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sexta-feira, maio 31, 2019

Novo vídeo no Canal do Youtube

O tema ainda é intolerância religiosa. Neste segundo vídeo é abordado a questão de nós mesmos gerando motivos para intolerância devido a pessoas que não são religiosas, dirigem casas comerciais para ganhar dinheiro com trabalhos e consultas e usam o tema de intolerância religiosa para se defenderem.

https://youtu.be/8dHIAPFWFsk




segunda-feira, maio 27, 2019

Novo vídeo no Canal

O tema é intolerância religiosa, com uma série de 5 vídeos, publicado a parte 1 - Multiplicidade Religiosa 

https://www.youtube.com/watch?v=ZNzjxJcYU5Q&t=861s

domingo, maio 26, 2019

O livro de Maupoil em português


Finalmente o famoso livro de Bernard Maupoil - A adivinhação na antiga costa dos escravos, foi publicado em português.

Está disponível em grossa e boa edição pela Edusp. Mais um grande trabalho de Carlos Eugênio Marcondes de Moura.

Eu tinha a edição antiga em francês, mas nunca li, de fato, francês não é para mim, mas ganhei e guardei. 

Esse livro lendário faz parte da história do Candomblé vou explicar isso em um texto que ainda não terminei. Para quem for ler atenção, ele não é sobre Ifá, ele é todo sobre Fá que é a variação de Ifá para o Dahomey.

O livro é voltado para Voduns e não Orixás, dessa maneira é um livro que vai interessar as pessoas que são do Candomblé de Jeje. não vejo ele utilidade para o Candomblé Ketu e as demais tradições afro-brasileiras que tem origem nos Yoruba.

Muitos podem agora estar perguntando que é esse Fá?

Fá é o Ifá no Dahomey.

Segundo Luis Nicolau Parés em seu livro A formação do Candomblé, p.274, 

"... a mãe do rei Tegbesy, Na Huanjile, é geralmente tida como responsável pela introdução por volta de 1470, do culto Mawi-Lissa em Abomey, transformando esse casal de voduns em divindades genitoras e supremas, colocando-as na cumeeira de um panteão cada vez mais vertical e hierarquizado. Ao mesmo tempo a introdução do sistemas de adivinhação Fa, controlado exclusivamente por homens e a promoção do culto Nesuhue dos ancestrais como culto nacional, com precedência sobre o culto do resto das divindades públicas, contribuíram para uma crescente estruturação piramidal do sistema religioso."

Este trecho é parte do capítulo "O panteão Jeje e suas transformações".

Eu recomendo muito a leitura desse livro. Se o Parés estiver errado, não tem o que fazer, mas, considerando, suas obras e o seu estudo como uma abordagem séria isso significa que:

- O estabelecimento do panteão Jeje hierarquizado tendo a figura de Mawa-Lissa foi tardia e feita pela rainha. Lendo o livro a gente aprende que essa hierarquização não fazia parte da tradição Jeje.

- A introdução de Ifá na forma de Fá foi feita tardiamente

- A introdução do culto de egungun através do Nesuhue também tardiamente e uma imposição da Rainha.

Pode não parecer nada mas isso significa que foi a estrutura da religião Yoruba que influenciou e reorganizou o panteão Jeje e não o contrário!

O livro do Parés tem outros exemplos, nesse mesmo capítulo, quando ele trata de Sakpata, Omolu e Nana Buruku. Os estudos deles mostram claramente que a religião Yoruba influenciou o seu entorno, com idas e voltas do mesmo Orixá, ás vezes com nome novo e não o contrário

A leitura da segunda parte do livro dele é muito boa, mesmo para quem não se interessa pela religião Jeje.

Tem pessoas aqui no Brasil que acham que foi o Jeje que exportou divindades, que ele seria mais antigo ou influente. Infelizmente para elas, não foi assim. 

O culto no abomey, o Jeje, era bem diferente antes e formado por famílias de Voduns (umas 3 famílias), independentes entre si, com quase nenhuma hierarquia. O conceito do Jeje era o de familia de divindades, com filiação entre os Voduns. Contudo esse nunca foi o conceito Yoruba para Orixá. 

A hierarquização do culto Jeje, como mostrado por Parés, foi configurada por decreto, fazendo um espelho da religião Yoruba.

Recomendo muito a leitura deste livro do Parés.

O livro do Mapouil é importante para entender um aspecto do nosso Candomblé, vou abordar isso no texto que estou fazendo sobre a história de Ifá no Brasil. 

Mas antecipando, a forma de Ifá que existe no candomblé, com um entendimento próprio de Odù, que é diferente do que os Cubanos e Africanos trouxeram, é devido as pessoas na década de 90 terem usado esse livro como base para estruturar isso.

Só que esse livro é sobre Fá, sobre Vodun. 

Isso explica como surgiu também essa grande mistura de vodun e Orixá. 

Mas basta abrir o livro na sua Parte II e você vai achar o Ifá que o Candomblé usa.

Eu queria ter mais tempo para poder explorar todos esse temas, mas, vamos nos virando com o que dá tempo.

















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Não deixe de ler o ultimo texto do blog que é um dos muito bom e aborda uma questão importante.

