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domingo, maio 22, 2011

Profissão: Pai de Santo

Para encerrar essa trilogia sobre a questão dos sacerdotes despreparados e descontrolados, eu escolhi abordar a questão do religioso profissional. O título é provocativo porque lembra justamento uma precepção negativa na maioria das pessoas.

Eu gostaria de iniciar dizendo que não existe nenhum problema ético envolvido em ser um sacerdote profissional. Os padres católicos são sacerdotes profissionais e isso não prejudica sua imagem, talvez ao contrário, a dedicação absoluta desperta até admiração pelo sentido da vocação.

Assim, mesmo que, sendo um profissional remunerado,  a sociedade não deprecia o seu valor.

Os pentecostais, pastores protestantes provavelmente popularizaram a opção de ser um sacerdote sem com isso abrir mão de sua vida civil incluindo família e filhos. Essa opção abriu uma nova perspectiva a prática sacerdotal, trazendo a dedicação a fé algo acessível a qualquer pessoa.

Junto com a imagem do sacerdote devoto e dedicado católico, o protestante trouxe a imagem do homem comum, com obrigações comuns que exerce o seu ministério pela Fé e dedicação. Sem dúvida, mais um exemplo positivo.

Os kardecistas, muito populares no Brasil, adotaram também como modelo para o seu culto, ou seja lá como eles o chamem, como uma atividade compartilhada com a vida civil e majoritariamente como uma doação pessoal. O sentido da caridade pessoal atravessa toda a prática do espiritismo e esse culto ficou fortemente indetificado com isso.

Estamos no Brasil e sem dúvida essas são as principais religiões de convivência e que formam a percepção das pessoas. Esses conjunto e possivelmente também outras, contribuíram para formar na figura do religioso uma pessao dedicada, altruista, caridosa, ética e com sua fé acima de tudo.

A questão da remuneração da atividade religiosa nunca foi foco porque trata-se apenas de um fator de continuidade. Se a sociedade ou micro-sociedade no qual a igreja ou templo esta inserida quer um sacerdote que a assista em tempo integral ela tem que financiar essa atividade. Isso é bastante claro.

O modelo católico implica que sempre a sociedade vai ter que manter o sacerdote e a Igreja, seja pelo óbolo na Igreja, seja pelo dízimo da comunidade. Isso é bem claro e expontâneo. Mesmo a cobrança de taxas para cerimônias na Igreja é perfeitamente entendida pela população, o ativo tem que funcionar e as contas tem que ser pagas.

Os Kardecistas, como ja disse, muito populares na nossa sociedade, trouxeram uma doutrina muito mais radical. Eles entendem que tudo o que é feito através de um dom divino ou através do supernatural não pode ser cobrado. Se você recebe de graça deve transmitir de graça.

A situação da Umbanda

Neste contexto a opção padrão dos sacerdotes de Umbanda e Candomblé de serem quase sempre dedicados, e mais, viverem da religião transformando a sua opção religiosa em profissão, contrasta com essa realidade das outras relgiões,  e isso se mostra como um lado negativo dos sacerdotes e da própria religião.

A diferença a meu ver esta na forma como o sacedote pratica a sua profissão e como obtêm seus recursos financeiros. Enquanto nas demais religiões o sacerdote poderá ser um profissional (como já citado) da mesma forma como os pais de santos são, ele o será em função da sua comunidade e da sua vocação. É a sociedade que o sustentará e ele assim viverá para a sua vocação e sua fé.
 
Existe,  neste caso nas outras religiões, claramente uma relação bi-unívoca, uma via de 2 mãos. Existe uma troca de interesses entre a comunidade e o sacerdote. Não existe o comércio de obrigações, liturgias e nem a venda de favores e facilidades através do mundo espiritual.

O pai de santo profissional é excencialmente um comerciante que visa a ele mesmo, não importa aqui se ele faz o seu comércio pseudo-religioso para sustentar a sua casa ou a si mesmo ou aos dois. Isso não afeta a percepção de que a atividade não é exercida por vocação. A comunidade não o sustenta.

Muitos viram pai de santo para poder ser sustentar porque não tem nenhuma outra alternativa melhor. Outros substituem a sua profissão por ela adotando uma profissão mais rentável e na qual ele é seu próprio chefe.

