinta-feira, julho 11, 2013

Oráculos Yoruba


Os que acompanham o BLOG me perdoem pela ausência mas, o tempo é elástico porém restrito. Estou investindo o que eu tenho para publicar o Livro Oráculos Yoruba: dos búzios a Obi

Será publicado em formato de eBook, através da Amazon.com.br para leitores Kindle.

Ele havia sido preparado para formato impresso e a reformatação esta se mostrando um trabalho hercúleo e cansativo, com bastante tentativa e erro devido a existência de fotos e ilustrações. Como eu já havia estudado antes o kindle é bom para texto...  o resto da bastante trabalho.

Acredito que mais uns dias termino e publico.

domingo, junho 09, 2013

O conceito de axé (aṣẹ́)

O conceito de axé (aṣẹ́)

(Texto completo)

Teologia Yorùbá

O Cosmo Yoruba - Parte 11


Axé (aṣẹ́) é um dos elementos de base desta religião, um dos seus pilares, na minha opinião o principal conceito para se entender toda a religião. A religião entende que Olódùmarè quando nos cria coloca uma centelha de seu poder dentro de nós. Axé (aṣẹ́) é a energia que todos temos é a nossa quintessência e tem origem em Olódùmarè. Axé (aṣẹ́) nos liga a Olódùmarè e torna esse a divindade suprema por excelência.

O axé (aṣẹ́) é dado por Olódùmarè para todas as coisas: As divindades, os ancestrais, os espíritos, humanos, animais, plantas, pedras, rios, palavras ditas em canções, rezas e pragas. Axé (aṣẹ́) é o poder que todos temos, ou mais amplamente, o poder que tudo no àiyé possui.

 

O que é axé (aṣẹ́)?


A definição que o uso da palavra axé (aṣẹ́) recebe dentro da religião é bastante ampla e, no estilo Yorùbá, uma mesma palavra é usada para descrever muita coisa, coisas importante e menos importantes. É um adjetivo muito usado por todas as pessoas no sentido de votos de sucesso e agradecimento. É como se você transmitisse para a pessoa que você fala que ela o axé (aṣẹ́) na forma de agradecimento ou que desejasse que aquela situação tivesse o axé (aṣẹ́) nela, etc...

Além desse uso coloquial axé (aṣẹ́) é acima de tudo um pilar da religião e é isso que inclusive justifica o seu uso de forma coloquial. As palavras tem axé (aṣẹ́) de forma que desejar axé (aṣẹ́) para alguém é como se você dividisse o seu axé (aṣẹ́) com essa pessoa.

Cada ser no Àiyé, que é o mundo que vivemos, possui uma composição única de axé (aṣẹ́) que lhe foi dada por Olódùmarè. Axé (aṣẹ́) é uma qualidade, uma virtude dada por Olódùmarè de maneira que cada elemento do Àiyé tem uma propriedade ou poder distinto. No caso dos humanos entendemos que essa virtude original varia e as pessoas podem ter virtudes, ou capacidades distintas. O axé (aṣẹ́) que recebemos é distinto.

A palavra “virtude” é usada por mim aqui para descrever esse poder mágico congênito, a propriedade particular ou comum a indivíduos ou materiais.

Axé (aṣẹ́) é também a força da vida, a energia vital, que nos faz viver. Também é a força que nos faz ter a capacidade de interceder no mundo através de poderes supernaturais.

Para não complicar vamos resumir que axé (aṣẹ́) como energia ele traduz:

  • A “virtude única” que Olódùmarè nos dá
  • A energia básica que todo ser tem e precisa para viver, a força do nosso corpo.
  • A força que nos dá a capacidade de interceder no mundo através de poderes supernaturais.

Podemos entender que, vendo de outra maneira, que existe uma parte comum e uma parte especial no axé (aṣẹ́). A parte comum é o aspecto de ser uma energia vital presente em todos os seres e que nos dá a vida. Neste ponto, axé (aṣẹ́) é um elemento básico e comum.

A parte especial é a virtude que recebemos de Olódùmarè a força que temos e a a quintessência que nos permite transmitir isso.

Tudo no àiyé é um ser, não importa se animal, humano, vegetal ou mineral. O que existe tem axé (aṣẹ́) que foi dado por Olódùmarè. O axé (aṣẹ́) é uma força diferente dos quatro elementos, por isso podemos de chamá-lo de quintessência.


O Conceito de quintessência


Este termo, quintessência, pode não ser do conhecimento de todos, mas, o conceito de axé (aṣẹ́) nos remete exatamente ao conceito de quintessência que foi largamente estudada e documentada no século XIX por famosos alquimistas como Francis Barret, Agrippa e Paracelso. A quintessência era a base da alquimia que unia ciência à religião, uma vez que os alquimistas eram religiosos e tinham o conceito de deus na base de tudo o que faziam. Muitos hoje dizem que ciência e religião são opostos, os alquimistas não entendiam dessa maneira.