A religiosidade Yorùbá no Candomblé e Ifá

A religiosidade Yorùbá no Candomblé e Ifá
A questão das trocas entre o ọ̀run (órun) e o àiyé
Existe uma questão que sempre me perseguiu e talvez aconteça o mesmo com outras pessoas que estejam preocupadas com a religiosidade em si, aquela que deve estar presente nas pessoas que praticam uma religião.
Essa questão é a capacidade que deve ter o crente (aquela pessoa que diz professar aquela religião e que frequenta uma casa, igreja, templo) de qualquer religião em poder responder a uma pergunta muito simples, talvez a coisa mais elementar que é: O que ele faz dentro da religião? Qual a finalidade dele na religião? O que a religião traz para sua vida? Como a religião se incorpora na sua rotina diária? Qual o benefício de ter uma religião.
Parece um coisa muito simples de ser respondida por uma pessoa que se diz sacerdote, seguidor ou crente de uma religião, principalmente quando essa pessoa tem o objetivo de explicar isso para uma pessoa que não faça parte desta mesma religião. Não se trata de proselitismo. Um crente tem que ter a capacidade de motivar ou de explicar as suas motivações para um não crente, não com a intenção de convencer o outro a adotar a sua religião, mas, pelo menos, conseguir explicar os seus motivos nessa religião.
É claro que vou apresentar aqui a minha versão para isso e basicamente, é esta a questão de fundo que motiva tudo o que eu estou escrevendo. Contudo, antes disso, gostaria de explorar um pouco mais esse drama. Sim, o drama, no qual se transforma essa questão.
Eu penso que é muito normal a uma pessoa que está dentro de uma religião ter a capacidade de se expressar sobre os motivos que a levam a estar lá e que benefícios a religião traz à sua vida de uma maneira que, não só a pessoa pode explicar sua opção, como também, convencer outras desse caminho.
Não considero que essa seja uma questão culta, acadêmica ou teórica. Pelo contrário, acredito que estamos lidando com a questão mais simples que uma pessoa religiosa pode se confrontar.
A minha decepção é observar que isso é algo muito simples quando lidamos com evangélicos, católicos e muçulmanos, mas, quando estamos lidando com o Candomblé e com a Umbanda isso se torna, sem exagero, um transtorno mental. Deixando de lado a boa vontade e simpatia e se concentrando na argumentação em si, eu, até hoje, ouvi muito poucas, raríssimas, pessoas, que podiam se explicar sem caírem em lugares comuns, frases decoradas que não convenciam nem elas mesmas do que estavam fazendo.
Por exemplo, no caso do Candomblé qualquer resposta depois de alguns segundos de silêncio, uma expressão perplexa e aquele olhar profundo e perdido.... resulta em umas frases como: Eu amo meu orixá (òrìṣà) ou meu orixá (òrìṣà) é tudo para mim, O orixá (òrìṣà) é quem me dá caminho, etc... Nada de errado com essa manifestação de fé e carinho muito apropriadas a uma religião iniciática onde o orixá (òrìṣà) deve desempenhar um papel muito exemplar no imaginário do seguidor, mas, de forma nenhuma serviriam para explicar a alguém o motivo daquilo tudo ou convencer a sim mesmo do que está fazendo na religião.
No caso da Umbanda, o mais comum é a velha definição de que ela está ali para ter uma evolução espiritual, mas, prosseguindo com mais perguntas sobre o mesmo tema, não se consegue que a pessoa defina com clareza o que é esta evolução espiritual para ela.
Responder a primeira pergunta sobre um assunto exige um muito pouco de conhecimento e muitas vezes serve como resposta, até mesmo uma embromação, mas responder 3 ou 4 perguntas sucessivas sobre o mesmo assunto, aprofundando o tema, exige saber de fato o que se está falando. Assim, me transtorna um pouco ver tanta fé nas pessoas, se dedicando dias e noites a uma religião sem que se pudesse perceber se elas sabiam o que as mantêm ali.
Atenção, de novo, isso não pode ser um paradigma. Não podemos dizer que é complicado demais para as pessoas sem cultura ou formação, como as que eram e ainda são encontradas no Candomblé (isso tem mudado muito). Isso é apenas um estereótipo preconceituoso, e uma simplificação grosseira para justificar comportamentos inexplicáveis. Os evangélicos são uma população equivalente, em termos de classe social e educação (aliás muito piores porque para exercer uma religião daquelas só sendo muito idiota) e, estes, tem um domínio muito grande da sua religiosidade e também da sua teologia.
Vocês podem estar imaginando: e daí?
Qual a significância em se saber definir isso em palavras se o que importa é o que está no coração? Claro, essa é uma boa fuga para essa questão, mas, se fosse assim mesmo, só uma questão de se expressar oralmente, eu tenho certeza que a gente não veria tanta gente deixando o Candomblé e a Umbanda para se transformar em Evangélicos, deixando anos de dedicação para trás, sem significado nenhum e acreditando de fato que na Igreja conseguiu se encontrar com Deus, como já ouvi e li o relato de muitos. Sério, não estou exagerando. Não estava buscando definições acadêmicas ou formais, estava buscando apenas uma explicação que me convencesse de fato.
E mais, conversei com várias pessoas para entender como era a vida religiosa dela depois da sua iniciação ou mesmo para aquelas não iniciadas e que apenas frequentam um terreiro. Para meu espanto, fora a presença em obrigações aquilo era sempre um grande vazio interno sem explicações ou entendimentos. Aquela rotina de prática religiosa, se transformava em significado final da religião.
Vejam, estar presente em obrigações ou no seu terreiro fazendo tarefas domésticas não significa necessariamente que se está tendo uma vida religiosa. Existem muitos religiosos que vivem enclausurados em igrejas e conventos, mas, o trabalho doméstico é apenas uma necessidade em relação vida em comunidade, elas dedicam muito do seu tempo a religiosidade pessoal ou coletiva. A maior parte a rotina que envolve a presença em terreiros se traduz apenas em suporte às tarefas domésticas de uma casa compartilhada e não em prática religiosa.
Mas o que eu esperava obter?
Como já disse resposta simples, sinceras e querefletissem o envolvimento da alma daquela pessoa com a religião que ela adotou, que fosse uma coisa tão simples e natural e ao mesmo tempo calorosa que desse a quem ouvia a vontade de também participar daquela vida e crença religiosa. Que me permitisse compartilhar uma visão otimista da religião tornando as pessoas em seres humanos melhores.
Mas porque essa decepção?
A falta de orientação religiosa
Olha muitos motivos existem. O primeiro deles, sem dúvida, é a falta de formação e orientação religiosa dos ditos “sacerdotes” de Candomblé. De Umbanda então nem pensar. Eles abrem a boca para se auto nomearem sacerdotes de uma religião sem ao menos terem uma conduta consistente que justifique o emprego desses termos, seja o de sacerdote, seja o de religião.
Além disso, apesar de nossos inúmeros esforços em caracterizar de forma diferente, o Candomblé está hoje muito mais para uma religião de magia ou uma prática de magia do que uma religião. Como religião a sua prioridade são os ritos e liturgias e esse tema domina a formação e a preocupação das pessoas. Só o rito importa, só a forma e fazer melhor do que outro e saber mais ritos e segredos litúrgicos transforma aqueles pseudo-sacerdotes em pessoas melhores.
A qualificação de um sacerdote virou apenas o seu domínio por ritos e estes nem sempre podem ser totalmente associados a ritos religiosos. O dia a dia é dominado pela prática da magia para a obtenção de favores, para a correção de erros sem um questionamento do mérito de quem pede ou da moral do que é feito.
Tenham em mente que a prática do Candomblé envolve de fato as consultas ao oráculo, as liturgias posteriores a essa consulta e a realização de ritos e liturgias nos membros (obrigações) mas a vida em uma religião ou casa religiosa (terreiro) não pode ser resumir a isso. Antes de seguir vou explicar isso.
É um fundamento desta religião que a aliança que temos com deus, a nossa arca da aliança, é que deus nos ajuda e suporta em nossa vida. Antes de nascermos vamos a deus que pedimos para nascer de novo e explicamos qual será o nosso objetivo nessa vida. Olódùmarè, deus, nos concede a vida e nos dá instrumentos para vivermos e atingirmos nossos objetivos. Ele criou também os orixá (òrìṣà) para nos suportarem e serem o elemento de ligação com ele.
A aliança que temos com deus, Olódùmarè, é que vivemos para sermos felizes e que temos que ser pessoas boas, corretas e honradas, temos que ter um caráter exemplar e sermos úteis para a sociedade que vivemos.
Dessa forma a religião nos ensina e serve como esse elemento de reunião entre nós e os orixá (òrìṣà) e além disso existe um oráculo para que possamos nos comunicar com deus, com as divindades, com nosso anjo da guarda e ancestres para obter orientações e pedir ajuda. A existência de um oráculo e dos orixá (òrìṣà) deixa claro que nesta religião não existe essa visão de onisciência e onipresença de deus, como outras pregam.
Como parte da aliança de deus com a nossa vida feliz, o oráculo serve de instrumento para recebermos as bençãos de deus e ele indica que tipo de manipulações mágicas do supernatural devem ser feitas para podermos ter ajuda em nossos problemas. Essas manipulações das forças do supernatural são os ebós, trabalhos e liturgias que são feitos nos terreiros como consequência da consulta aos oráculos (búzios ou ifá).
Dessa maneira um terreiro é um lugar onde, como expliquei, podemos nos reunir com os orixá (òrìṣà) através dos Xirês, quando eles vem ao àiyé e podemos “vêlos” manifestados e ter contato com eles e receber suas bençãos (axé (aṣẹ́)). Também é onde podemos consultar o oráculo e fazer as manipulações mágicas do supernatural.
Um terreiro é deste forma um local com muito mais atividade religiosa do que um templo ou igreja e a razão disso está completamente fundamentada nos princípios da religião. O terreiro faz o que faz porque a religião assim o demanda.
Tenho que lembrar a todos que uma das coisas que torna essa religião tão mais atrativa é esse sentido que temos nela contato com o divino, nós interagimos com os Orixá (Òrìṣà). As divindades não são figuras remotas que vemos em imagens ricamente decoradas, o Candomblé não tem imagens para representar Orixá (Òrìṣà). Imagens não fazem parte do nosso relicário, se alguma casa coloca imagens é apenas porque quer, as imagens de Orixá (Òrìṣà) não fazem parte de uma casa. Eles são representados por seus símbolos uma vez que eles estão constantemente presentes no nosso meio.
As preces que fazemos não são falas que se perdem no silêncio sem nenhuma resposta. Nós nos comunicamos com o nosso divino e somos atendidos. Nós temos o oráculo e a presença de Orixá (Òrìṣà), que no candomblé de raiz yorùbá não fala mas gesticula.
Dessa maneira os terreiros são lugares simples, mas, sob o ponto de vista religioso são um ponto de encontro real e efetivo do crente com a sua religião e tem funções muitos maiores do que outros templos, tem uma utilidade prática muito maior e muitos mais atividades litúrgicas.
Explicado isso fica mais fácil de entender um dos objetivos de uma religião que é o de nos ensinar a usar o supernatural e nos conectar com o divino. O Candomblé e seus terreiros dão pleno significado a essa definição, fica bem evidente entender porque a religião é necessária e porque não basta apenas acreditar em deus. Você precisa de todo o conhecimento da religião para primeiro, entender a proposta de sentido de vida que ela te oferece, isto é, o entendimento que esta religião te oferece para entender o supernatural e o significado dele, em nossas vidas, e depois te conectar com o divino através do oráculo e dos Xirês e, por fim, executar os procedimentos de manipulação do supernatural.
Claro que a base para tudo isso é entender que existe um supernatural, um divino, acima de nós, que essas energias e divindades podem ser acessadas e manipuladas e que deus quer que sejamos felizes em nossas vidas.
Aqueles que não acreditam no supernatural e no divino são os ateus e, claro existem religiões que não se propõe ou não entendem que existem energias a serem manipuladas. Na verdade as religiões que dizem que você apenas deve rezar não estão totalmente erradas, de fato rezar é um importante elemento de conexão com o divino e com o supernatural, o hermetismo e a alquimia já falaram disso, mas, existem formas também mais efetivas do que apenas rezar.
Depois de toda esta explicação espero que tenha ficado claro que ter um oráculo e fazer os ebós é parte importante e fundamental de uma casa religiosa de Candomblé e que isso esta completamente alinhado com a base religiosa e tem como objetivo nos ajudar em nossa vida.
A tradição de atender pessoas comuns, que não fazem parte da casa, para o oráculo e ebós é comum, antiga e não é nenhum absurdo. A religião está aberta a todos, não existe motivo para um sacerdote deixar de atender que precisa porque Olódùmarè é deus para todos nós. O atendimento de consulentes sempre foi uma forma também de sustentar o terreiro. Dessa forma não existe nenhum tipo de restrição a isso.
Tem religiões que tem dízimo e recolhem contribuições no culto. O Candomblé não faz nada disso, mas, atende a pessoas com problemas na vida.
A execução das chamadas obrigações religiosas também faz parte da religião, são necessárias para a formação de sacerdotes. A pessoa para poder ser um intermediário entre os Orixá (Òrìṣà) e nós e fazer as manipulações energéticas do supernatural (ebós) tem que se preparar para isso.
Eu tenho um texto no blog que fala sobre essa questão de necessidade de obrigações e iniciações, de forma que, procure esse texto para saber minha opinião à respeito disso.
Dessa forma, fechando o assunto, ter um oráculo em funcionamento, fazer ebós e fazer obrigações são atividades importantes e necessárias de um terreiro de Candomblé.
A questão que trago aqui é que além disso um terreiro também é um lugar de formação religiosa, de transmissão de valores de formação humana. Tem que ser um lugar onde as pessoas vão também rezar e vão aprender o que a religião tem a oferecer para elas na sua formação do caráter ideal. É um lugar onde as pessoas tem que ir para conhecer qual é a proposta de visão transcendente para nossa vida na terra.
É nesse aspecto que os terreiros falham completamente. Eles se focam totalmente na primeira parte que descrevi, na prática da religião e deixam sem significado esta segunda parte que é o que as igrejas e templos se concentram porque não tem a primeira parte.
Um outro aspecto que deriva do foco apenas na primeira parte, da ação, é o desvio das funções de um terreiro e de seu dirigente da religião para se focar apenas nos ganhos é a ação sobre a espiritualidade.
Em Ifá o odù que nos traz ensinamento sobre isso é o odù IKA MEJI. O entendimento desse odù explica perfeitamente o que ocorre nos terreiros. Ika Meji é a inspiração religiosa, é a respiração profunda antes de rezar, é o acumular do axé (aṣẹ́), é quem lembra que a reza e palavra através dos oriki, versos de odù, provérbios, etc..) são o cavalo do oro o axé (aṣẹ́) não manifestado. Ika Meji fala do axé (aṣẹ́) latente do próprio ser que pode ser usado para crescer ou destruir.
Existem 2 signos filhos que representem bem esta situação, Ika Ogunda e Ogunda Ika. O primeiro representa esta essência de Ika meji, a de se concentrar na espiritualidade e religiosidade para acumular o axé (aṣẹ́), a ponto entre o ọ̀run (órun) e o àiyé, o equilíbrio, enquanto que ogunda ika é seu oposto quando a ação predomina a espiritualidade e se sente dificuldade em se conectar com o divino. Em ogunda ika a pessoa se perde em ações e se afasta do divino.
É o que ocorre em terreiros que apesar serem o ponto de contato com Orixá (Òrìṣà), se ocupa massivamente na atividade do oráculo, na execução de ebós, obrigações e no desvio disso, a prática mágica sem ética voltada para o enriquecimento pessoal.
Esse assunto, o da prática mágica aética ( na maior parte das vezes) e da ritualística é o que domina qualquer conversa envolvendo os praticantes e sacerdotes. Uma visita ao “dial” do rádio deixa isso bem claro. Encontramos programas católicos – poucos – evangélicos – muitos - e os de Candomblé. Enquanto nos primeiros existe uma preocupação com a pregação da palavra de Deus, do verbo, para os últimos é apenas uma hora de comércio e relacionamento.
Desta maneira a religião que existe e na qual se baseia o Candomblé se perde e é esquecida. Os conceitos religioso, a teologia e a teogonia ou mesmo a coisa mais simples, que é como eu iniciei qual o sentido para isso na vida das pessoas, o que esses sacerdotes pensam que estão trazendo para essas pessoas que os seguem, são apenas fragmentos, não ligados, que são ditos com brevidade, sempre, mais no sentido de mostrar que existe um fundamento maior por trás de tudo, a religião de fato, mas que ele nunca explica (não sabe o que falar), servindo apenas como uma isca ou como um elemento para despertar curiosidade e respeito. As pessoas entram na busca desse conhecimento que nunca vem, ai abandonam a religião, porque racionalmente reconhecem que esta religião tira delas mais do que dá.
A grande responsabilidade por isso é a própria formação dos referidos sacerdotes, voltada para o rito e o ganho pessoal através da prática da religião.