Existem outros que atuam como profissionais depois de terem exercido uma profissão regular, depois de se aposentarem. É uma abordagem distinta mas isso não muda o aspecto profissional da questão que vou comentar a seguir.

O pai de santo profissional se sustenta através do seu grupo e o forma com essa finalidade. A iniciativa é dele e náo da comunidade. Ele forma o grupo e não o contrário.

O pai de santo profissional, organiza sua casa, que será um lugar seu e não da comunidade. O local da prática pertence ao pai de santo e não a comunidade. Esse local vai acabar quando o pai de santo desistir do que faz ou quando morrer.Nas estruturas religiosas de fato, o templo e a comunidade são superiores ao sacerdote, elas permanecem enquanto o sacerdote pode mudar.

O pai de santo profissional estabelece sua atividade pseudo-religiosa através do clientelismo. O principal grupo de clientes são os membros da casa de forma que quanto maior o grupo maior será a demanda de trabalho, muitas vezes geradas pelo próprio pai de santo. A este grupo se adiciona o grupo dos clientes, pessoas que procuram o pai de santo para solução de problemas e pagam por isso.

Os  dois grupos tem quase a mesma finalidade, sustentam financeiramente o pai de santo. O grupo das pessoas da casa, além de pagar pelos trabalhos e so suporte do pai de santo, doam o seu tempo gratuitamente para este  para ajuda-lo a ganhar dinheiro com o grupo de clientes.

Juntam duas coisas ai. A primeira é que essas pessoas inicialmente acreditam nessa dedicação. Depois eles observam que assim aprenderam como fazer os trabalhos para poderem ser no futuro independentes.

A direção das casas segue unicamente as vontades do pai de santo. É ele que dita os rumos ou os des-rumos e a rotina e não sua comunidade. O sentido de comunidade é muito pouco aplicável porque o grupo de um pai de santo é absoluto.

O pai de santo se mantêm independente, autônomo e acima de todos e tudo.

No fim das contas, como as pessoas da casa não tem qualquer controle ou participação nos rumos da casa e na pratica da "religião" elas são apenas um grupo subserviente que atende à necessidades economicas e laborial do pai de santo.

A porta de entrada da umbanda profissional são os ditos oráculos. A umbanda não tem oráculos, isso não faz parte da Umbanda, mas os pais de santo profissionais trouxeram isso para a Umbanda.

Assim a vulgaridade dos videntes, que sempre existiram e são uma atividade, que ninguém tem dúvida, completamente profissional, se adicionou a Umbanda de forma bastante ruim. Um vidente era uma pessoa que falava sobre a vida da pessoa e sobre outros.

Na umbanda, adicionou-se a isso os trabalhos para resolver os problemas, atingir os objetivos ou prejudicar os desafetos. O cliente chega no pai de santo, paga paga para ter uma consulta com um "oraculo"  de videntes e depois disso o próprio pai de santo, sabendo do que afeta a pessoa ou a sensibiliza ele passa os diversos trabalhos para resolver esses problemas.

Ele ganha dinheiro com a vidência e com os trabalhos. Quanto maior o problema ou a necessidade de resolvê-lo mais caro será o trabalho.

De fato me parece muito pouco ético um vidente fazer uma consulta para alguém, entender seus problemas e angustias e depois passar trabalhos pagos que ele mesmo vai fazer para resolver esses problemas.

Me parece cruel e desumano porque a pessoa vai pagar o valor que for estabelecido. É uma forma cruel de manipular as pessoas.

Quando uma pessoa tem uma dificuldade, algo que não consegue resolver ela sabe que a última porta que vai bater é a de um centro de Umbanda e lá em uma ou várias idas vai procurar alguém que o ajude. Essa ajuda será normalmente desprovida de qualquer ética. Sabe-se que normalmente ele será atendido no seu pedido de intervenção porque estará pagando por isso. O sacerdote ou seus guias não vão fazer qualquer avaliação se sua causa é justa. O que as pessoa exergam é que se estão pagando serão atendidas.