O seguinte texto é retirado da obra Magus de Francis Barret.

“A alma é a forma essencial, inteligente e imperecível, o primeiro moto do corpo, e move-se por si mesma. O corpo, ou matéria, não consegue ou não se presta a mover-se por si só, e perde muito das qualidades primitivas da alma. Assim, torna-se necessário um meio mais aperfeiçoado. Este meio, entende-se, que seja o espírito do mundo, ou aquilo que alguns chamam de quintessência porque não é formada pelos quatro elementos, mas por uma certa coisa primeira, superior e além deles. Há portanto a necessidade de um meio pelo qual as almas celestes possam unir-se aos corpos densos, agraciando-os com dádivas prodigiosas. …. este espírito transmite todas as propriedades ocultas para as ervas, as pedras, os metais e os animais... este espírito pode nos ser útil se soubermos separá-lo dos elementos ou ao menos usar principalmente as coisas em que abunda...”

Este conceito é a base da alquimia e da cabala divina. Axé (aṣẹ́) é exatamente isto e não estou fazendo um sincretismo. Não gosto de sincretismo e não gosto de comparações, mas, não posso nessa explicação fugir disso. Muito pouca gente estudou esse conceito de supernatural nas 2 religiões para poder fazer essas comparações que estou fazendo.

Não estou trazendo para dentro dessa religião o conceito de outra, estou apenas fazendo um paralelo porque se trata do mesmo conceito e tenho um propósito positivo com isso.

Religiões diferentes, sociedades diferentes e tempos diferentes. Ambas possuem o mesmo entendimento de uma parte do supernatural. Não estamos aqui fazendo equiparações teológicas. A religião Yorùbá usa exatamente o mesmo princípio da alquimia quando trata de axé (aṣẹ́) e dos famosos ébó (ẹbọ), que são liturgias que distribuem, repõem e transmitem o axé (aṣẹ́)..

Eu, pessoalmente, como já disse, odeio explicar alguns conceitos fazendo comparações, tenho como opinião que toda a explicação deve ser original, mas nesse caso estou fazendo isso para acabar com o preconceito em relação a esta religião Yorùbá.

Olódùmarè da a cada elemento um poder original que tem origem nele. Esse poder torna cada elemento único, distinto e útil. O momento em que isso ocorre é aquele onde ele transmite o Emi e já foi descrito anteriormente. A liturgia que ele executa é mais do que apenas dar vida ao corpo é dar o axé (aṣẹ́) ao corpo.

Por essa razão Orixá-nlá (Òrìṣà-nlá) não pode sozinho fazer todo o trabalho, é necessário que Olódùmarè, após Orixá-nlá (Òrìṣà-nlá) concluir o corpo, de o sopro de vida ao que era apenas barro como também, e principalmente, transmita sua centelha divina às suas criações o axé (aṣẹ́). Isso não pode ser feito por Orixá-nlá (Òrìṣà-nlá), somente Olódùmarè pode transmitir o axé (aṣẹ́) e isso mais uma vez explica porque ele, Olódùmarè pode ter o título de ser a divindade suprema da religião Yorùbá.

O momento em que ele faz o mesmo com as demais formas, vivas ou não, não é explicado. Apenas a criação dos homens é definida, mas, devemos supor, por ilação que de alguma forma cada elemento vivo no àiyé recebe de Olódùmarè o seu axé (aṣẹ́).

Vejam o seguinte texto feito por mim por há muitos anos baseado nas ideias da alquimia:

Assim as pedras, metais, animais e ervas tem cada uma sua própria virtude que é herdada das inteligências ordenadoras e este é o ponto que nos interessa. De acordo com este princípio os elementos tem suas características criadas por deus, controladas pelas inteligências e que lhes são transmitidas pelos elementos e astros. Há portanto, uma virtude e um funcionamento em cada uma delas, mas são maiores no astro que as governa ou no elemento que a compõe.

As virtudes são justamente as características mágicas que buscamos nestes elementos de segunda ordem para podermos obter através da transferência destas virtudes para as pessoas nas quais trabalhamos. Assim virtudes não são as características físico-química dos elementos que lhes atribuem a aparência, beleza e valor, mas, sim a sua força mágica que foi designada por deus.

A alma é a forma original e essencial, mas esta precisa ter os seus poderes atribuídos às coisas, e isto se dá através do quinto elemento, ou quintessência, que é transmitido às pedras e cristais através do sol, da lua e dos atros e emprestam a estas as suas propriedades ocultas.

Desta maneira o poder dos elementos é um desígnio divino, criado por deus que é armazenado nestes através do elemento que os influenciam. Sempre será maior no astro que a rege e isto é muito importante e deve ser observado ao se analisar quando e como algo deve ser feito, porque tanto maior será o efeito mágico da pedra quanto intenso for o astro ou elemento que lhe dá a sua virtude.