A preocupação por criar essa orientação religiosa, de fato, não existe e como a gente sempre diz, que só se pode dar aquilo que recebe, eles pouco ou nada tem a dar. Os que se incomodam com isso acabam usando os conhecimentos que adquiriram de outras religiões como o catolicismo ou o do Kardecismo para terem algum discurso religioso. Esse discurso passa então a ter nenhuma relação ou vinculo com sua própria religião. Além disso a prática mágica indiscriminada e sem ética e moral e que visa o seu ganho financeiro próprio acaba retirando dele todo o sentido de ética e moral que qualquer religião deve ter. Como essa pessoa vai pregar, ensinar ou cobrar algo de seus seguidores se a sua prática diária esta envolvida em fins que são completamente não éticos?
Mas muitos podem se levantar contra essas palavras e dizer que nem todos são assim, simples feiticeiros e que sua prática mágica e litúrgica tem sim uma base ética. OK, como em tudo existe exceção vamos aceitar que de existem esses grupos, mas, mesmo para esse grupo as afirmações principais se sustentam: a falta de orientação da base religiosa, a valorização da prática mágica e litúrgica.
A realidade do Candomblé é que apesar de ser uma tradição de uma religião de fato, de os seus ditos sacerdotes terem alguma noção disso e eles se autodenominarem sacerdotes e religiosos, a formação religiosa deles é nenhuma. Dessa maneira a sua capacidade de transmitir religiosidade para outros é igualmente nula. O que eles transmitem são ordens comuns, bom senso baseado em conveniência própria e conceitos religiosos que aprenderam de outras religiões basicamente a católica e espiritismo, que no fundo vira mais um sincretismo porque se junta com alguns conceitos que eles aprendem da religião africana.
No caso da Umbanda é um pouco distinto, porque a Umbanda é apenas uma prática ritual de fato, e a religião por trás disso pode ter muitas origens, sendo que a mais comum é o espiritismo que deriva do catolicismo. Como o espiritismo Kardecista é bastante doutrinado e codificado a tarefa dos seus sacerdotes é bem simplificada mas igualmente mal executada.
Mas deixemos de lado um pouco essa questão que é farta de assunto e exemplos, e na minha visão indefensável para voltarmos para o praticante individual.
A vida religiosa de um praticante é então dominada pela ritualística e submissão hierárquica com pouco ou nenhuma orientação religiosa. Sua dedicação é dominada pela participação em obrigações próprias, de outros ou coletivas onde o seu papel varia de nenhum a algum. Toda a iniciativa ritual em um terreiro é dominada por poucos, um ou dois na maior parte das vezes cabendo aos demais o papel de figuração ou coro.
A rotina religiosa é repleta de festejos que criam assim um direcionamento estético e vaidosa para a presença da pessoa uma vez que não tendo ela um papel ou não consumindo o seu tempo com reflexões religiosas essa pessoa passa a dedicar o sei tempo ao culto do seu Ego e da sua vaidade no que faz. A vaidade é o que domina o Candomblé hoje.
A troca de favores usando o Órun (ọ̀run) e o Àiyé
Chegamos, por fim, a talvez uma das questões mais primárias disso tudo que é o contínuo processo de troca entre o ọ̀run (órun) e o àiyé, que domina o dia a dia das pessoas.
Esclarecendo a todos o Órun (ọ̀run) é o espaço supernatural e o àiyé é o espaço natural. O Órun (ọ̀run) é o lugar onde habitam os espíritos e o àiyé é basicamente o mundo terreno. A troca significa que no àiyé as pessoas procuram através de liturgias e oferendas oferecer coisas esperando receber em troca disso favores dos espíritos do Órun (ọ̀run).
É como os católicos que fazem promessas para obter favores em troca de penitências (aqui uma relação de sofrimento, no qual o Órun (ọ̀run) católico exige que a pessoa sofra e se puna para atendê-la?) ou os neo-pentecostais com sua doutrina de teologia da prosperidade, na qual deus “em pessoa” vai atender a tudo o que eles pedem, inclusive as maldades que pedem colocando nomes e fotos das pessoas dentro da bíblia.
As trocas, então, não são uma exclusividade de nenhuma religião e sim na natureza humana.
No Candomblé, este mecanismo domina tanto, a visão da pessoa que se associa a uma casa, como também a forma como a sociedade vê as casas e isso é muito ruim. É no mínimo curiosa a a mentalidade que se constrói de que os espíritos e divindades no Órun (ọ̀run) estão ali, ávidos por receberem ebós e rapidamente, a troco de umas bolas de farinha ajudar as pessoas no àiyé.
Sem dúvida a visão do mundo de cada religião é distinta e isso direciona a forma como as pessoas vivem. Se você pega uma religião reencarnacionista e cármica como o budismo e kardecismo, por exemplo, que pregam que viver é um sofrimento e você nasce, na realidade, fazendo um “curso” de sofrimento para não mais renascer, esta pessoa vai pautar sua vida justamente seguindo esta sina, de “viver” essas dificuldades para que elas não apareçam mais e também sendo forçosamente caridosos para acumular pontos positivos nessa vida.
Eu acho que o budismo deve fazer um bom trabalho nas pessoas, buscando o melhor delas, apesar de eu não gostar da filosofia como um todo. Mas o Kardecismo não tem filosofia do budismo e se caracteriza pela orientação à caridade, na maior parte das vezes não sincera, como uma obrigação de vida. Contudo, o que eu quero dizer aqui, mais uma vez, e enfaticamente, é que a prática sincera de uma religião direciona a forma como as pessoas vivem e como encaram a sua existência.
A religião Yorùbá tem como característica dizer para as pessoas que elas nascem para ser felizes e elas devem viver felizes. Ela também reconhece que o mundo tem muitas dificuldades e coloca o divino, através de orixá (Òrìṣà) e outros espíritos disponíveis para ajudar as pessoas a vencer os obstáculos que as impedem se ser felizes.
Desta maneira o Candomblé tem esta veia assistencialista na sua estrutura. Mas o objetivo disso não é no que isto se transformou na prática. A religião quer as pessoas felizes e ela suporta isso através do equilíbrio e reposição de axé (aṣẹ́), que é a forma como a religião entende que você obtêm as condições para ter condições para resolver seus problemas. A religião entende que a pessoa deve ter energia, uma boa cabeça para tomar boas decisões, um bom caráter, ética e sorte na vida. Mas acima de tudo a religião diz que a pessoa deve ter boas pernas, porque sem boas pernas você não realiza nada.
A visão dela é muito direta, nós temos que resolver nossos problemas, o preguiçoso não vai ter nada na vida. Não adianta você se sentar e esperar que as coisas ocorram, se você quiser realizar alguma coisa faça algo por vocês. Se quiser ter dinheiro, trabalhe, se quiser comer, plante, se quiser resolver problemas e conflitos busque a solução. Não existe incentivo para a preguiça, para a leniência e para a pessoa resolver seus problemas com trocas e feitiços.
Existe uma frase muito boa que diz que seu orixá (Òrìṣà) não vai impedir que você chore suas lágrimas, mas, estará junto de você para enxugá-las. As trocas entre o Órun (ọ̀run) e o Àiyé existem, sempre com este sentido de dar a você as melhores condições para realizar, trabalhar, ter saúde, ter determinação e também para eliminar dificuldade ou negatividades que não lhe pertencem.
Se você passa anos plantando e regando um problema, você vai colher o seu problema. O que saiu da sua mão é seu, usufrua dele. Não adianta esperar ajuda divina para uma coisa que você mesmo criou para você. Mas, existem situações que não nos pertencem, existem problemas que não procuramos, existem negatividade que nos são direcionadas por outras pessoas por sentimentos que não fomos responsáveis diretos e nem por nossas ações.
Essas coisas, que não nos pertencem e que não cultivamos, são as coisas que são mais facilmente resolvidas pelo sistema de troca.
Mas, o ser humano é muito obtuso e muito focado em seus objetivos. A maior parte não está interessada em “viver” sua religiosidade. A vida do praticante do Candomblé é dominada pelo sentido de alia naquela casa ela estará próxima deste processo de troca contínua de bens e favores entre o ọ̀run (órun) e o àiyé com o objetivo de resolver todos os seus problemas materiais.
O supermercado religioso do Candomblé é a tônica principal da compreensão que se estabelece do que seja a religião dos orixá (Òrìṣà) e isso é tão forte que permeia o grupo dos frequentadores e mais, se alastra por toda a sociedade. As casas da religião são rotuladas como casas de trabalho, lugares onde se paga para resolver problemas e, na maioria delas sem muita ética envolvida.
Assim, baseado no fato de que a pessoa é dedicada ao seu orixá (òrìṣà), que vai no seu terreiro para varrer o chão e passar roupa, ela entende que é merecedora de favores do plano divino. Oferendas e ebós são os elementos de troca que buscam dar coisas para que a pessoa receba em troca favores, que vão resolver o seu problema, trazer benefícios e criar atalhos para a sua vida.
A questão do comportamento, do mérito como base para se poder alcançar algo na vida ficam sempre para segundo (ou nenhum) plano. Entende-se que o processo mágico das oferendas ou de obrigações é o mais do que necessário para se obter o que precisa. Entendesse que uma pessoa que faça seu orixá vai ter que receber em troca emprego, dinheiro e uma vida melhor. Se isso não foi alcançado é porque o sacerdote que procurou é ruim, seu santo foi mal feito, etc...
O mais incrível é a pessoa entrar para uma religião que ela imagina que as divindade que ela acha tão maravilhosa se vendem por um punhado de grãos para fazer qualquer coisa, ou mesmo, que ficam lá sem ter o que fazer a não ser facilitar a vida das pessoas aqui no àiyé.
O merecimento, ou a falta dele, é sempre lembrado como motivo para justificar o não benefício, geralmente por quem vendeu a liturgia para o favor ser atingido. Nessa hora a pessoa não obteve porque não merecia. Mas nunca lembrado quando o contrário ocorre, quando o benefício é atingido, nesse momento o mérito é de quem fez a liturgia. A medida do sucesso na obtenção de benefícios e prosperidade é a que justifica a permanência de alguém em uma casa. Se as coisas não vão bem elas se vão.
Afirmo que este é um desvio da religião. Ela não existe com essa finalidade e essas almas pobres que assim se situam estão completamente perdidas em relação ao o que é a religião. Não tenho dúvida que esta distorção de visão começou quando as pessoas começaram a comercializar o axé (aṣẹ́). O que deveria ser uma coisa restrita para as pessoas de uma casa passou a estar à venda para quem pudesse pagar.
O sacerdote usando os conhecimentos a que tem acesso se transformou apenas em um feiticeiro, um fazedor duvidoso de favores. Na vida real, como no cinema, toda força mágica tem 2 usos, o do bem e o do mal. A comercialização de ebós e feitiços é apenas um mau uso disso, é o uso do lado ruim.
Um religioso, um sacerdote é uma pessoa do bem. Ele não pode se prestar a anunciar serviços mágicos ao alcance de qualquer pessoa.
Na minha visão uma religião baseada em um sistema de trocas é o caminho certo para o seu fracasso. As pessoas que se envolvem com uma religião como o Candomblé não podem viver com essa perspectiva. Uma religião não pode se focar ou incentivar esse comportamento porque jamais as pessoas vão se encontrar ou entender o que estão fazendo lá.
Mais ainda, a falta de estrutura religiosa que permita a frequência e participação de pessoas não iniciadas em terreiros junto com a contínua pressão para que todos sejam iniciados é um problema crônico que mais afasta do que aproxima.
O Candomblé não será uma religião se não criar categorias para diversos níveis de envolvimento e iniciação. Quando os terreiros tiverem que conviver harmoniosamente com pessoas que não querem ou que jamais farão o seu orixá (Òrìṣà) eles conseguiram enfim achar um caminho religioso para sia existência. Hoje essa convivência é um estágio intermediário no qual a pessoa é continuamente empurrada ou incentivada a trocar de status de abian para iyawo.
A manutenção de terreiros através de clientelismo religioso é mais um outro mal. Esse processo de troca entre ọ̀run (órun) e aiyé deve acabar e isto ser um bem intrínseco da religião e não explícito. O aspecto da troca esta presente em todas as religiões em maior ou menor grau. Você dedica tempo, fé e recursos e espera do ọ̀run (órun), do sagrado, um retorno para a sua vida. Isso é natural, mas, algumas religiões moldarem isso com sabedoria, como a católica outras transformaram isso na sua bandeira como os evangélicos, mas que junto com a promessa de benefícios traz uma enorme dose de doutrina, dogma, moral e ética.
A perspectiva materialista
Na umbanda e Candomblé isso fica quase apenas na perspectiva materialista. O principal exemplo desse paradigma é a Umbanda. Como já expliquei aqui antes a Umbanda por si só não se caracteriza nenhuma religião. È um processo de possessão voltado em princípio para ajudar outras pessoas mas que deve se basear em alguma doutrina religiosa, qualquer uma porque a pratica da Umbanda exige mediunidade e não uma crença religiosa específica. Assim existem muitas umbandas, cada uma com uma combinação e entre comum apenas a incorporação com espíritos.
Os médiuns e principalmente os frequentadores se fixam sempre na solução de problemas da vida e materiais. A frequência é determinada por isso e todos os que ali estão querem resolver algo novo toda semana. “Macumba boa é aquela que funciona”. As respostas a pergunta chave geralmente se traduzem em algo do tipo que a pessoa está ali para elevação espiritual, mas essa resposta não sobrevive a uma segunda pergunta do tipo o que significa para ela essa elevação espiritual, como aquilo se traduzira na vida dela?
Esse problema não é exclusivamente do Candomblé. Esta muito presente também nos neo-pentecostais, contudo, apesar do muito excessos eles conseguem algum equilíbrio entre a realização espiritual e o sentimento de realização material. Tanto que as pessoa migram do Candomblé e Umbanda para eles.
Existe um tipo de pessoa e uma determinada faixa da população que coloca claramente essa questão material na frente da sua religião. Elas na realidade vão estar sempre buscando alguém que resolva os seus problemas e serão uma população migratória entre doutrinas e casas na busca de solução.
O circulo virtuoso
Eu poderia traduzir assim o círculo virtuoso. Uma pessoa que se dedica a essa religião deve encontrar base e orientação para através do contato com esse divino, através de exemplos e através de orientação, atingir um equilíbrio em sua vida na forma como a conduz e na forma como dedica o seu tempo para objetivos de realização. Equilíbrio é a principal palavra que traduz essa religião.
Uma pessoa religiosa é aquela que vive nesse mundo com a fé no divino. Uma fé forte e presente que a faz saber que sua vida existência esta sendo submetida e é controlada por uma força maior do que a dos homens, por uma lei maior do que a dos homens. Assim essa pessoa vive com a convicção de que não esta sozinha nesse mundo, o divino no ọ̀run (órun) esta sempre a zelar por ele. Uma pessoa de fé sabe que o mundo e as coisas são controladas pelo divino e não pela mesquinharia dos homens.
Essa pessoa vai se transformar em uma pessoa melhor para consigo mesma obtendo equilíbrio na forma como vive sua vida e se dedica a seus objetivos com ética e caráter. O seu orixá (òrìṣà) e ori vão buscar não somente ajudá-lo nesse equilíbrio como também ajudá-lo a enfrentar as diversidades de sua vida, amenizando problemas, e tornando-o transparente para seus inimigos. A própria conduta dessa pessoa, equilibrada consigo mesmo vai evitar que ela cria inimigos para sí.
O seu ori vai protegê-lo dos ajogun, os males que estão nesse mundo e que fogem ao nosso controle. A sua boa conduta vai permitir que oportunidades de abram em sua vida, que ele as veja e que consiga se aproveitar delas. Os caminhos dessa pessoa se abrem através do seu mérito como pessoa e através da proteção do divino para aquelas coisas que não forem plantadas por você mesmo.
Você como uma pessoa melhor vai ter condições de ajudar sua família e trazer também para ela esse equilíbrio. Mais pessoas assim serão beneficiadas por sua ação. O benefício para a família é um dos principais objetivos que uma pessoa deve ter em sua vida, seja por mantê-la unida seja por vê-la prosperar.
Uma vez atingido esse estágio você tera condições de ajudar a sociedade que o cerca, tendo assim conhecimento e experiência para transmitir para outras pessoas, ajudando a transformar e melhorar o mundo em que vive.
Uma pessoa religiosa deve ter uma prática diária dessa religiosidade. A oração é o elemento de ligação entre o aiyé e o ọ̀run (órun). As palavras empregadas e sua repetição é o que o fazem. Uma pessoa deve de Fé deve estar ligada ao ọ̀run (órun) e deve ter em sua vida a pratica da oração.
Além disso a pessoa que vive com Fé deve se lembrar desse divino ao longo do seu dia. Seja quando tem uma dificuldade seja quando algo de bom ocorre com ele porque o mesmo ouvido que serve para ouvir pedidos de proteção e ajuda também serve para ouvir agradecimento.
Uma pessoa de Fé deve ter uma prática religiosa diária e semanal para si que não dependa do sei terreiro para que ela busque através dessa ligação com o ọ̀run (órun) o equilíbrio e o Iwa pele que vão trazer tudo de bom para a sua vida.
Uma pessoa de Fé deve saber como se dirigir a seu orixá (òrìṣà) e Ori e como receber deles as mensagens que precisa para poder viver melhor o seu dia e vida.