A prática é completamente desprovida de ética e de todo o sentido religioso que encontramos em qualquer religião. Isso é facilitado devido a boa imagem que o Kardecismo traz, de pessoas caridosas e dedicadas e também da boa imagem de Padres e pastores. Uma pessoa que chega a um centro de Umbanda ve no pai de santo ou màe de santo um equivalente ao sacerdotes éticos e movidos pela fé que encontra nas outras religiões da mesma base teogônica.

As pessoa sabem que também podem encontrar an centros de Umbanda o porto seguro para demandas contra outras pessoas. Pedidos absolutamente injustos e orientados ao malefício.
A Umbanda ou o pai de santo justificam isso deparando as entidades que trabalham, assim existem as entidades do bem e as entidades do mal.

Além da questão da possibilidade de ir a uma casa dita religiosa para comprar o malefício, a cobrança desses trabalhos é absolutamente indecente. Valores astronômicos sãp impostos para qualquer coisa.  Tudo vira uma consulta paga, um trabalho pago e até mesmo o oráculo de vidência domina a Umbanda.

Este é um cenário muito negativo e percebido pela população. Tanto as pessoas que frequentam os médiuns como os consulentes compartilham da mesma visão ruim e muitas casas se transformam em casa de resultado. Tudo isso voltado para sustentar a vida do pai de santo ou mãe de santo.

É muito comum esse modelo atrair os estelionatários para serem pais de santo. É muito comum pessoas sem estudo, sem edicação ou sem formação nenhuma, quando descobrem que são médiuns planejarem para sua vida se transformarem em pais de santo para que esta seja a sua profissão. Ou seja, ela não deu certo para mais nada, seja pela falta de carater seja pela falta de preparação (estudo, ofício) e visualizam na função de pai de santo a sua forma de ganhar dinheiro substituindo a profissão ou ocupação que não tem.

A população percebe isso. Ninguém é bobo.

Assim não existe aqui o modelo do sacerdote que se dedica como uma decorrência da exigência da sociedade sobre ele. Não, a profissão é a meta inicial e a pessoa deve transformar sua atividade em algo rentável para sua vida.

Não temos como enquadrar aqui o sentido de vocação e de fé.

Mas muitos podem pensar, é este o modelo desse culto?  Claro que não. Pior as pessoas que assim procedem são normalmente aquelas que não são preparadas para serem sacerdotes. Isso nunca foi designado a elas. Elas não tem a capacidade de o serem, elas não tem o preparo pessoal e religioso, elas não tem a vivência para poder fazê-lo.

Mas vão se dizer pai de santo assim mesmo.

Não pode existir uma casa religiosa ou um sacerdote que em uma hora use sua mão para abençoar e na outra use para fazer o malefício. A mão que foi suja pelo malefício jamais será limpa para abençoar qualquer pessoa.

A Umbanda é toda assim?  não, claro que não. Mas o tema aqui é falar em Pai de santo profissional e para esse tipo não existe exceções. Não importa se cobra muito ou pouco, é tudo igual.

A Umbanda de verdade não é comercial ou profissional. Não confunda a Umbanda como religião com a dita Umbanda que é praticada pelos pais de santo profissionais. O objetivo desse pequeno texto foi caracterizar a prática justamente dessas pessoas que se dizem de Umbanda mas que com o seu profissionalismos, com o seu mercantilismo em nada contribuem com ela.

Pais de santo profissionais são falsos Umbandistas.

A situação é, se a pessoa governa sua casa e não o contrário, se ela faz daquilo sua fonte de receita, se ele e a casa são independentes da comunidade, se ele cobra para fazer trabalhos, se ele usa um jogo qualquer para fazer vidência antes de recomendar trabalhos, se os guias dessa pessoa mandam os consulentes procurarem depois o pai de santo para ele jogar para eles (ao invés de eles mesmo resolverem os problemas) então essa pessoa é um pai de santo profissional.

Uma casa religiosa ou uma religião não pode se fundamentar em cima de uma base financeira. Não existe religião quando a comunidade não participa. Não existe religião quando a comunidade serve ao sacerdote. Não existe religião quando uma casa é um lugar de rotatividade, com as pessoas entrando e saindo.

Existem bons lugares de Umbanda. Se você esta em um lugar assim, fique tranquilo, o que frequenta não é religião.