Por esta explicação de origem alquímica, nós entendemos que os poderes dos elementos lhes são inerentes e dados por deus sendo assim importante sua permissão e autorização antes de serem operados. O operador como parte deste sistema de energia e sendo também em seu corpo um armazenador de virtudes e também do quinto elemento, usa a essência deste último canalizando-o para transmitir as virtudes destas para quem recebe. A pessoa que recebe esta energia vai através da sua própria quintessência transmitir a seu corpo as virtudes recebidas sendo então beneficiado por elas.

É uma explicação complexa mas que unifica as verdades das anteriores bem como estabelece a importância de se entender o papel dos atros e elementos no entendimento da magia das pedras.

Baseado no que já foi dito eu posso dizer simplesmente que os elementos são como baterias que armazenam e concentram a energia da Terra, onde entende-se Terra como o espírito do mundo.


Eu não teria, hoje, uma forma melhor para explicar o que é axé (aṣẹ́).

Os alquimistas foram mundanamente conhecidos por buscar transformar chumbo em ouro. Eles o faziam, mas não compensava, porque para transformar um metal em outro você precisava primeiro capturar as propriedades do material original, através do processo alquímico que eles desenvolveram e depois transmitir para o outro metal. Mas o processo não compensava a quantidade resultante era equivalente a inicial, assim não compensava fazer isso.

Mas a alquimia não se resumia a isso, transformar metal, e sim capturar as propriedades dos materiais e transmitir para outros. O foco da alquimia era a pedra filosofal que servia para muitas coisas inclusive trazer saúde e vida.

Alquimia era a ciência de entender como deus criou o mundo e usar o poder que deus deu às coisas para trazer benefícios para a humanidade. Um alquimista era um cientista de deus, assim como o é um Babalawo.

Na religião Yorùbá fazemos o mesmo processo. Entendemos as criações de deus, de Olódùmarè, capturamos o axé (aṣẹ́) das coisas e transmitimos para os seres que necessitam dele. Esta é a essência do que fazemos nas liturgias reparadoras.

Mas vamos deixar os alquimistas para trás, já serviram para ajudar na explicação que interessa aqui e nos aprofundar na forma como usamos o axé (aṣẹ́).

 

O objetivo das liturgias


A ideia de axé (aṣẹ́), repito sem exageros, é o núcleo desta religião. Todo elemento da terra tem axé (aṣẹ́), ele é um elemento necessário para a vida e a sua falta, ou excesso é o que nos traz problemas, sejam eles de saúde, mentais e mesmo de sorte na nossa vida.

É fácil entender que, o que nos traz desequilíbrio é aquilo que nos prejudica. Trazer de volta o equilibro para nossa energia e por consequência para nossa vida, é o que e as liturgias da religião Yorùbá fazem através de suas operações, os Ebó (ẹbọ) e as oferendas votivas.

Fica assim desvendado o primeiro mistério sobre as liturgias do Candomblé. Todos eles, sem exceção, são voltados para trazer o equilíbrio ao axé (aṣẹ́). O resto necessário para solucionar os seus problemas, você faz sozinho. Qualquer objetivo que as pessoas se disponham a realizar, através das liturgias, além deste não é mais religião é uma pratica qualquer.

O que permite as liturgias atingirem esse objetivo é porque o axé (aṣẹ́) como força mágico e sagrada tem muitas algumas propriedades importantes que vou explicar aqui. A primeira delas é que ele pode fluir entre os elementos, de maneira que você pode transmitir ou repor.

Ele pode ser coletado de uma fonte e aproveitado em outra, repondo a energia vital de quem necessita ou utilizando a virtude divina, que traz uma propriedade adicional e necessária para a pessoa que recebe, e que o elemento cedente possui. Folhas, por exemplo, são conhecidas por suas propriedades terapêuticas.

Todos os elementos, dos minerais aos animais, são fonte de axé (aṣẹ́) de diversas naturezas e tipos de uso. Em alguns casos precisamos deles como fonte da energia vital em outros precisamos da virtude especial que eles tem, que lhes dá um caráter terapêutico único, seja para questões naturais como supernaturais.

Vejam, essa última frase é simples, pode ter passado despercebida, mas é muito importante. Através das liturgias podemos endereçar tanto as questões ligadas a problemas naturais, como doenças, como também problemas ligados a alma e espírito que pertencem ao supernatural. A religião vê o ser humano de uma forma holística e tem uma concepção mais ampla do que por exemplo a medicina e outras ciências tem que somente conseguem ver as questões naturais. Lembro que muitas culturas orientais, ligadas ou não a religiões, também tem uma visão mais holística do nosso ser.

Mas religião não substitui medicina e muito menos concorre com ela. Apenas podemos endereçar coisas naturais quando elas também tem causa em questões supernaturais. Ao removermos a raiz do problema, resolvemos ou ajudamos a resolver as consequências, que são as manifestações visíveis.