quarta-feira, maio 01, 2019

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Tradições Religiosas


https://youtu.be/7OPzy2m7giw

A matriz religiosa afro-brasileira

A matriz religiosa afro-brasileira


Esse blog fala de Candomblé e Ifá mas existe um tema importante que é o que esta além do Candomblé no Brasil.
O candomblé, como já é extensivamente explicado em outro texto deste BLOG, é o culto de Orixá (òrìṣà) no Brasil. Ele é composto, na verdade não por uma unidade, mas sim por vários cultos distintos e estes tem raízes religiosas bem diferentes, isto é, cultos que representam matrizes religiosas originais distintas e por esta razão não deveriam ser nomeados juntos. Mas, aqui no Brasil, essa diversidade religiosa afro-brasileira recebeu o nome comum de “Candomblé”.
É importante estar atento para o fato de que nem tudo que faz parte da dita matriz religiosa afro-brasileira é Candomblé.
A matriz afro-brasileira é bem maior do que o Candomblé, que é apenas o mais conhecido em grandes centros do sudeste. Existem outros cultos afro-brasileiros como o Batuque, o Tambor da mina, o Xambá (creio que já extinto) e o Xangô (ou Nagô) que não ficam debaixo do mesmo guarda-chuva chamado de Candomblé.
O Candomblé, possivelmente a mais conhecida tradição afro-brasileira, deve ser entendida nas suas 2 tradições, A tradição jeje e a Tradição Yorùbá, com o Ketu, o Efon o Ijexá e outros. Dessa maneira temos 5 tradições religiosas afro-brasileiras, creio que existem mais ou existiram mais, a casa da mina é uma delas mas, não vou inserir aqui, vou manter como sendo as 5: Candomblé Jeje, candomblé Yoruba, Batuque, Xangô e Tambor da mina.
Cada uma delas tem origem na religião Yorùbá ou do Dahomey, uma religião africana e representa a especialização da religião no Brasil.
Minha lista pode estar incompleta mas também podem considerar cultos que não são afro-brasileiros como tais.
Eu já abordei com detalhes esta diversidade religiosa afro-brasileira em outro texto, como já citei, recomendo que este texto seja lido para que as pessoas que não tem intimidade ou conhecimento deste contexto religioso possam entender isso.
Eu, aqui no Blog, me foco na teologia religiosa do Candomblé Yoruba, esse é um Blog voltado para isso, para teologia e especificamente, dentro do Candomblé, para a teologia Yorùbá. Neste sentido o meu foco é a religião Yorùbá e não a religião do Dahomey, do grupo Jeje.
Vamos de novo, como eu já citei, Candomblé é uma denominação bem genérica para coisas que podem ser diferentes, parecem iguais, são todas afro-brasileira, mas, em termos de religião representam coisas distintas.
Eu, em meus textos, quando falo de Candomblé me refiro sempre ao conjunto de cultos ligados a religião Yorùbá (culto de orixá (òrìṣà) e Ifá). É muito comum eu trazer aqui visões novas para temas que já são conhecidos por pessoas do Candomblé, muitas pessoas, por pertencerem ao Candomblé, já tem um conhecimento ou mesmo nada sabem do que eu trato, isso é natural.
O que as pessoas do Candomblé tem que compreender é que se a casa a que elas pertencem esta ligada a raiz religiosa Yorùbá, como as casas de Ketu, Efon, Ijexá, por exemplo, então, o que eu estou falando é algo que elas devem prestar atenção.
Se elas pertencem a raiz religiosa Jeje então nada aqui se aplica a eles, podem ler como curiosidade, mas não é a religião deles.
O meu contexto religioso para o Candomblé, contempla 2 grupos religiosos bem distintos e fortes, o grupo Yorùbá e o grupo Jeje. O outro grupo, muito citado por ai, é uma mistura de coisas desses 2 com coisas de bantu e desconheço qualquer referência que legitime eles como uma tradição religiosa bantu, são apenas uma colagem, essa é minha visão após anos de convivência.
Esta é a razão de eu ter que mencionar essa diversidade. Como a palavra Candomblé designa coisas diferentes, muitas pessoas podem não entender ou saber disso e podem também estar ligados a cultos que não tenham ligação com a religião Yorùbá.
Assim, aqui o tema é a religião do grupo Yorùbá, mas atenção, como já disse isso não define a matriz afro-brasileira que é bem maior. Nosso país é muito grande mesmo.
Não posso deixar de mencionar a Umbanda como um destaque, visto que sua popularidade a torna referência para muitas pessoas que conhecem a Umbanda e não conhecem o Candomblé.
A Umbanda é uma religião brasileira, ela não faz parte do contexto afro-brasileiro. Essa não é apenas uma afirmação minha é a história da Umbanda que mostra isso e qualquer pessoa que conheça o assunto sabe disso.
A Umbanda é altamente sincrética e com o passar de muitos anos ela absorveu alguns cultos afros que acabaram desaparecendo. Todo o grupo Bantu que promovia a Quimbanda ou a Macumba acabou, sua prática foi superada pela Umbanda.
Esse grupo Bantu, de origem africana, não fazia parte da matriz religiosa Yoruba-jeje, era um grupo distinto, de prática religiosa bem pobre e objetiva voltada para a troca de favores e mercantilização desta atividade eram os feiticeiros. Uma parte se travestiu de culto de Orixá (Òrìṣà) e virou o Omolokô. Outro, a maioria se transformou em casas de Umbanda, assim se autodeclarando.
Foi esse grupo que ao ser duramente digerido pela Umbanda trouxe a africanização do formato da Umbanda e essa africanização estética faz as pessoas pensarem que a Umbanda seja parte do contexto afro-brasileiro. Não é, mesmo tendo incorporado alguns elementos africanos, como os tambores, a Umbanda é um culto e religião distinta e brasileira.

A Composição do Candomblé

A Composição do Candomblé


A composição do candomblé


De forma simplificada podemos dizer que o Candomblé é uma tradição religiosa que representa a religião Yoruba no Brasil. Ela não é a única, existem outras tradições desta mesma religião. Além disso esta colocação inicial sobre o candomblé já não é muito precisa, como vocês verão mais adiante, contudo, preciso iniciar esta explicação com algumas simplificações para que o assunto possa ser entendido.

O candomblé é muito mais do que uma tradição religiosa.

Contudo para poder entender o que ele é de fato, é necessário falar um pouco mais dele. É importante que seja entendido que é impossível falar de candomblé como se fosse uma coisa única. Esse nome, candomblé, abrange várias correntes e divisões.

Candomblé é o nome que recebe um amplo conjunto de tradições religiosas e cultos que se desenvolveram no Brasil a partir da Bahia e foi trazido pelos povos, de algumas etnias africanas, que vieram para o Brasil durante o que foi chamado de a diáspora negra, povos estes originários da África ocidental. Este grande e diversificado conjunto cultural se agrupa, de fato, não em torno de uma única religião base, mas sim de 2 religiões, a do, grupo Yoruba, que eu já citei e a do grupo jeje do Dahomey. O candomblé é então formado até hoje por 2 religiões distintas e não somente uma, em função disto não é possivel tratar o candomblé como um todo, apenas em partes.

Pausa para respirar....

Chamo muito atenção para este primeiro aspecto de que, dentro do candomblé, termos DUAS religiões diferentes sendo representadas.

Nova pausa para que reflitam sobre este parágrafo...

Aqueles que não acharam essa informação importante devem repensar a sua relação com a religião. Religiões distintas implicam em um divino distinto, uma relação diferente entre as pessoas e o divino, finalidades diferentes para a existência das divindades, uma visão metafísica da vida diferente, um sentido distinto para a existencia humana e valores e ética diferentes.

Compliquei um pouco, sem dúvida mas aceitem que ninguém pode ter 2 religiões. A pessoa não pode ser catolico e budista ou induista e muçulmano ou messianico e evangélico. Religião implica em filosofias diferentes, não apenas em acreditar em deus. Esse conceito pode ser um pouco dificil para os cristãos que são uma religião majoritaria no ocidente e que tem 3 religiões muito parecidas disputando as pessoas entre si, que sao o judaismo, islamismo e cristianismo. Para eles é tudo muito igua mas quando saimos deste contexto de religioes irmãs e vamos para um contexto pluri-religioso de fato, não se pode dividir.

Veja então a dificuldade em tratarmos do candomblé que é citado como se fosse uma coisa só e que na verdade é composto de 2 religiões diferentes.

Meus textos sempre cobrem apenas uma dessas religiões, a religião Yoruba e 2 cultos desta religião. Isso é apenas uma parte do candomblé.

O contexto afro-brasileiro, por sua vez, é ainda mais amplo. O candomblé com toda a sua complexidade é apenas uma parte deste contexto, existem outras tradições que as pessoas podem, até, estar achando que é candomblé. Mas eu vou abordar isso em um próximo texto.

A religião Yoruba, que é uma das religiões que existem dentro do candomblé, se manifesta através de cultos distintos. O principal, mais importante e mais conhecido culto é o de Orixá. Existe ainda o culto de Egungun e o culto de Ifá. Os cultos são subdivisões da religião com especialização litúrgica, cada um desses citados se dedicam a divindades diferentes ou melhor entendendo a objetivos teológicos diferentes.

As casas se identificam exclusivamente com uma religião e um tipo de culto, e este tem formato, liturgias e ritos diferenciados. Não existe possibilidade de uma casa se dedicar a mais de um culto ou raiz religiosa, quando essa regra é quebrada isto representa um erro e tenham atenção porque existem muitos mas muitos erros mesmo. Este texto não fala dos erros, fala do que é o certo, contudo, cuidado ao lidar com o dia a dia das pessoas e casas. Fala-se muita besteira e cometem-se muitos erros.

O culto de Orixá lida com os Orixás, o de Egungun com os ancestres falecidos e o de ifá se dedica apenas ao oráculo da religião.

Não se pode referenciar ao Candomblé como “um” candomblé. Quando alguém fala de candomblé, a primeira coisa que se deve entender é de “qual” candomblé se está falando.

Antigamente, esta diversidade levava as pessoas ao chamarem de candomblé de nações, porque haviam várias nações que eram representadas dentro dele. O conceito de nação é flexível e pode qualificar tanto o grupo religioso principal, como Yoruba e jeje, como também etnias que estabeleceram variações litúrgicas e ainda, reagrupamentos locais que também estabeleceram variações litúrgicas.

A tradição religiosa de candomblé é nomeada no singular apenas por razões históricas, de fato o termo unificado “Candomblé”, cuja origem etimológica não é conhecida, é somente uma simplificação muito grande e que leva as pessoas a suporem uma unidade religiosa que não existe.

O conjunto religioso formado pelo candomblé é de fato difícil para os brasileiros entenderem, mesmo para os seguidores, porque cada seguidor pertence a um microcosmo e não necessariamente conhece o todo, comumente conhece onde ele próprio está e alguma parte adicional.

No contexto brasileiro, além do candomblé, temos a umbanda, o espiritismo, o catimbó, o toré, o batuque, o xango, o tambor da mina e a casa da mina. Posso, ainda, estar esquecendo de alguém, visto o tamanho de nossa diversidade....

O espiritismo é de origem francesa e nada tem a ver com a África. A Umbanda, o Catimbó e o toré são brasileiros e nada tem a ver, também com a África. O Batuque no Sul e o Xango no Nordeste são tradições religiosas com origem Yoruba. O Tambor da mina e a casa da mina, no Norte são de Origem do Dahomey

Estas tradições, apesar de serem totalmente diferentes, aos olhos do leigo eles podem parecer que são todos uma coisa só ou que tem uma origem única ou mesmo que sejam Candomblé. Não são.

A verdade como eu mostro é que não tem nada em comum. O leigo certamente olha para esse conjunto, não o entende e chama isso tudo de afro-brasileiro ou de matriz africana, sem saber que, como eu disse, a África é um continente não um país e que neste conjunto encontramos ainda cultos brasileiros e ameríndios. Buscar semelhanças entre eles é insano e idiota.

As pessoas sempre buscam simplificação para superarem a sua preguiça ou ignorância, assim, em vez de entenderem a nossa riqueza cultural e religiosa fazem o pior, inventam algo que não existe usando explicações idiotas. Isso aumenta a confusão. Como um amigo falou, é muito fácil escrever sobre candomblé, você inventa o que quer e tem um monte de gente que ainda acredita. A mídia escrita e televisiva que é formada de 3% de jornalistas que tem neurônios, apenas torna isso pior chamando tudo que não é cristão de afro-brasileiro. Como já repeti inúmeras vezes o catolicismo é afro-brasileiro.

Eu imagino que os cubanos que estão vindo para o Brasil trazer o seu ifá e a reboque o lukumi que é a tradição de orixá deles, tem aumentado a confusão porque inserem um novo elemento neste “caldo”. Primeiro devemos lembrar que eles devem ter uma absurda dificuldade de entender o candomblé. A tradição deles, o lukumi, é unificado e tem inclusive uma regra de formato, todos fazem igual, ou com pequenas variações, afinal cuba é apenas uma pequena ilha. O candomblé é muito maior, rico, complexo e diversificado. Eles podem chegar aqui tentando traçar semelhanças entre o lukumi e o candomblé, mas falham, largamente, em entender uma coisa que está muito além do que eles podem entender.