Alguns leitores mais espertos podem estar se perguntando, mas como pode esse mundo supernatural tolerar isso?  Como podem esses guias permitirem esse tipo de uso?  se existem entidades do bem e do mal, como podem elas conviverem com essa realidade.

Pois é, são perguntas muito boas. Esses guias toleram essa situação assim como toleram todo o tipo de canalhice dos sacerdotes despreparados. Isso fica para outro texto.

A situação no Candomblé


No Candomblé a situação é similar com algumas diferenças. No Candomblé o sentido da comunidade é mais forte e muitas casas existem de forma perene, acima dos sacerdotes. É uma religião iniciática que exige longa preparação e uma casa sempre vive muito mais em torno de si e de seus membros.

A Umbanda não é uma religião iniciática.

O Candomblé pelo seu formato sempre exigiu do sacerdote uma dedicação muito grande.É um longo processo de aprendizado que exige presença física 24 hs ao dia.  O Candomblé foi formatado como uma pratica sectarista e que poucos podiam entrar. Era muito dificil, fora o aspecto da discriminação, a uma pessoa comum se submeter as obrigações e a dedicação necessária.

O formato do Candomblé requeria dedicação e mais, uma comunidade participante e atuante. Diferente da Umbanda, o Candomblé requer uma permenência de muitos anos em uma casa. É uma relação de longo prazo e não um lugar de rotatividade no qual por qualquer motivo a pessoa se muda para outro lugar.

O clientelismo no Camdomblé sempre existiu. As pessoas procuravam uma casa de candomblé para resolver problemas e a receita com isso era usada para sustentar a casa de candomblé. As casas de candomblé nunca foram ricas e o pai de santo ou màe de santo (principalmente esta segunda) nunca rica. Havia sempre uma grande comunidade de dependentes e desocupados para sustentar.

Sim essa sempre foi a fama e a realidade do candomblé. Um monte de gente que não trabalhava e era sustentado pela màe de santo.

Mas parecia uma coisa distinta. A comunidade, bem fechada, ficava com a pratica da religião e os clientes com os trabalhos. O segundo grupo não se misturava com o primeiro.

Mas isso já mudou muito.  Para começar o Candomblé virou uma religião mais aceita e aberta a sociedade. Seus ritos e liturgias se adaptaram a isso e se tornaram mais fáceis de serem adotados e praticados. Não é mais uma religião étnica e de guetos.

Com isso veio também o lado negativo. A migração massiva de Umbandistas trazendo a pratica dos videntes e todo o profissionalismo havia lá.

Mais do que isso essas pessoas que se diziam umbandistas trouxeram entidades como exus e pombo-giras para o Candomblé vulgarizando toda a religião de orixá.

Esses pais de santo ou médiuns que migraram da Umbanda para o Candomblé, não importa o motivo, não eram de fato Umbandistas, nunca entenderam de fato o que faziam ou praticavam e nunca deram valor a isso. Essa migração foi feita apenas para melhorar o produto deles, o produto que eles comercializam.  Assim vão se dizer babalorixás, vão dizer que jogam por odu, vão dizer que são babalawo. Eles serão aquilo o que as pessoas querem comprar.

O Candomblé esta cheio de "ex-Umbandistas". Falsos "ex-".  Pessoas que se dizem arrependidos e que abrem casas que não serão perenes, vão acabar junto com eles, pessoas que não sabem nem explicar a religião do Candomblé, muito menos praticá-la.

E Ifá?

É bem diferente.

Um babaláwo em qualquer lugar é uma pessoa que se dedica a um oráculo. Ele vive do que faz e cobra por isso.  Ele não é responsável pela prática de uma religião e não forma sacerdotes e comunidades como uma missão.

Um babaláwo sempre será ou poderá ser um profissional.  Isso por definição.

O que não esta no script, na definição, é o babaláwo ser uma pessoa rica e exuberante. Se isso ocorre é porque ele dá mais valor ao dinheiro do que ao quese propos a fazer. Nesse caso ele estará se afastando da religião e se aproximando dos videntes.

Se afaste dessas pessoas.


Os neo-pentecostais

Os Neo-pentecostais representam uma exceção ao universo do bem.

Coloque a IURD e todas as semelhantes.