A intensidade dessa força vital, o axé (aṣẹ́), nos seres vivos pode variar, aumentando ou diminuindo. Ela é sujeita a erosão do tempo e do seu uso contínuo e direcionado. Quando isso ocorre o elemento que o contêm perde sua energia. No ser humano a perda de axé (aṣẹ́) poderá levar a enfraquecimento, doenças, desequilíbrios emocionais e físicos.

Esses desequilíbrios e doenças é que trazem os problemas e desestabilizam a vida da pessoa. Eles são a causa raiz. Os problemas que você passa advém das consequências da sua perda de axé (aṣẹ́), são sintomas. É como um dominó. Uma primeira pedra é derrubada e esta pedra derruba a próximo e esta a próxima e assim vai.

O que fazemos na religião e no nosso oráculo não é olhar para as últimas pedras que foram derrubadas e sim para a primeira, a que derrubou todas as demais.

Não adianta nada você gastar esforço para colocar as últimas peças do dominó em pé se o problema tem origem bem antes. Você coloca ela em pé isso dura um tempo e logo depois elas vão cair de novo.

É neste momento entra em ação o oráculo da religião, seja o de Ifá como o eerindinlogun.

Na religião Yorùbá é o oráculo que se encarrega de detectar o problema que causa a perda ou excesso de axé (aṣẹ́) e também de indicar as liturgias que são necessárias para fazer o seu equilíbrio.

O oráculo religioso não é um instrumento de previsão do futuro ou de solução de problemas. Essencialmente é um instrumento para detectar e devolver o equilíbrio do axé (aṣẹ́) das pessoas.

Lembre-se que nesse momento trabalhamos com 2 princípios, o primeiro é a reposição de energia vital ou o seu equilíbrio. O segundo é que os materiais possuem as virtudes especiais, aquelas propriedades divinas e que serão obtidas através da liturgia, transferindo elas para a pessoa que precisa.

O processo não é apenas uma operação de “ligar você na tomada” para repor sua energia. Passa por mais coisas. A primeira é a questão das virtudes e que determina por exemplo os materiais que serão usados e o que processo será utilizado. Essas virtudes trazem coisas que precisamos para resolver os problemas.

Se você entendeu até aqui, ótimo, caso contrário reveja o texto para ter certeza que esta compreendendo o que é o axé (aṣẹ́), o que eu chamo de virtude, como o axé (aṣẹ́) se caracteriza (os tipos) e como ele é obtido e usado.

As liturgias, além de reporem a nossa energia e usar as virtudes especiais dos materiais que fazem parte de cada procedimento, lançam mão ainda 2 outras coisas, a primeira é a atuação do divino, ou seja das divindades, e a segunda é a ação da magia que pode mudar coisas no mundo natural.

Um sacerdote não é um médico. Ele é um religioso, mas, como já disse a religião tem uma visão holística de nossa vida e corpo. Entendemos que ao restabelecer o equilíbrio das energias do nosso corpo, ao repormos o axé (aṣẹ́) e ao eliminarmos as causas que levam a essa perda, estaremos dando condições para que o próprio corpo se reestabeleça.

Isso é feito com a ajuda divina, de Olódùmarè e também usando as fontes de axé (aṣẹ́) que Olódùmarè colocou no Àiyé, uma vez que, como já expliquei, não podemos criar axé (aṣẹ́) do nada, temos que obtê-lo de uma fonte natural.

O oráculo é o instrumento que o Bàbáláwo usa para fazer isso. Esta é uma explicação bastante visceral de um oráculo, mas, acreditem, é isso mesmo.

É o entendimento desta religião que o axé (aṣẹ́) deve ser equilibrado. Tudo é feito para que este equilíbrio seja atingido e que a pessoa possa desta maneira levar sua vida de forma normal, superando com força, determinação, trabalho e persistência os seus obstáculos e perseguindo os seus objetivos.

Nas liturgias e oferendas. Os materiais usados são a fonte do axé (aṣẹ́) que será transmutado e transmitido na forma da quintessência. As divindades não comem as oferendas e muito menos precisam delas, nós precisamos. A escolha dos materiais e elementos depende da finalidade e também da divindade, cada divindade tem afinidade com determinados tipos de elementos.

Quando realizamos um Ebó (Ẹbọ) não estamos fazendo um processo científico, tudo na religião é feito através das divindades, dos orixá (Òrìṣà), que foram as divindades colocadas por Olódùmarè para cuidar da gente aqui no àiyé. A realização da liturgia e a conversão das oferendas votivas em axé (aṣẹ́) depende da intervenção do divino. São as divindades que intercederão por isso.

Veja, os próprios alquimistas também trabalhavam com o mesmo princípio. No que pese uma aparente base científica no que eles faziam, de fato nada aconteceria sem o divino, sem a intervenção de deus e dos anjos.