O lukumi pode ser comparado, no máximo a um pequeno pedaço do candomblé, uma nação, como o Omolokô ou ao Angola que mistura religião Yoruba com Bantu, ou como a gente diz, candomblé com umbanda. O lukumi é uma mistura muito grande da origem yoruba com o bantu e o catolicismo. Não da para comparar com o candomblé. O que eles fazem é o mesmo que as pessoas de umbanda fazem ao tentar explicar ou entender o candomblé em função do que eles conhecem. Nem os umbandistas entendem o candomblé nem os cubanos, e ambos acham que sabem tudo e de fato nada sabem de nada.

Além da questão das nações, que criou inicialmente diversidade, o candomblé foi responsável por um processo de profundo de transformação da própria religião Yoruba, processo este que está sendo absorvido pela própria tradição africana. Na terra Yoruba, a religião e os cultos eram regionalizados e muito mais especializados, sendo agrupados em aldeias, cidades e famílias. Além disso as próprias divindades eram elementos de agregação. Enquanto no Brasil nós tivemos uma especialização em 3 cultos, na terra Yoruba, o culto era segmentado por divindade.

No Brasil, a estrutura Yoruba original era impossível de ser refletida. O modelo família, clã, aldeia e região era inviável devido a situação de escravos que as pessoas viviam aqui. O candomblé criou a figura do terreiro como ponto de união e substituição disso tudo, incluindo uma unificação litúrgica uma vez que um terreiro inclui, aqui, o culto a todos os orixás. O terreiro substituiu a família, o clã, a aldeia e o templo. A figura do terreiro reconstitui na tradição religiosa da Diáspora os elementos perdidos da sociedade Yoruba e sua constituição, no formato que tomou, foi um pilar importante na religião, mantendo melhor os vínculos teológicos originais do candomblé com a religião Yoruba.

Os lukumi de cuba, não tem o elemento terreiro ou mesmo egbe e isso explica bastante o distanciamento deles e a atitude agressiva que alguns grupos cubanos e de pessoas iniciadas por cubanos, tem tomados em relação a tradição Yoruba. A única explicação que eu encontro para a forma agressiva como cubanos de lukumi ou ifá se dirigem aos nigerianos ou seguidores da tradição Yoruba é, ou a necessidade de se justificarem no mercado religioso (de jogos, ebós e iniciações) ou um problema de autoestima por eles se acharem menores ou diferentes. Reconheço que não sei a causa, apenas posso imaginar.

Lamento os comentários que alguns podem não gostar. Não pretendo comentar sobre o Lukumi, Cuba é uma ilha pouco mais que o estado do Rio de Janeiro e com uma população equivalente. É impossível a gente querer comparar a riqueza cultural que temo no Brasil com uma ilha e população tão pequena.

Voltando ao candomblé, os 2 principais grupos religiosos presentes no candomblé são o Yoruba e o Jeje, cada um deles representa uma base religiosa distinta. Elas possuem similaridades, algumas ligações ou coisas em comum mas não são a mesma religião.

As diversas nações formam subdivisões do candomblé e pertencentes a uma dessas 2 religiões. Algumas pessoas podem estar notando, e estranhando, que não menciono o Angola no mesmo nível que o Yoruba ou jeje. Ele não está neste nível. O angola é uma nação de Candomblé, como as demais que serão citadas. O angola deveria pertencer ao grupo bantu e este grupo não tem uma base religiosa equivalente aos Yoruba ou Jeje. Eles são similares a umbanda, onde deveriam estar. O que ocorreu foi que, pessoas da bantu copiaram o modelo Yoruba, fizeram adaptações linguísticas e inventaram uma nação para eles, mais especificamente uma nação para uma religião que na áfrica nunca tiveram. Isso não os desmerece como uma tradição religiosa Yoruba. Mas eles são um grupo étnico que adotou a religião Yoruba e criou uma tradição própria para a etnia deles.

A religião Yoruba e o Candomblé

A religião Yoruba e o Candomblé

O modelo religioso do Candomblé

(Texto integral)


Uma das coisas que mais me preocupa e por isso direciona minhas ações, é a questão do entendimento das pessoas sobre o sentido e utilidade da religião na vida delas.

Sou uma pessoa que tem fé em deus, no meu caso, o vejo como Olodumare. Sou uma pessoa em paz com as religiões, não as vejo como um mal e não reservo a nenhuma delas, ou melhor a umas poucas, um tratamento pejorativo.

Não faço proselitismo de minha religião ou de qualquer outra, mas me dedico a manifestar minha fé no caminho religioso como um meio para termos uma sociedade melhor. Neste sentido busco resgatar na consciência das pessoas o sentido da religião na vida delas. Mais do que ter fé as pessoas também precisam entender qual o sentido prático de serem religiosas e de praticarem uma religião.

No caso do candomblé isso ganha uma dimensão ampliada porque a tarefa é dobrada. É necessário primeiro explicar a religião para as pessoas para, depois disso, falar sobre o sentido da religião na vida delas. Parece exagero? Não é.

Pensando bem o problema é triplicado, porque o candomblé tem um aspecto devocional muito grande e assim a gente tem que também desconstruir alguns dogmas e conceitos existentes.

Quando tratamos das religiões mais conhecidas e universais, falar sobre o sentido da religião na vida das pessoas é mais fácil, porque existe muita informação e fontes sobre a religião, assim você não tem que explicar a religião em si, basta discutir diretamente o assunto, o que faz tudo ser mais fácil. No caso do candomblé iniciar o assunto é muito mais difícil, como vou demonstrar a seguir.

O meu objetivo aqui neste texto é bem simples: Definir com poucas palavras a religião Yoruba para que as pessoas que não a conhecem possam entender.

Mas não é apenas isso, é principalmente definir a religião para que as próprias pessoas desta religião possam falar sobre ela e explicar para outras pessoas a sua própria religião. Parece estranho? Mas não é...

Mesmo para as religiões conhecidas não é fácil para uma pessoa defini-la, do zero, usando uma explicação simples. O que facilita a conversa sobre os temas religiosos é o fato que todo mundo já as conhece, aí as pessoas apenas falam de uma coisa ou outra, não sobre o geral.

No caso do candomblé é lamentável ver que pessoas quando questionadas sobre como é sua religião elas saiam com a clássica frase "... eu amo meu orixá .... " e com aquela expressão de desespero, do tipo “não me pergunte mais nada”.

Não estou sendo pretensioso ou arrogante. Estou explicando minha motivação para escrever. Esta é a realidade. Eu não faço parte do problema, faço parte da solução. Gastei muitos anos de estudo e prática para poder escreve sobre isso.

Este texto terá uma estrutura orientada para a facilidade e objetividade. O quanto você mais ler, mais entenderá, mas as definições serão feitas em ciclos. Cada ciclo detalha mais o anterior mas cada ciclo é completo e autônomo. Assim você poderá com poucas palavras definir a religião e com mais palavras explicar mais, tornar a definição melhor. Será que útil para uma conversa de 5 minutos em um cafezinho ou de meia hora. Mas qualquer pessoa deve ser capaz de definir sua religião com uma frase ou com uma cátedra.

Eu estudei muito, de muitas fontes para poder reduzir a complexidade a expressão mais simples possível. Não tenho dúvida de que muitos podem não gostar do meu ponto de vista, ou discordar. Não estou preocupado com isso, cabe a quem discorda se colocar, eu posso sustentar tudo o que penso.

O objetivo é tudo ser fácil, extremamente fácil para que você e qualquer um possa explicar junto.

Não será um texto único, mas um conjunto de textos, fáceis de serem lidos e entendidos. Existem também textos complementares, com mais informações para aqueles que se interessam. Quanto mais você ler, mais vai entender.

Tenho certeza que muitos não vão concordar com minhas opiniões. Mas não escrevo para essas pessoas, escrevo para aquelas que querem sinceramente entender alguma coisa. Não faço parte do grupo das pessoas que se beneficiam da confusão.

Quem tem outra opinião, é muito fácil, escreva um BLOG. Quem gostar do texto, faça referência a este BLOG.

Informo que o texto está todo completo. O motivo de publicar em parte é para facilitar a leitura, não deixe de acompanhar nos próximos dias o BLOG para ver as partes complementares.

1. explicação objetiva: entendendo as tradições religiosas


Antes de iniciar o texto proposto eu tenho que abordar a questão das tradições religiosas. É muito necessário entender isso.

O candomblé é uma tradição religiosa que pertence a uma religião que tem origem na África, em uma parte da Nigéria, que é composta pelo chamado povo Yoruba. Esta é uma definição simples que pode ser usada por todos de forma geral, mas, saibam que ela é imprecisa por motivos que não posso explicar agora.

Uma tradição religiosa é uma expressão usada para definir um grupo religioso que se origina a partir de uma religião base. Uma tradição religiosa é uma especialização da religião, uma adaptação da religião base a uma mudança temporal, geográfica ou cultural. A tradição descende da religião base mas ela é uma evolução mas principalmente ela é uma especialização.

No caso do candomblé, como tradição religiosa, ele teve sua origem na chamada Diáspora negra, que trouxe negros da África para o novo mundo. Nem todos os lugares que receberam negros no novo mundo desenvolveram tradições religiosas.

O candomblé representa, assim, a adaptação da religião Yoruba para o Brasil e se diferencia da religião Yoruba na medida que regionaliza o culto de orixá para o Brasil nos aspectos geográficos, fauna e flora e também na cultura, etnia e história do povo.

Acredito (mas não posso afirmar) que o grupo étnico Yoruba foi o único que desenvolveu no novo mundo as tradições religiosas (foram várias). Isso se deu porque este povo tinha uma religião original forte, consistente e bem estabelecida, ou seja, uma religião de fato. Além disso a própria cultura social do povo se impôs nos lugares que receberam os Yorubas.

A religião Yoruba é então a base desse movimento de formação de tradições religiosas. Ela é uma religião original, não está ligada ou descende de qualquer outra religião. Ela tem teogonia própria, teologia própria, teodiceia própria e uma gênese própria. É uma religião autônoma com conceitos originais e diferenciados. Ela não tem um criador, ela nasceu com o povo Yoruba. Enfim, ela é uma matriz religiosa original, contudo, ligada ao povo Yoruba.

A tradição é assim, como expliquei, uma evolução da religião, adaptando-a à história, sociedade e cultura do povo que a adotou. Uma tradição é formada pela evolução da religião, uma adaptação dela a sociedade, não é uma invenção humana.

Existem outras tradições religiosas na religião Yoruba em função da Diáspora negra. O candomblé é uma tradição muito popular no Brasil, mas existem outras. Em cuba surgiu o lukumi e no Haiti o voo doo. Na Nigéria existe uma tradição chamada RTY – religião tradicional Yoruba (ou em inglês YTR) que é a expressão da religião para o povo Nigeriano.

Cada tradição religiosa representa a melhor expressão da religião Yoruba para um povo porque ela é formada pela junção da religião original com a cultura do povo onde se estabelece, com a sociedade, seus valores e sua história. Uma tradição é uma expressão religiosa muito mais rica do que quando pessoas de um lugar adotam uma tradição externa.

Por exemplo, brasileiros que adotam a tradição lukumi cubana, sempre vão ter feito uma escolha pior, bem burra, em vez de adotar a tradição do candomblé. Americanos que adotam o lukumi ou RTY porque não tem tradição própria sempre estarão em uma situação desconfortável porque seguirão uma tradição religiosa que não é condizente com a sua sociedade, serão valores muito diferentes, transcendendo a fé religiosa em si. Eles terão mais dificuldade em se adaptar.

Tudo isso em poucas linhas:

Resumindo, é importante considerar que existe uma religião matriz principal, do povo Yoruba, que é original, completa, autônoma e independente de outras do mundo. Esta religião originou tradições religiosas, desta mesma religião, no novo mundo. O candomblé é uma dessas tradições. Ela localiza uma prática da religião original ao Brasil e apesar de algumas variações resultantes do processo de formação da tradição religiosa, ela mantém o vínculo teológico integral com a religião Yoruba.

Para entender melhor todo este conjunto, leia o texto complementar “Entendendo a diversidade religiosa”.


2. A composição do candomblé


Lamento pelos textos introdutórios extensos, mas, como disse no primeiro texto, falar de Candomblé dá mais trabalho, é necessário primeiro desconstruir alguns conceitos ou explicar outros. Assim não dá para falar de religião de Orixá no Brasil sem antes explicar o que é o Candomblé.

De forma simplificada podemos dizer que o Candomblé é uma tradição religiosa que representa a religião Yoruba no Brasil. Ela não é a única, existem outras tradições desta mesma religião. Além disso esta colocação inicial sobre o candomblé já não é muito precisa, como vocês verão mais adiante, contudo, preciso iniciar esta explicação com algumas simplificações para que o assunto possa ser entendido.

O candomblé é muito mais do que uma tradição religiosa.

Contudo para poder entender o que ele é de fato, é necessário falar um pouco mais dele. É importante que seja entendido que é impossível falar de candomblé como se fosse uma coisa única. Esse nome, candomblé, abrange várias correntes e divisões.