São a pior espécie de pessoa que poderá encontrar, representam a falta de princípio e de caráter.

Muito pior do que um pai de santo profissional é um maldito pastor neo-pentecostal.

terça-feira, maio 10, 2011

O conflito iniciado-iniciador

Quando estava escrevendo o texto anterior, sobre o controle da prática da religião e também depois em um comentário do Erik, surgiu a questão das competêcias não realizadas de iniciador e iniciado. No momento do texto eu me desviei dessa questão senão ficaria um texto enorme, um assunto sem fim, mas o comentário posterior deu uma motivação adicional para fazer alguns comentários estruturados e não somente replicar a postagem.

No caso do Candomblé existem 2 regras que estão sendo negligenciadas e que trazem a causa para muitos os problemas ligados à necessidade de controlar a prática sem ética da religião. O mundo é complexo e longe de mim querer simplificar essa questão a apenas isso, mas, é um componente importante, ou uma causa raiz poderosa.

A primeira regra que esta sendo negligenciada é a falta de legitimidade de pessoas que estão abrindo casas. A maior parte das pessoas que são "donos" de casas abertas no Candomblé e mesmo na Umbanda, são pessoas que não foram legitimadas pelo divino, pelo seu Orixá para ser um babalorixá ou Iyalorixá.  

São pessoas que trocaram de casa para dar obrigação com outro que "desse" ou "anunciasse" esse direito que ela não receberia ou recebeu na sua casa original. Além disso existe o caso de muitos que nem a isso se deram o trabalho (de fato não faz muita diferença mesmo) e simplesmente abriram suas casas se auto-proclamando babalorixá ou Iyalorixá.

Posso ainda citar um caso extremamete comum que afeta pessoas consideradas famosas, presentes em rádios, jornais e revistas do meio, que são as pessoas que nem iniciação fizeram. Saíram da Umbanda e foram "virando" do Candomblé e hoje se dizem e se comportam como se fossem de fato sacerdotes.

Claro que não estou comentado nenhuma novidade. E o objetivo desse texto não é ficar dando espaço a estas fofocas de beco, mas, apenas explicar o que e como isso acontece.

A formação no Candomblé é muito difícil e rígida. O correto é uma pessoa escolher com cuidado a casa onde vai se iniciar e escolher quem será o zelador do seu Orixá. Essa é a escolha de uma vida, ou melhor, deve ser a escolha de uma vida. Ninguém deve ser obrigado a tomar nenhuma decisão ou fazer uma escolha que não esteja completamente segura e confortável. 

Não deve haver pressa do iniciado ou pressão do iniciador para essa decisão. Este é um processo natural de escolha e não de falta de escolha.

Uma vez decidido a iniciação, a feitura, é um processo longo, caro e de muito sacrifício pessoal. Serão uns 35 dias dentro de uma casa, além de meses de preparação e 1 ano de dedicação ao que foi feito. O processo de feitura somente se encerra na obrigação de 1 ano e a vida religiosa obrigatoriamete ligada aquela casa por mais 6 anos.

A vida de um iniciado, um Iyawo, é muito difícil, muito dura. A pessoa abre mão de muitas facilidades e se submete a infindáveis regras. Mesmo depois de seu 1 ano, ser Iyawo é uma submissão à humildade. De fato a pessoa tem que nascer de novo após sua feitura, porque sua vida jamais será como antes. Seja por regras impostas seja pela própria mudança que a pessoa vai passar, do seu interior para o exterior.

Isso não é para qualquer um. Eu não consigo ver qualquer pessoa passando por todo esse processo com facilidade.

O período de Iyawo de um iniciado dura até seus 7 anos, mas, observe, não necessariamente de tempo cronológico. No Candomblé o tempo só é contado quando se "paga" os anos através de fazer as obrigações de 1, 3 e 7 anos.  Se você cumpre o período mas não faz a obrigação, os anos não são contados e o seu ciclo se encerra. De fato o que importa não é o tempo e sim a obrigação. O ciclo somente se encerra quando se faz a obrigação de 7 anos que somente pode ser realizada, no mínimo, 7 anos depois da feitura.