O sacerdote é uma pessoa preparada para fazer o que faz, e vou falar sobre isso mais adiante. Mas, mais do que somente ele, o divino atua junto com ele e através dele para que as coisas funcionem.

Dessa forma, mais do que estarmos repondo energia perdida e usando virtudes, é o divino que a partir de nossas orações e de sua presença constante faz com que isso funcione e atue da maneira adequada, nós, somos intermediários entre o àiyé e o Órun (ọ̀run).

É importante lembrar, por fim, que Ebó (ẹbọ) é uma palavra meio genérica, que é usada para mais de uma coisa (estilo Yorùbá...). Assim pode ser uma oferenda ou uma liturgia. Oferendas sempre são usadas para dar axé (aṣẹ́) que será usada para a pessoa ou para alguma ação de magia. Os Ebó (Ẹbọ) pode ser procedimentos para retirar energias negativas, dar energias positivas, retirar excesso de energia positiva ou usar as virtudes com objetivos terapêuticos seja para o corpo ou para a alma.

 

O axé (aṣẹ́) e os materiais


Não conseguimos gerar axé (aṣẹ́) do nada. Temos que obtê-lo de uma fonte deste mundo. Axé (aṣẹ́) é uma exclusividade de Olódùmarè. Neste momento entra a nossa ética e sistema de valores para balizar as escolhas. Como eu disse, tudo o que existe é criação de Olódùmarè, somos mais uma delas e Olódùmarè não tem preferencias.

Não é verdade que a religião Yorùbá seja baseada no uso de animais como fonte de axé, isso é uma tolice. Animais são muito caros e vida se trata com respeito, mesmo que seja para ajudar a outra vida. O que se faz é de uma religião inteira, complexa e com conceitos extremamente positivos pegar apenas um detalhe e usá-lo de forma arbitrária e questionável. Isso, principalmente, vem de religiões que são extremamente pobres na forma de ver a felicidade da vida das pessoas na terra.

Os materiais usados na religião Yorùbá são esmagadoramente grãos, frutos, castanhas, raízes e principalmente folhas. Tudo isso nesta religião é sacrifício. Sacrifício é o ato de usarmos uma coisa com o objetivo de dar a outra. Assim sacrificamos folhas, sementes, castanhas, vegetais, legumes e inúmeros outros materiais. Tudo isso é sacrifício e é usado para obter energia vital e virtudes.

Seres vivos também são portadores de axé (aṣẹ́), um tipo bem especial e intenso. Em alguns casos essa fonte é necessária. Mas isso não é o comum, é bem especial e seu uso litúrgico ocorre em casos especiais e para pessoas especiais. O seu uso como fonte de axé (aṣẹ́) é necessário, mas, por inúmeras razões deve ser criterioso.

Muitos podem, neste momento, dizer que estou diminuindo a proporção das coisas e tapando o sol com a peneira. Não, não estou. O problema é que existem coisas que a maior parte das pessoas desconhece ou não quer ver.

A primeira coisa é que não sendo você vegetariano, e existem muitos poucos que o são, você consumirá diariamente bastante proteína animal para viver. Milhões de animais são sacrificados diariamente para atender a sua vontade ou preferência de consumir proteína animal. Esses sacrifícios são feitos, então, porque você come proteína animal. Animais são criado exclusivamente para serem consumidos, vivem em condições desumanas e são sacrificados ainda em procedimentos péssimos. O mercado de carnes especiais gera um pocesso de tortura na criação dos animais.

As pessoas fingem que isso não existe e cinicamente acham que os frangos já nascem congelados ou o boi já nasce fatiado. Essas pessoas são as primeiras a se levantar porque por acaso isso é feito de forma muito mais decente dentro de uma religião. Se levantam por nada, apenas por preconceito, porque elas não fazem piquete na frente de um abatedouro de frango ou de animais.


Ja ouvi gente dizendo que não se incomoda com isso porque ele não ve os animais sendo mortos, somente vê eles prontos no supermercado. Isso me parece hipocrisia. Não se preocupam com os animais que comem mas se dão ao trabalho de se preocupar com uma religião que por acaso abate os animais que consome.

Inúmera religiões incluem em seus rituais o uso de animais. Os judeus fazem isso seja como liturgia ou no seu dia a dia. A comida kosher é prepara liturgicamente por sacerdotes e os judeus as compram para o seu dia a dia. Algumas tribos judaicas até hoje fazem sacríficos litúrgicos a deus, a Jeová, o mesmo deus dos católicos. Chama-se Holocausto. Somente as tribos que usavam o templo de salomão pararam de fazer sacrifícios com regularidade, mas tribos como os Samaritanos, nunca usaram o templo de Salomão e por isso nunca interromperam. Os frangos abatidos no Brasil e exportados para os árabes passam um por uma liturgia para que esse sacrifício seja feito da forma como a religião requer. Os católicos sacrificaram inúmeras pessoas acusadas de heresia ou bruxaria em nome de seu deus. Dezenas de outras religiões usam as oferendas como forma de compartilhar sua prosperidade com deus.