Candomblé é o nome que recebe um amplo conjunto de tradições religiosas e cultos que se desenvolveram no Brasil a partir da Bahia e foi trazido pelos povos, de algumas etnias africanas, que vieram para o Brasil durante o que foi chamado de a diáspora negra, povos estes originários da África ocidental. Este grande e diversificado conjunto cultural se agrupa, de fato, não em torno de uma única religião base, mas sim de 2 religiões, a do, grupo Yoruba, que eu já citei e a do grupo jeje do Dahomey. O candomblé é então formado até hoje por 2 religiões distintas e não somente uma, em função disto não é possivel tratar o candomblé como um todo, apenas em partes.

Pausa para respirar....

Chamo muito atenção para este primeiro aspecto de que, dentro do candomblé, termos DUAS religiões diferentes sendo representadas.

Nova pausa para que reflitam sobre este parágrafo...

Aqueles que não acharam essa informação importante devem repensar a sua relação com a religião. Religiões distintas implicam em um divino distinto, uma relação diferente entre as pessoas e o divino, finalidades diferentes para a existência das divindades, uma visão metafísica da vida diferente, um sentido distinto para a existencia humana e valores e ética diferentes.

Compliquei um pouco, sem dúvida mas aceitem que ninguém pode ter 2 religiões. A pessoa não pode ser catolico e budista ou induista e muçulmano ou messianico e evangélico. Religião implica em filosofias diferentes, não apenas em acreditar em deus. Esse conceito pode ser um pouco dificil para os cristãos que são uma religião majoritaria no ocidente e que tem 3 religiões muito parecidas disputando as pessoas entre si, que sao o judaismo, islamismo e cristianismo. Para eles é tudo muito igua mas quando saimos deste contexto de religioes irmãs e vamos para um contexto pluri-religioso de fato, não se pode dividir.

Veja então a dificuldade em tratarmos do candomblé que é citado como se fosse uma coisa só e que na verdade é composto de 2 religiões diferentes.

Meus textos sempre cobrem apenas uma dessas religiões, a religião Yoruba e 2 cultos desta religião. Isso é apenas uma parte do candomblé.

O contexto afro-brasileiro, por sua vez, é ainda mais amplo. O candomblé com toda a sua complexidade é apenas uma parte deste contexto, existem outras tradições que as pessoas podem, até, estar achando que é candomblé. Mas eu vou abordar isso em um próximo texto.

A religião Yoruba, que é uma das religiões que existem dentro do candomblé, se manifesta através de cultos distintos. O principal, mais importante e mais conhecido culto é o de Orixá. Existe ainda o culto de Egungun e o culto de Ifá. Os cultos são subdivisões da religião com especialização litúrgica, cada um desses citados se dedicam a divindades diferentes ou melhor entendendo a objetivos teológicos diferentes.

As casas se identificam exclusivamente com uma religião e um tipo de culto, e este tem formato, liturgias e ritos diferenciados. Não existe possibilidade de uma casa se dedicar a mais de um culto ou raiz religiosa, quando essa regra é quebrada isto representa um erro e tenham atenção porque existem muitos mas muitos erros mesmo. Este texto não fala dos erros, fala do que é o certo, contudo, cuidado ao lidar com o dia a dia das pessoas e casas. Fala-se muita besteira e cometem-se muitos erros.

O culto de Orixá lida com os Orixás, o de Egungun com os ancestres falecidos e o de ifá se dedica apenas ao oráculo da religião.

Não se pode referenciar ao Candomblé como “um” candomblé. Quando alguém fala de candomblé, a primeira coisa que se deve entender é de “qual” candomblé se está falando.

Antigamente, esta diversidade levava as pessoas ao chamarem de candomblé de nações, porque haviam várias nações que eram representadas dentro dele. O conceito de nação é flexível e pode qualificar tanto o grupo religioso principal, como Yoruba e jeje, como também etnias que estabeleceram variações litúrgicas e ainda, reagrupamentos locais que também estabeleceram variações litúrgicas.

A tradição religiosa de candomblé é nomeada no singular apenas por razões históricas, de fato o termo unificado “Candomblé”, cuja origem etimológica não é conhecida, é somente uma simplificação muito grande e que leva as pessoas a suporem uma unidade religiosa que não existe.

O conjunto religioso formado pelo candomblé é de fato difícil para os brasileiros entenderem, mesmo para os seguidores, porque cada seguidor pertence a um microcosmo e não necessariamente conhece o todo, comumente conhece onde ele próprio está e alguma parte adicional.

No contexto brasileiro, além do candomblé, temos a umbanda, o espiritismo, o catimbó, o toré, o batuque, o xango, o tambor da mina e a casa da mina. Posso, ainda, estar esquecendo de alguém, visto o tamanho de nossa diversidade....

O espiritismo é de origem francesa e nada tem a ver com a África. A Umbanda, o Catimbó e o toré são brasileiros e nada tem a ver, também com a África. O Batuque no Sul e o Xango no Nordeste são tradições religiosas com origem Yoruba. O Tambor da mina e a casa da mina, no Norte são de Origem do Dahomey

Estas tradições, apesar de serem totalmente diferentes, aos olhos do leigo eles podem parecer que são todos uma coisa só ou que tem uma origem única ou mesmo que sejam Candomblé. Não são.

A verdade como eu mostro é que não tem nada em comum. O leigo certamente olha para esse conjunto, não o entende e chama isso tudo de afro-brasileiro ou de matriz africana, sem saber que, como eu disse, a África é um continente não um país e que neste conjunto encontramos ainda cultos brasileiros e ameríndios. Buscar semelhanças entre eles é insano e idiota.
As pessoas sempre buscam simplificação para superarem a sua preguiça ou ignorância, assim, em vez de entenderem a nossa riqueza cultural e religiosa fazem o pior, inventam algo que não existe usando explicações idiotas. Isso aumenta a confusão. Como um amigo falou, é muito fácil escrever sobre candomblé, você inventa o que quer e tem um monte de gente que ainda acredita. A mídia escrita e televisiva que é formada de 3% de jornalistas que tem neurônios, apenas torna isso pior chamando tudo que não é cristão de afro-brasileiro. Como já repeti inúmeras vezes o catolicismo é afro-brasileiro.

Eu imagino que os cubanos que estão vindo para o Brasil trazer o seu ifá e a reboque o lukumi que é a tradição de orixá deles, tem aumentado a confusão porque inserem um novo elemento neste “caldo”. Primeiro devemos lembrar que eles devem ter uma absurda dificuldade de entender o candomblé. A tradição deles, o lukumi, é unificado e tem inclusive uma regra de formato, todos fazem igual, ou com pequenas variações, afinal cuba é apenas uma pequena ilha. O candomblé é muito maior, rico, complexo e diversificado. Eles podem chegar aqui tentando traçar semelhanças entre o lukumi e o candomblé, mas falham, largamente, em entender uma coisa que está muito além do que eles podem entender.

O lukumi pode ser comparado, no máximo a um pequeno pedaço do candomblé, uma nação, como o Omolokô ou ao Angola que mistura religião Yoruba com Bantu, ou como a gente diz, candomblé com umbanda. O lukumi é uma mistura muito grande da origem yoruba com o bantu e o catolicismo. Não da para comparar com o candomblé. O que eles fazem é o mesmo que as pessoas de umbanda fazem ao tentar explicar ou entender o candomblé em função do que eles conhecem. Nem os umbandistas entendem o candomblé nem os cubanos, e ambos acham que sabem tudo e de fato nada sabem de nada.

Além da questão das nações, que criou inicialmente diversidade, o candomblé foi responsável por um processo de profundo de transformação da própria religião Yoruba, processo este que está sendo absorvido pela própria tradição africana. Na terra Yoruba, a religião e os cultos eram regionalizados e muito mais especializados, sendo agrupados em aldeias, cidades e famílias. Além disso as próprias divindades eram elementos de agregação. Enquanto no Brasil nós tivemos uma especialização em 3 cultos, na terra Yoruba, o culto era segmentado por divindade.

No Brasil, a estrutura Yoruba original era impossível de ser refletida. O modelo família, clã, aldeia e região era inviável devido a situação de escravos que as pessoas viviam aqui. O candomblé criou a figura do terreiro como ponto de união e substituição disso tudo, incluindo uma unificação litúrgica uma vez que um terreiro inclui, aqui, o culto a todos os orixás. O terreiro substituiu a família, o clã, a aldeia e o templo. A figura do terreiro reconstitui na tradição religiosa da Diáspora os elementos perdidos da sociedade Yoruba e sua constituição, no formato que tomou, foi um pilar importante na religião, mantendo melhor os vínculos teológicos originais do candomblé com a religião Yoruba.

Os lukumi de cuba, não tem o elemento terreiro ou mesmo egbe e isso explica bastante o distanciamento deles e a atitude agressiva que alguns grupos cubanos e de pessoas iniciadas por cubanos, tem tomados em relação a tradição Yoruba. A única explicação que eu encontro para a forma agressiva como cubanos de lukumi ou ifá se dirigem aos nigerianos ou seguidores da tradição Yoruba é, ou a necessidade de se justificarem no mercado religioso (de jogos, ebós e iniciações) ou um problema de autoestima por eles se acharem menores ou diferentes. Reconheço que não sei a causa, apenas posso imaginar.

Lamento os comentários que alguns podem não gostar. Não pretendo comentar sobre o Lukumi, Cuba é uma ilha pouco mais que o estado do Rio de Janeiro e com uma população equivalente. É impossível a gente querer comparar a riqueza cultural que temo no Brasil com uma ilha e população tão pequena.

Voltando ao candomblé, os 2 principais grupos religiosos presentes no candomblé são o Yoruba e o Jeje, cada um deles representa uma base religiosa distinta. Elas possuem similaridades, algumas ligações ou coisas em comum mas não são a mesma religião.

As diversas nações formam subdivisões do candomblé e pertencentes a uma dessas 2 religiões. Algumas pessoas podem estar notando, e estranhando, que não menciono o Angola no mesmo nível que o Yoruba ou jeje. Ele não está neste nível. O angola é uma nação de Candomblé, como as demais que serão citadas. O angola deveria pertencer ao grupo bantu e este grupo não tem uma base religiosa equivalente aos Yoruba ou Jeje. Eles são similares a umbanda, onde deveriam estar. O que ocorreu foi que, pessoas da bantu copiaram o modelo Yoruba, fizeram adaptações linguísticas e inventaram uma nação para eles, mais especificamente uma nação para uma religião que na áfrica nunca tiveram. Isso não os desmerece como uma tradição religiosa Yoruba. Mas eles são um grupo étnico que adotou a religião Yoruba e criou uma tradição própria para a etnia deles.

Tudo isso em poucas linhas

O Candomblé é uma denominação que cobre várias tradições religiosas, nem todas ligadas à mesma religião base. Algumas são ligadas a religião Yoruba, com as divindades chamadas Orixá e outras a religião do Dahomey com as divindades chamadas Vodun.

Esta diversidade religiosa é nomeada como sendo as nações do candomblé. Contudo, acima da nação esta a religião a qual ela é ligada. A nação personaliza o culto da religião para um determinado grupo de pessoas.

De norte a sul do Brasil existem tradições religiosas diferentes que são genericamente traduzidas como Candomblé, contudo descendem de, pelo menos, uma dessas 2 religiões distintas e trilharam caminhos diferentes na sua formação em termos de afastamento da teologia da religião base, sincretismo com outras correntes religiosas e formatos litúrgicos.

Esse rico contexto religioso que é chamado resumidamente de CANDOMBLÉ mostra a diversidade e profundidade de integração que são possíveis de serem obtidos levando em consideração a própria extensão do nosso território e diversidade do povo brasileiro.

Antes de se discutir candomblé deve se ter o cuidado de se situar de qual candomblé se está falando. Existem diferenças teológicas importantes e qualquer iniciativa de fazer um de-para de orixá e vodum e de ritos é apenas fruto de ignorância.

3. A conversa de cafezinho


Se você estiver em uma situação que tem alguns instantes ou minutos para explicar sua religião a alguém eu tenho minha sugestão:

O candomblé é uma tradição religiosa que tem como origem uma religião africana, sem um nome especial, que pertence ao povo Yoruba que ocupa atualmente uma parte da Nigéria. Ele é baseado na existência de uma divindade suprema, Olodumare, que criou e mantêm tudo o que existe. A religião diz que nascemos para ser felizes, para viver em família e em comunidade. Para nos apoiar na nossa busca de felicidade na vida, Olodumare nos dá uma divindade pessoal, que nos protege, e também as divindades chamadas de Orixás, que são seus representantes na nossa vida. Olodumare nos dá também um oráculo, Ifá, que usamos para nos comunicar e pedir ajuda a esses Orixás. Além disso ele nos ensinou ritos e liturgias que usamos para resolver nossos problemas e atingirmos o ideal de uma vida feliz e próspera. A presença dos orixás na nossa vida é festiva e prazerosa, vivemos em comunhão com eles. O Candomblé é uma religião encarnacionista. A morte encerra um ciclo de vida e após prestarmos conta do que fizemos em nossa vida para Olodumare, poderemos ter a oportunidade de voltar a viver em nova vida. A vida é uma aventura que vivemos porque queremos.