Durante o período de Iyawo a pessoa não pode nada. Segue as regras e pouco aprende. Somente vai aprender o que observa, e isso exige discrição e interesse, ou o que participa sendo que sua participação nos ritos é muito restrita. O período de Iyawo é um período de sacrifício e de exercício da humildade. Eu admiro muito as pessoas que cumprem esses anos como devem ser.

Uma pessoa que entra em uma casa deve cumprir todo o seu período de Iyawo na mesma casa. Não se sai de uma casa para outra, dando uma obrigação com qualquer pessoa. As pessoas que fazem isso são ignorantes, ou devem ser de Umbanda, onde lá, na Umbanda não existe ligação enter o médium e a casa. No Candomblé, a feitura cria uma ligação eterna entre o iniciado e o iniciador, entre o Iyawo e o Babalorixá.  

Durante a feitura o axé da casa recebe o axé do iniciado e o iniciado recebe o axé da casa e do iniciador. No Ketu e nações que similares ou que o copiam essa ligação é viceral, mas isso já não é assim no Jeje porque o processo é diferente, contudo não sei nada de Jeje (o de verdade não essa coisa qualquer que temos aqui no Sudeste).

Não se tira "mão" de gente viva de nossa cabeça. O que uma pessoa faz pulando de uma casa para outra é emplilhar mão em sua cabeça e problemas também.

A primeira quebra de regra que tem ocorrido muito, são as pessoas que tomam decisões apressadas de se iniciar e mudam de casa.  A decisão foi apressada inadequadamente por zeladores despreparados ou pela própria pessoa que decide sem ter informação ou influenciada por informações falsas e erradas ou mesmo por vaidade. Um zelador preparado não deixar isso acontecer, mas, nesse caso já estamos falando do segundo problema.

Mas, a pessoa depois de se iniciar "descobre" de repente que não gosta do zelador, ou que acha a casa é longe ou feia, ou que as demais pessoas da casa são antipáticas e implicam com ela.  Assim, fazem o que acham normal nesse nosso mundo onde todo mundo pode tudo, vão embora para outra casa.

Errado.
Não é assim.  Se tivesse tido o mínimo de orientação iria aprender que isso não se faz, que não é o correto. Teria entendido de fato o que significa ser Iyawo ou o que significa a opção que fez de se iniciar em uma religião iniciática. Ela teria entendido o compromisso que estava assumindo e compreendendo de fato os vínculos eternos que iria estabelecer.

Todo mundo tem uma opinião, claro, baseado naquilo que aprendeu, que viu e viveu. A minha opinião é que uma vez feito esse vínculo ele esta estabelecido. Mudar de casa por um motivo fútil qualquer é apenas trazer problemas para sua vida. Existem motivos fortes que podem obrigar uma pessoa a sair de uma casa, principalmente ligados à relação da pessoa com o zelador e que teham origem em falhas de ética e caráter muito sérias.

Mas as pessoas mudam por motivos fúteis, por não entenderem o que é hierarquia, por não entenderem o que é humildade, por não entenderem que não estão ali para terem vontades. 

Se uma pessoa sai e vai para outra casa eu entenderia que o normal seria primeiro o zelador dessa casa que recebe procurar o da anterior para saber o que aconteceu lá.  Ele deveria apurar os motivos que levou aquela pessoa a abandonar o lugar que escolheu para ser iniciado e onde tanto sacrificios passou. Acho que a vaidade de ser escolhido em detrimento de outra, como se fosse um melhor, é apenas uma coisa que significa burrice, estupidez. Se você não sabe que motivos levaram aquela pessoa a sair da casa anterior como pode presumir que isso não vai ocorrer na sua e você seja o próximo da lista.

Isto além de mais inteligente chama-se ÉTICA e RESPEITO. Não só pelo outro babalorixá como também pela religião. Significa também SERIEDADE.

Garanto que a taxa de movimentação de pessoas entre casas seria muito menor se as pessoas adotassem isso e mais, se verificassem as credenciais da pessoa que estão recebendo, considerando como credenciais se a pessoa tem as obrigações e o tempo que diz ter.

Também, a pessoa que recebe um Iyawo deveria raspá-lo de novo e submetê-lo aos ebós e rituais da sua casa para estabelecer o vículo de axé. Não significa fazer uma pessoa de novo, porque não se nasce 2 vezes, mas, de internalizar a pessoa a nova casa trasformando-o em um igual.