Assim, nesse mar de casos, quando se fala da religião Yorùbá, como o Candomblé, a única coisa que as pessoas lembram é que também se faz a mesma coisa que os outros fazem. Nada mais interessa. Parece que as pessoas nesta religião vivem para matar bichos.

Existem um fator que poucos conhecem e é bem simples. Muitas casas incluem o uso de animais em trabalhos apenas porque as pessoas precisam comer carne. Só por isso.

Entenda dessa maneira, consumir carne não é crime, somos onívoros e comemos vegetais e carnes. Uma casa, as vezes sustenta muitas pessoas e os trabalhos que são feitos, principalmente para clientes (pessoas externas à casa) servem majoritariamente para repor a dispensa da casa. Parece engraçado e é mesmo. Os não membros de uma casa pagam para a subsistência das pessoas da casa, nem sempre com dinheiro, também com dinheiro, mas principalmente com materiais que são usados no que é pedido.

Uma casa de candomblé, principalmente as mais antigas e tradicionais, tem dentro delas uma grande comunidade de pessoas descendentes dos fundadores. Essas pessoas vivem ali e as vezes somente se dedicam à religião, como os monges e freiras. Essas pessoas precisam comer diariamente. Um dos principais motivos de uma casa abrir suas portas para atender, através do jogo de búzios, clientes, é para ter dinheiro e alimento para essas pessoas.

As pessoas então tem a impressão de que animais sempre são incluídos ou fazem parte do Candomblé, não fazem, na maior parte dos casos são acessórios colaterais, não seriam necessários.


Deixando de lado essa questão dos animais, o axé (aṣẹ́) será coletado de folhas, sementes, castanhas e alimentos crus ou cozidos. Quase tudo é fonte de axé (aṣẹ́). A escolha de cada um desses materiais e a sua combinação esta ligada a necessidade, a virtude que eles tem e à divindade que intercederá pela pessoa.

Cada divindade tem um conjunto de materiais que são parte da sua afinidade e outros que não. A maior parte dos materiais é comum, mas, existem tanto uma lista de preferência como de proibições.

As folhas são um dos materiais mais importantes na retirada do axé (aṣẹ́) e também mais poderosos. Praticamente nada se faz sem folhas ou sementes. Cada folha tem uma finalidade litúrgica que faz com que elas sejam usadas na forma bruto ou através do seu sumo.

Existem pessoas que defendem que tudo pode ser resolvido apenas com folhas. Esse é uma questão antiga e em Ifá consideramos que o sacrifício é mais forte do que as folhas e que sem o alimento do sacrifício as pessoas perecem. A verdade é que sem folha não existe resultado certo.

 

O axé (aṣẹ́) e as Iniciações – O poder que se ganha




Além da questão de repor o axé (aṣẹ́), que eu já comentei muitas vezes, temos também as virtudes, ou poderes, que podem ser transmitidos de um material para outro. Não se trata de repor a energia perdida mas de ganhar um tipo de energia e poder que a pessoa não tinha, vinda de outra pessoa ou elemento dando a essa nova pessoa uma capacidade que ela não possuía, trata-se do axé (aṣẹ́) transmitido.
Liturgias e iniciações tem esse efeito de transmitir axé (aṣẹ́) e qualidades. Um sacerdote passa por um longo processo iniciático onde gradualmente irá receber poderes e capacidades que não tem. Esses poderes serão as ferramentas de seu trabalho no seu dia a dia.

Toda liturgia feita por um sacerdote é um processo complexo que envolve a fonte de axé (aṣẹ́), a sua capacidade de operar com isso (o axé (aṣẹ́) que ele possui) e a participação do divino que o suporta e auxilia nesta tarefa.

A capacidade de fazer determinadas liturgias e de ser este intermediário na transmissão do axé (aṣẹ́) enquanto energia, é um axé (aṣẹ́), uma virtude que se adquire através do processo de iniciação e formação.

Da mesma forma como se é intermediário na transmissão do axé (aṣẹ́) também o sacerdote, ou operador da liturgia, transmite o seu próprio axé (aṣẹ́). A pessoa que faz é também afetada pelo procedimento. Isso vai requerer que ele também se submeta regularmente a um processo de reposição e equilíbrio, essas pessoas não estão acima da lei natural que rege todas as coisas. O trabalho delas gera um desgasta continuo que deve ser corrigido sob pena de esta própria pessoa se prejudicar.

Os processos iniciáticos que existem dentro da religião Yorùbá tem como objetivo preparar o iniciado e futuro sacerdote para poder atuar como o intermediário entre o Órun (ọ̀run) e o àiyé, na manipulação do axé (aṣẹ́) e da energia dos Odù que é uma outra forma de energia divina que é explicada em outro texto. Para poder ser o intermediário dessas operações de magia, transmutação, condução e transmissão de axé (aṣẹ́) o operador necessita algumas vezes receber capacidades e habilidades que são transmitidas por outra pessoa.