Esta é uma definição bastante objetiva. Poucas palavras escolhidas com cuidado para cobrir o que é essencial. Somente é abordado o que é importante. Se algum idiota vier com o tradicional questionamento sobre sacrifícios de animais sugiro responder apenas o seguinte:

Este é um aspecto que não tem nenhuma relevância no contexto religioso. O que as pessoas devem saber e se lembrar é que esta religião tem o indivíduo no centro de suas atenções. Tudo é feito para que a pessoa seja feliz nesta vida, mas sempre com a ajuda da sua família e sociedade. O indivíduo é importante mas a sua utilidade para a sociedade é maior. Os animais são criações de Olodumare como tudo o que existe. Como na nossa vida normal, eles são um alimento que é preparado e consumido em comunhão festiva com os orixás. O candomblé é a religião da vida e alimento é vida. A prática da religião foi feita para ser um momento alegre. Assim como os sacerdotes judeus preparam a comida KOSHER, os sacerdotes do candomblé também preparam o alimento a ser usado em suas festas. Os animais, secundariamente, são um elemento importante para salvar a vida das pessoas. Entretanto esta religião não e baseada em ritos com animais. Eles são raros. O que está presente no dia a dia das pessoas é o oráculo e a devoção a sua fé. As pessoas por ignorância ou preconceito não querem entender o que esta religião pode fazer de bem para a vida delas, perdem tempo com questões litúrgicas internas e que não estão no dia a dia das pessoas. Os judeus até hoje sacrificam cordeiros para o deus cristão. Os muçulmanos idem. Quantos dos que se preocupam em perguntar isso a um candomblecista, fazem o mesmo com um cristão ou maçom?

O texto ficou intencionalmente em um único parágrafo.

Minha opinião é que não devemos perder mais tempo do que o necessário para dizer isso e nada mais sobre sacrifícios. A religião tem aspectos mais importantes para serem conversados.

4. A Filosofia da religião - A proposta da religião para nossa vida


Toda religião pode ser inicialmente definida com uma ideia simples. Uma frase ou uma palavra podem resumi-la. Por exemplo, Islã pode ser definido por submissão, submissão a deus. Os católicos por devoção ou amor ao próximo.

Considerando que religião é para ser praticada por pessoas comuns, a filosofia por trás da religião tem que ser uma coisa fácil de ser entendida por qualquer pessoa. Não pode ser necessário a pessoa ser um teólogo ou sacerdote para saber o que a religião dele prega. Temos também entender que religião não está relacionada à ligação com deus.

Qualquer pessoa pode se ligar com deus de qualquer forma. Tem muita gente que se diz religiosa, ou crente em deus e diz que não faz parte de nenhuma religião. A pessoa simplesmente diz que crê em deus da forma dela. Esta certa, acreditar no divino e na existência de deus não implica em participar de uma religião.

Isso também não significa que essa pessoa se comunique com deus.

Uma religião não é a ligação a deus. Uma religião é uma filosofia de vida, ela estabelece uma proposta para você viver com você mesmo, com sua família e com a sociedade. A religião nos dá uma visão maior da vida, nos dá valores e ética.

A religião tem que necessariamente ser a palavra de deus. Religiões autênticas são anunciadas, elas nos foram trazidas pelo próprio deus ou por emissários dele. Religiões não são invenções humanas. Além da palavra de deus a religião nos ensina a nos comunicarmos com ele e também como devemos viver nossa vida.

Hoje em dia as pessoas se preocupam muito em não ter regras ou em quebrar regras. De fato uma religião é cheia de regras. Mas pessoas que não seguem regras ou acham que podem quebrar as regras não serão jamais pessoas boas para se conviver em sociedade.

Partindo da ideia de que qualquer pessoa pode entender a proposta de vida de uma religião e que isso é necessário para ele decidir seguir esta religião eu elaborei uma síntese da filosofia que existe na religião yoruba e que é usada pelo Candomblé. A seguir eu explicarei cada uma desses conceitos, mas primeiro vamos entender quais são eles.

Como mostrei esses conceitos se enquadram no círculo externo, na parte da teologia que todos podem entender.

  • Uma palavra e ideia resume esta religião, ela é EQUILIBRIO.
  • A religião Yoruba é baseada na existência de um deus supremo, Olodumare, que criou tudo o que existe e através do seu poder mantém o equilíbrio e o funcionamento do mundo natural. 
  • O centro da religião é a existência humana, a família e a sociedade. As pessoas nascem para serem felizes e viverem juntas. 
  • O indivíduo é o núcleo da filosofia da religião. A existência de uma pessoa é individual e única. A pessoa tem uma concepção exclusiva e personalizada para realizar seu destino. A religião privilegia esta meta e acompanha o individuo do nascimento até sua morte.
  • Para tornar a vida das pessoas mais agradável, frente as dificuldades da vida e do mundo, além de ser o seu intermediário na relação com essas pessoas, a divindade suprema, Olodumare, colocou um conjunto de divindades chamadas de Orixás e um oráculo chamado de ifá para suportar as pessoas ao longo de sua vida.
  • Esta religião é encarnacionista. As pessoas nascem, vivem, morrem e voltam a nascer através de seus descendentes. As pessoas renascem dentro da sua própria linhagem. Por esta razão é muito importante para a pessoa casar e ter filhos.
  • A religião envolve, conforta, convive e participa da vida das pessoas. As pessoas são abraçadas pela religião e sentem o divino em sua vida diária, orientado-os, suportando-os e falando com eles.
  • A religião vê a existência em 2 planos. O plano natural, ou aiye, que é onde vivemos, o mundo natural. Existe ainda o plano espiritual ou o Orun. A vida no plano natural, o aiye, é temporária, vivemos enquanto nosso corpo suporta, mas a existência no Orun é perene.
  • O conhecimento teológico da religião está contido em um largo conjunto de versos que contam histórias. É através de metáforas e parábolas que o conhecimento é transmitido.
  • A religião Yoruba é iniciática. Apesar da abrangência universal da sua teologia, que não condiciona sua prática para nenhuma etnia, existem liturgias e cerimônias para estabelecer ou reforçar a ligação das pessoas com o divino, entre o mundo natural e o espiritual. Essas liturgias estão ligadas ao conceito de axé e por conseguinte ao equilíbrio da pessoa.
  • O clero da religião Yoruba é uma estrutura formal, ampla e bastante hierarquizada. Existem cargos e especializações. O núcleo do clero se restringe ao microcosmo do Ile axé ou casa de orixá, mas o dirigente da casa responde ao seu iniciador, criando assim uma corrente hierárquica que vai até a casa matriz.
  • A religião estabelece um código de conduta baseado em valores, ética e moral. Este código é transmitido através do corpo literário, os versos de ifá e é bastante pragmático, direcionando a pessoa para uma vida correta consigo mesmo e útil para a sua família e comunidade. Não existe pecado contra o divino contra deus e os orixás. O que existe é o erro contra as pessoas, a família e a comunidade.
  • A religião tem um processo de incorporação no qual a energia do Orixá se apropria do corpo do iniciado. É através desta incorporação que o Orixá se manifesta no mundo natural para ajudar às pessoas. Esta manifestação ocorre em pessoas iniciadas para isto e não tem como finalidade a comunicação, que na religião é feita pelo oráculo.

No texto a seguir estão as afirmações que foram feitas anteriormente com uma rápida explicação sobre elas. Essas explicações são bem curtas e apenas ajudam a entender as afirmações principais.


Uma palavra e ideia resume esta religião, ela é EQUILÍBRIO.

Sua doutrina, em todos os aspectos, é voltada para se atingir o equilíbrio. Toda a simbologia da religião também traduz essa noção de equilíbrio. A religião entende que a pessoa está bem quando esta equilibrada. O equilíbrio se reflete no seu comportamento, nas suas atitudes, nas suas escolhas, na sua sorte e até na sua saúde. O equilíbrio é uma questão energética, da energia vital, chamada de axé e a manutenção do axé é um dos pilares da religião.

A religião é muito rica em liturgias, conhecidos por todos através dos nomes populares de ebó e oferenda. O que todos devem entender é que essas liturgias não são um fim. A religião se utiliza delas para equilibrar o axé das pessoas, de forma que o equilíbrio é que o fim. Nem mesmo a solução do problema é o fim. Será através do equilíbrio que a pessoa vai resolver seus problemas.

A religião Yoruba é baseada na existência de um deus supremo, Olodumare, que criou tudo o que existe e através do seu poder mantém o equilíbrio e o funcionamento do mundo natural.

O poder de Olodumare é supremo e inconteste. Ele não divide sua capacidade e supremacia com mais nenhuma outra divindade e todas as demais divindades foram criadas e subordinadas a ele.

Olodumare não interfere diretamente na vida das pessoas. Ele está acima de tudo e todos, mas criou um conjunto de divindades que são seus intermediários no trato com as pessoas. Tudo no mundo natural é criação de deus e tudo nesse mundo possui igualmente sua atenção e principalmente sua energia.

Esta não é uma religião monoteísta, porque somente a religião judaica-muçulmana-cristã o é. Não é uma religião politeísta porque existe uma divindade suprema. O que define uma religião politeísta não é a quantidade de divindades e sim a qualidade da relação entre elas.

Como muitas outras religiões na terra a religião Yoruba é Henoteísta, que é uma crença com muitas divindades na qual somente uma é a suprema. Mas isso é apenas uma informação técnica.


O centro da religião é a existência humana, a família e a sociedade. As pessoas nascem para serem felizes e viverem juntas.

As pessoas nascem para viver uma vida em família, com realizações e objetivos. As pessoas nascem porque gostam de viver juntas. A vida é uma aventura com emoções, sensações, prazeres e realizações.

A religião orienta as pessoas na melhor conduta moral mas tem o compromisso maior de suportar as pessoas na realização do seu objetivo de vida.


O indivíduo é o núcleo da filosofia da religião. A existência de uma pessoa é individual e única. A pessoa tem uma concepção exclusiva e personalizada para realizar seu destino. A religião privilegia esta meta e acompanha o individuo do nascimento até sua morte

Entre a decisão de nascer de novo até o nascimento o indivíduo recebe de Olodumare todos os instrumentos necessários para ser bem-sucedido nas escolhas que fez. Estes instrumentos são o seu corpo, a sua divindade pessoal que vai zelar por ela acima de tudo, o axé (energia mágica de Olodumare), o orixá protetor que junto com a divindade pessoal acompanham o indivíduo por toda sua existência e elementos adicionais que são o ori, para a sua prosperidade e o seu caráter, ou iwa pele, porque uma pessoa para ser bem-sucedida de ter um com ori e um bom caráter.

A individualização é outro pilar da religião. A religião não massifica suas mensagens, pelo contrário, apesar do caráter social, existe uma enorme importância na formação e suporte a individualidade. O oráculo de ifá e o culto a divindade Ori são partes disso.

É importante as pessoas não perderem essas 2 dimensões: individuo e sociedade. Elas caminham juntas.


Para tornar a vida das pessoas mais agradável, frente as dificuldades da vida e do mundo, além de ser o seu intermediário na relação com essas pessoas, a divindade suprema, Olodumare, colocou um conjunto de divindades chamadas de Orixás e um oráculo chamado de ifá para suportar as pessoas ao longo de sua vida.

Os orixás, existem pelas pessoas e com as pessoas. Chamar orixá de deuses é uma imprecisão que leva a dar lhes uma dimensão maior e confundir suas atribuições. Orixá está associado às pessoas e a existência humana. Ele representa Olodumarê na relação com as pessoas.

O sentido da existência de um orixá é a vida humana. O orixá representa o compromisso de deus, de Olodumarê, com nossa felicidade. Orixás não são divindades criadas por Olodumarê para cuidar ou representar a natureza.

Orixá não é um deus secundário como no sentido greco-romano, que estabelece funções gerais e abrangentes com domínio sobre a terra e a natureza. Orixás existem para ajudar as pessoas a seguirem o seu caminho de vida permitindo que elas realizem os seus objetivos para esta vida, ou seu destino.

Olodumarê estabelece a existência de uma divindade pessoal, superior aos orixás, no que diz respeito à relação com o ser humano, enquanto que os orixás zelam pela pessoa e também pela família e sociedade.

Para permitir a comunicação entre deus e as pessoas, Olodumarê estabeleceu o oráculo de ifá que transmite a palavra de deus para as pessoas, grupos e até a sociedade.



Esta religião é encarnacionista. As pessoas nascem, vivem, morrem e voltam a nascer através de seus descendentes. As pessoas renascem dentro da sua própria linhagem. Por esta razão é muito importante para a pessoa casar e ter filhos.

Tudo o que a pessoa realizar em vida será pesado em seu retorno ao mundo espiritual. Mas ele somente prestará conta de seus atos e realizações a Olodumarê. Existem tratamentos diferenciados para quem foi uma pessoa boa ou má ou que foi importante ou não para sua família.

Os descendentes possibilitam a pessoa voltar a nascer. Esta visão do processo encarnacionista é muito importante porque torna o processo de encarnar integrado com a visão da religião para a família no centro das relações.

Não existe caráter evolutivo em viver, a religião entende que as pessoas vivem pelo prazer de viver. Não existe o conceito de “karma” ou da pessoa evoluir a cada encarnação para nunca mais encarnar. As pessoas sempre podem querer encarnar novamente, mas, isso pode ser afetado pela avaliação de Olodumarê da vida delas.



A religião envolve, conforta, convive e participa da vida das pessoas. As pessoas são abraçadas pela religião e sentem o divino em sua vida diária, orientado-os, suportando-os e falando com eles.