Este é outro conceito muito importante na religião o do axé (aṣẹ́) transmitido. O axé (aṣẹ́) enquanto virtude e capacidade litúrgica para lidar com o divino deve ser transmitido de pessoa a pessoa. Um sacerdote pode ter nativamente algumas capacidades, isso esta ligado a sua herança pessoal e familiar, ao seu orixá (Òrìṣà) e ao seu destino na vida. Mas, outras capacidades necessárias para lidar com essas energias divinas devem ser transmitidas de outra pessoa que já as possui. Isso é necessário devido a estarmos lidando com forças supernaturais poderosas e para segurança das pessoas que recebem o que ele faz e eficácia do que ele faz é necessário que a pessoa receba o axé (aṣẹ́) para poder trabalhar.

O que estou dizendo é que uma pessoa para poder operar com o divino, ser o operador, seja Bàbálorixá ou Bàbáláwo, deve ter o axé (aṣẹ́) necessário para isso, e isso é parte de um processo iniciático e hereditário. O sacerdote fará parte de todo uma linhagem de outros sacerdotes. Essa herança na forma de axé (aṣẹ́) é a virtude de Olódùmarè que ele deve possuir para poder operar com as energias de axé (aṣẹ́) e de Odù.
Não se pode dar o que não se recebeu.

Essa é uma frase muito simples mas que resume extremamente bem o que estou explicando. A pessoa precisar receber o axé (aṣẹ́) que vai transmitir. No caso do sacerdote que vai fazer liturgias mais complexas do que as oferendas votivas, ele precisa ter recebido o axé (aṣẹ́) para proceder aos Ebó (Ẹbọ) e sacrifícios. Ele não pode se autodoar esta capacidade. Na maior parte dos casos ele mesmo erá que ter passado pelas liturgias que vai executar.


É verdade que algumas pessoas já nascem com algumas capacidades, mas isso não cobre tudo o que é necessário. É a iniciação que molda e complementa esta capacidade dando a essa pessoa a virtude divina na forma de axé (aṣẹ́). Além disso a pessoa precisa adquirir conhecimento para fazer as liturgias.

Se submeter a liturgias e Ebó (Ẹbọ) com pessoas que não tenham recebido isso, que não tenha ganhado o axé (aṣẹ́) para fazer isso é se submeter a um processo instável com uma pessoa que pode não ter nem o conhecimento nem a capacidade de fazer o que se propõe. Você se arrisca a jogar tempo ou dinheiro fora e pior, piorar sua situação.

 

O axé (aṣẹ́) nas palavras e símbolos


Como na alquimia, a religião Yorùbá deposita axé (aṣẹ́) nas palavras orações e selos.

O processo de Ifá é baseado em versos que invocam forças primordiais do supernatural. As palavras tem axé (aṣẹ́) e devem ser faladas e voz alta. Nomes são importantes e as orações são fundamentais para a ligação Órun (ọ̀run) e àiyé.

Esse princípio de que palavras e orações tem poderes mágicos existem em muitas religiões. Os mantras são baseados nisso, os encantamentos são baseados nisso também. Os Yorùbá entendem que palavras são pronunciadas por nós e transportam nelas o nosso axé (aṣẹ́).

Outro aspecto são os símbolos ou selos. Eles estão presentes em Ifá e não no culto de orixá (Òrìṣà). Ifá baseia o seu processo de magia e energético nas orações, palavras na forma de versos e também nos símbolos gráficos dos Odù. Esses símbolos são “selos” que invocam a força divina. Nesse caso não podemos dizer que seja axé (aṣẹ́) eu prefiro qualificar como um outro conceito de energia divina que não vou explorar aqui.

Veja o axé (aṣẹ́) esta presente em nós, seres e objetos, sua fonte e uso é como já foi descrito, mas, existe uma força adicional que é o poder divino, o poder que tem os orixá (Òrìṣà) para interferirem no nosso mundo e que vem junto com os Odù e invocados através das marcas de Ifá.

 

A magia como parte da religião



Magia é transformação; Transformação é magia; Toda magia é mudança; Toda a mudança é magia. (Scott Cunningham)

As soluções de magia, através do axé (aṣẹ́) são possíveis, mas, não são o foco da religião, são um efeito colateral da manipulação do axé (aṣẹ́).

Magia é um processo natural de se lidar e trabalhar com elementos e energias naturais. Podemos considerar que uma magia é realizada quando efetuamos uma modificação de qualquer condição no mundo através de um ritual. Isto não é nada mais do que você focar o seu desejo na intenção de alguém ou alguma coisa e mobilizar o supernatural para isso.