Esta não é uma religião contemplativa. A religião, através de suas divindades e oráculo, participa ativamente da vida das pessoas as orientando e suportando na busca do caminho da felicidade, da realização dos objetivos de vida e também da solução dos seus problemas.

Deus fala com as pessoas através dos orixás e do oráculo de ifá. A resposta de deus é audível ou visível. As respostas as preces das pessoas serão atos, ações, resultados e mudança no curso da vida. A fé nesta religião é recompensada com a resposta individualizada e com ações resultantes.

Os orixás, a magia, a medicina baseada em folhas e os poderes supernaturais são os elementos que socorrem as pessoas nas suas suplicas pessoais e como resultado da consulta ao oráculo de ifá. A religião não vê deus como onisciente e onipresente. É necessário que as pessoas o procurem através de suas preces e principalmente do oráculo da religião. É no oráculo que as suplicas e necessidades chegam a deus.

Através de liturgias Olodumarê fornece a energia que será usada pelos orixás e sacerdotes para concertar a vida das pessoas.



A religião vê a existência em 2 planos. O plano natural, ou aiye, que é onde vivemos, o mundo natural. Existe ainda o plano espiritual ou o Orun. A vida no plano natural, o aiye, é temporária, vivemos enquanto nosso corpo suporta, mas a existência no Orun é perene.

O aiye e o orun seriam espelhos de existência. A vida existe no orun e continua no aiye. A vida no orun é similar a vida no aiye, mas, aparentemente menos interessante e sem a aventura e o inesperado. A pessoa vem para o aiye porque quer uma vida diferente da vida no orun. O aiye é imprevisível e sensorial, mas, temporário. Quando morremos voltamos ao orun.

Por esta razão é que explico que o conceito do que é certo ou errado ou do que é permitido e tolerado é relativo. A existência no aiye é um paralelo a vida no orun, é temporária e as pessoas buscam a novidade e imprevisibilidade.



O conhecimento teológico da religião está contido em um largo conjunto de versos que contam histórias. É através de metáforas e parábolas que o conhecimento é transmitido.

Além desses versos existem mitos regionais que, também através de histórias, transmitem os fundamentos religiosos, os valores, a ética e a moral. Por fim, existem cantigas e estrofes (chamadas de orikis) que complementam essas informações.

As tradições da Diáspora criaram seus próprios mitos ou versões dos mitos originais para compensar a dificuldade no acesso à literatura original.

Esse corpo literário é equivalente aos livros da bíblia cristão ou mesmo ao Corão do Islã.

O povo Yoruba não tinha língua escrita, somente falada, até os meados do século XX. Este conhecimento teológico fazia parte da cultura do povo e era transmitido oralmente. O processo do escravagismo prejudicou muito a manutenção deste conhecimento, devido às guerras e a morte dos mais velhos nos navios. Os mais novos não tinham armazenado o conhecimento necessário.

Colonizadores europeus criaram uma representação escrita para a lingual, tonal, que era falada, permitindo um longo e lento trabalho de recuperação e documentação deste conhecimento. A falta do registro escrito prejudicou demais a cultura e religião Yoruba. Em termos teológicos prejudica até hoje devido à dificuldade em conhecer, transmitir e discutir a religião. Em ter os históricos a religião Yoruba ainda está no que seria o período pré-bíblia impressa da religião católica.



A religião Yoruba é iniciática. Apesar da abrangência universal da sua teologia, que não condiciona sua prática para nenhuma etnia, existem liturgias e cerimônias para estabelecer ou reforçar a ligação das pessoas com o divino, entre o mundo natural e o espiritual. Essas liturgias estão ligadas ao conceito de axé e por conseguinte ao equilíbrio da pessoa.

Muitas religiões também são iniciáticas. O catolicismo é a mais conhecida, a pessoa somente faz parte da religião se passar pelas cerimonias de batismo e comunhão.

A iniciação na religião Yoruba, tem vários níveis e finalidades. Nem todos necessitam ser sacerdotes, existem posições intermediárias. O objetivo das iniciações e liturgias é sempre o mesmo. Dotar o individuo das melhores condições e instrumentos para ele poder atingir os objetivos de sua vida. Além disso o corpo sacerdotal assume o compromisso de ajudar a outros indivíduos a realizarem seu destino.

Dessa maneira podemos dividir as liturgias e iniciações em 2 grupos principais. O primeiro é aquelas voltadas para beneficiar os indivíduos na sua busca por felicidade e realização. O segundo são as que preparam pessoas para ajudarem essas pessoas, do primeiro grupo a atingirem isso.

Enquanto o primeiro grupo beneficia o individuo, o segundo permite ao individuo beneficiar a sociedade que ele pertence. A plenitude da religião e seus benefícios práticos não são alcançados sozinhos. A religião se pratica em comunidade.

Esta é uma religião de família e comunidade, acima de tudo. Tudo é feito em grupo e existem muitos intermediários. O indivíduo é muito importante, como eu já disse, ele está no centro de tudo, mas, sozinho ele não chega a lugar algum. Para ter sucesso ele precisa da ajuda de muitos. Este exemplo está largamente documentado no corpo literário da religião, nos versos de ifá.

Não existe a relação solitária do individuo com deus. Os orixás, os vários, são os intermediários entre o individuo e deus, Olodumarê. Nada chega a deus sem a ação dos orixás e mais, não recorremos somente a um. Recorremos a todos e todos podem nos ajudar.

Os orixás, por sua vez, para se tornarem presentes no mundo natural necessitam dos seus sacerdotes, os eleguás. A presença do orixá, uma divindade no mundo natural é através da incorporação nos seus sacerdotes.

Também serão os sacerdotes que farão as liturgias de transferência de axé, a energia de Olodumarê, entre seres viventes, de todos os reinos. Axé é vida e força. Os sacerdotes transmutam axé dos elementos da terra para trazer equilíbrio. às pessoas. O axé não surge do nada, ele foi colocado por Olodumarê em cada ser vivente, animal, vegetal ou mineral e somente desses materiais pode ser obtido.

Desta maneira, para que a religião possa ser praticada e atue no benefício das pessoas são necessários sacerdotes. Os sacerdotes são preparados através de um longo processo iniciático e também de aprendizagem.

O indivíduo é o centro da religião, mas, somente através a comunidade é que a religião pode ser praticada em sua plenitude e eficácia. Uma andorinha sozinha não faz um verão. Tudo nesta religião é resultado do trabalho de muitas pessoas.

Tudo nessa religião inspira ao equilíbrio. O individuo é o foco, mas, os resultados e a prática da religião é uma ação comunitária. Não existe como referência a pessoa sozinha rezando para deus. A pessoa pede aos orixás e a prática da religião é uma atividade comunitária.

Como eu citei, para que pessoas sejam beneficiadas pela religião é necessário o trabalho de um grande grupo de pessoas que além de cuidar de sua vida, se dedicam a ajudar às outras pessoas.



O clero da religião Yoruba é uma estrutura formal, ampla e bastante hierarquizada. Existem cargos e especializações. O núcleo do clero se restringe ao microcosmo do Ile axé ou casa de orixá, mas o dirigente da casa responde ao seu iniciador, criando assim uma corrente hierárquica que vai até a casa matriz.

Não existe uma organização formal supra-casa de orixá. A organização geral é religiosa e baseada nos vínculos iniciáticos. A pessoa deve satisfação do que faz e como faz para a pessoa que o iniciou. Durante toda sua vida voltará a esta pessoa para realizar liturgias. A prática da religião na sua casa deverá seguir os padrões definidos pela casa de quem o iniciou e qualquer mudança devera ser autorizada.

Este princípio cria uma estrutura hierárquica piramidal típica, entre as casas até a casa matriz. Esta regra estrutural é bem clara e plenamente reconhecida por todas as pessoas, mas, muito desrespeitada na prática.

Intra-casas a estrutura é similar, mas, agora, mesmo na prática, plenamente respeitada. A figura principal de uma casa é o babalorixá. Abaixo dele existem cargos funcionais e honoríficos distribuídos entre os iniciados da casa. Uma casa tem inciados com formação completa, em formação, os não iniciados e os simpatizantes.

A hierarquia é definida pelo tempo de iniciação, idade e cargo na estrutura. Os cargos são tipicamente funcionais e necessários para o correto funcionamento da casa devido as inúmeras atividades que são necessárias para manter esta religião iniciática em funcionamento.



A religião estabelece um código de conduta baseado em valores, ética e moral. Este código é transmitido através do corpo literário, os versos de ifá e é bastante pragmático, direcionando a pessoa para uma vida correta consigo mesmo e útil para a sua família e comunidade. Não existe pecado contra o divino contra deus e os orixás. O que existe é o erro contra as pessoas, a família e a comunidade.

O conceito do que é certo ou errado é distinto do existente na moral cristã, isso faz muitos acreditarem que esta é uma religião sem pecados. Sim, não existe o conceito de pecado contra o divino ou contra uma lei divina. Existe o erro que você comete contra sua vida e às demais pessoas.

Toda pessoa presta conta de seus atos a deus, a Olodumarê. Isso quer dizer que existem parâmetros que definem o que é certo e errado. Em função de sua vida a pessoa pode, após sua morte, ir para uma parte do orun destinada as pessoas boas ou uma parte destinada a pessoas ruins. Pessoas ruins poderão ter como consequência a perda do vínculo familiar com sua linhagem, poderão também serem condenadas a voltar a vida como animais.

Boas pessoas receberão no Orun as bênçãos de uma boa vida e também o que é mais importante a lembrança dos seus descendentes que vão cultuá-los.

O mais grave erro que uma pessoa pode cometer é prejudicar outra pessoa a atingir o destino dela, o destino que ela pediu a deus. Esta é uma falta muito grave.

Não existe o paradigma do sempre certo versus o nunca errado, a nossa vida é a soma disso. A sombra e a luz são criações de deus, o bem e o mal também. O mal equilibra o bem, nunca se pode estar bem demais ou mal demais.

A ética, a conduta e a utilidade para a sociedade são valores absolutamente importantes, contudo a importância que se dá para o ganho ou perda é que é relativo. Ganhar ou perder fazem parte da vida. Um ganha e outro perde. Os papéis se invertem o tempo todo, mas, ao fim da vida a pessoa presta contas a Olodumarê sobre o que fez na sua vida. Todos prestamos conta de nossos atos e realizações. A avaliação de Olodumarê é o que pesará no seguimento de nossa existência.



A religião tem um processo de incorporação no qual a energia do Orixá se apropria do corpo do iniciado. É através desta incorporação que o Orixá se manifesta no mundo natural para ajudar às pessoas. Esta manifestação ocorre em pessoas iniciadas para isto e não tem como finalidade a comunicação, que na religião é feita pelo oráculo.

Este é um assunto mais complicado. Não posso deixar de abordá-lo, mas, não acho que vale a pena me estender nele. Em relação a tudo o que foi falado sobre a religião este é o tema menos relevante. Os demais são mais importantes para entender e explicar a religião.

Sim, existe a manifestação do Orixá no mundo natural através da incorporação em pessoas especialmente preparadas para isso. É um momento importante, cativante, que reforça a fé das pessoas na religião, que mostra para elas que elas não rezam para o silêncio e que como esta na teologia, deus, Olodumarê, responde a elas através dos Orixás.

A incorporação significa para o crente que tudo aquilo que falamos é verdade, que ela não está sozinha no mundo e que o divino, deus e os orixás, estão o tempo todo às assistindo e zelando. Nada é mais doce e mais terno do que abraçar um orixá. Orixá é puro amor e ao nos encontrarmos com eles reconhecemos o sentido do que fazemos.

A incorporação é a materialização da fé. As pessoas acreditam, rezam, louvam e agradam orixás. Os orixás em retorno se manifestam para as pessoas mostrando que eles não são pensamentos e sim divindades reais e presentes.

Este é o significado maior da incorporação do orixá em um momento de festa. No candomblé os orixás vem ao mundo natural em um momento festivo, cercados de música, canto e dança. Esta é a imagem que os orixás querem que as pessoas tenham deles. As pessoas se alegram, festejam e dançam junto com os orixás. A comunhão com o divino não é um momento sisudo ou de medo. É um momento alegre e divertido.

Os orixás não possuem imagens ou figuras no candomblé.

Os orixás não incorporam para falar ou dar consultas no candomblé. A comunicação com os orixás é feita através do oráculo. O candomblé não tem nada a ver com a umbanda, na umbanda as incorporações são o centro da religião e os guias incorporam para se comunicar com as pessoas. Entretanto este não é o modelo do candomblé.



NOTAS

Como expliquei o candomblé é heterogeneo, não é uma coisa única, eu falo aqui sobre a religião de origem Yoruba e por conseguinte do candomblé ligado a ela. Possivelmente na outra religião e no candomblé ligado a ela as coisas sejam diferentes, mas cabe a eles falarem deles.

Muitos podem observar que a prioridade que dou a assuntos é diferente. Os Orixás são uma parte da religião, importante sem dúvida, mas não o todo. A religião os contêm mas eles não são a religião. No dia a dia as pessoas falam de coisas muito confusas e misturadas, o meu texto não foi feito para essa confusão e sim para acabar com ela.