Essa religião acredita em magia como um poder inerente de todos nós, como uma capacidade dos orixá (Òrìṣà) e um instrumento legítimo de uso. É algo que Olódùmarè nos deu e devemos usar para ter uma vida melhor.

Não existe nada de engraçado e pequeno nisso. Pequeno é quem não acredita em magia, quem acha que o mundo é apenas o natural e que a razão e física dirigem o mundo. Essas sim são pessoas pequenas ante a grandiosidade do mundo criado por Olódùmarè. Não entenderam onde vivem.

O uso da magia é um processo legítimo de nos socorrer em nossas necessidades. Ela é feita através da manipulação do axé (aṣẹ́) e do poder dos orixá (Òrìṣà). Lembro a todos que esta religião estabelece que vivemos no àiyé porque queremos. A gente vive para ser feliz e não para sofrer. A divino nos assiste nessa caminhada de vida nos ajudando a ser felizes. A magia é parte disso.

Através do processo de aquisição e manipulação do axé (aṣẹ́) podemos obter resultados que modifiquem a realidade. Isso é feito para o nosso bem. As liturgias além de buscarem o equilíbrio da pessoa também buscam sua felicidade. A felicidade é o objetivo final os demais são meios e insumos para isso. Neste sentido restaurar a capacidade do indivíduo viver e autonomamente é uma prioridade e também o uso da magia como forma de remover obstáculos e situações negativas.

A ética da religião e dos orixá (Òrìṣà) determinam o que pode ou não ser resolvido por magia. Existem coisas que nos mesmos plantamos e trouxemos para a nossa vida. Essas coisas vamos ter bastante trabalho para nos livrar porque boas ou más elas nos pertencem. Passamos anos criando aquela situação ou aquele problema e depois queremos que umas bolas de farinha resolvam? “Nem a pau”

Outros problemas ou situações não nos pertencem, foram trazidas por outras pessoas ou por situações normais da vida. Essas serão mais facilmente resolvidas pela Magia.

Atentem que desde tempo muito antigos a magia sempre esteve presente na civilização humana. Magia não significa malefício. O Malefício é quando você traz o mal ou o prejuízo de outra pessoa. Na Inglaterra pre-inquisição, antes do século XV, a magia era uma pratica corrente e visava a saúde das pessoas e o seu bem. Nunca foi um crime. O crime residia no malefício causado a outras pessoas. As feiticeiras poderiam ser processadas e presas por causa do malefício causado pela sua magia.

No caso da religião Yorùbá temos a mesma coisa. Temos o processo visando o bem, mas, podemos ter pessoas que usam dos mesmos elementos e instrumentos para causar o mal a outros ou fazer atalhos na vida das pessoas que os pedem causando para isso problema para outros. Essa é a prática que é usada pelas pessoas que transformam em comércio a sua religião.


O malefício não é objetivo ou parte desta religião. Se ele ocorre é por desvio de ética de quem se propõe a fazê-lo e o desvio existe em quem faz e em quem pede, de forma igual. Os 2 são pessoas ruins.

A energia nuclear, por exemplo, pode ser usada para o bem, gerando perenemente energia para alimentar cidades, mas, também pode ser usado como elemento destrutivo. Assim foi com outros elementos como a pólvora, nitroglicerina, combustíveis, etc..

Um desvio negativo ocorre quando o crente ou sacerdote passam a ver isso como a única coisa que fazem dentro da religião. Sem dúvida a prática desta pessoas deverá, sim, ser considerada fetichista e animista. Sempre será assim quando a pessoa não se ligar aos elementos de mais alta ordem e ficarem apenas com só elementos menores.

Nesse caso podemos esquecer a pratica da religião e considerarmos que existe ali apenas a comum, corriqueira e baixa feitiçaria. As casas de Candomblé abrem suas portas para ajudar pessoas que não sejam membros no sentido de obterem dessa atividade uma fonte de renda e subsistência para suas atividades e membros. Mas o que ela deve oferecer é a ajuda, o bem, a saúde e a recuperação da esperança na vida.

Em princípio uma casa de orixá (Òrìṣà) deve se focar nos seus membros e no bem deles. Os membros devem sustentar a casa e mantê-la funcionando e a casa deve presar pelo bem dos seus membros. Em alguma escala e alguns casos a abertura da casa para não seguidores é necessária, mas, isso não deve ser a regra.

Nos dias de hoje as pessoas tem acesso a educação e formação e normalmente terão um emprego para mantê-las sem que a religião seja a sua única fonte de receita. Pessoas que se dizem Babalorixá e não tenham sido capazes de ter uma profissão para mantê-las e a casa que construíram devem ser vistas com muito cuidado, porque podem apenas ter uma fachada de religião para sustentar os seus feitiços.

No caso de Bàbáláwo é bem distinto. Eles não são do culto de orixá (Òrìṣà) e seu objetivo a atender às pessoas comuns.