Também se isso fosse adotado, mais ainda reduziria o número de pessoas que trocam de casas.

As pessoas tem que entender que a relação iniciado-iniciador é pautada pela paciência, respeito e continuidade.

Mas nesse ponto podemos também falar da segunda regra que é quebrada que é a de fazer babalorixá e iyalorixá pessoas que não receberam esse cargo, esse Oye. Não se enganem, ser um Babalorixá é para poucos. Muitos serão os iyawo, menos serão os sacerdotes, os egbon, e pouquíssimos serão os Babalorixá e Iyalorixá.
Ter uma cargo não é um decisão pessoal. Ter uma casa ou a sua própria casa não é fruto da sua vontade e disponibilidade de recursos. O divino, Olodumare e os orixás não são burros. Eles sabem as pessoas que tem condições de terem uma casa e iniciarem outros.

As pessoas ignoram isso, seja por desconhecimento ou safadeza mesmo. Elas acham que automaticamente quando ela completar os seus 7 anos elas vão receber o seu Deka e ter a sua própria casa onde poderão fazer o que quiserem.

Errado.

Não é assim. O cargo é dado pelo Orixá e o zelador não deve dar esse direito a quem não o recebeu do divino.

Mas as pessoas são imorais.  Elas pagam para receber esse direito. Elas pagam para recerem obrigações que não tem direito.  Quando percebem que não vão receber esse cargo na casa que estão elas saem da casa, vão para outra e para outra até achar um meliante que de o direito a elas ou finja que dá esse direito.

Algumas são mais práticas, elas simplesmente somem e aparecem com a casa aberta como se tivessem recebido. É muito comum a pessoa se iniciar em uma cidade e abrir casa na outra. Ou tem aquelas que viajam para dar obrigação e voltam com cargo.  Mais comum ainda são as pessoas que se dizem Iyalorixá e não tem nenhum parente de religião conhecido ou por perto.

O arsenal de imoralidades é imenso. A pessoa se move de obrigação em obrigação de lugar em lugar para apagar o seu rastro e história, aliás a história que não tem.

Raros são as pessoa que podem dizer que foram iyawo os 7 anos qie deveriam,  que fizeram todas as suas obrigações, que somente tiveram 1 zelador, que sabem dizer toda a sua ascendência e essa poder ser verificada, ou seja, de pessoas vivas e localizáveis que podem confirmar quem aquela pessoa é.

Lembro que somente depois que a pessoa fez 7 anos é que ela começa a aprender de fato. Somente quando virar um egbon ela  tera a oportunidade de participar de rituais que nunca viu e seu aprendizado ainda vai ser arrastar por anos. Ninguém sai babalorixá ou iyalorixá com 7 anos.

Isso tudo ai deveria ser o normal.  Mas não o é.  Por isso é que eu digo que respeito muito aquelas pessoas que cumprem o que é correto.

Assim uma das grandes fontes dos problemas que existem hoje o qual gente despreparada e sem conhecimento atua como se fosse uma zelador é porque as pessoas não fazem o que é o certo. Somente 1/100 das casas que existem deveriam existir.

Não pode existir uma religião de uma casa por pessoa!

Os conflitos iniciado-iniciado começam com a falta de preparo do iniciador e continuam com a falta de maturidade do iniciado. Os iniciadores deveriam recusar iniciações de pessoas que eles julgassem incapazes de cumprir os seus anos, de se relacionar com  colegas e de se relacionar com ele próprio.

Tenho certeza que as pessoas que tem cargo legítimo, recebido do orixá, sabem fazer isso. As despreparadas não sabem cuidar nem delas mesmas.

domingo, maio 08, 2011

A questão da supervisão sobre a pratica da religião
  
Esse será um tema mais coloquial e menos estruturado do que os diversos textos de conteúdo que publico. Esses dias recebi uma postagem de uma pessoa perguntando se haveria uma forma de controle sobre a prática de religião que permitisse punir o inibir pessoas que enganam, iludem e roubam outras pessoas, como promessas mentirosas, literalmente a pergunta foi 

"Ha alguma instituiçao ou orgao que fiscaliza as praticas de ifa(principalmente) e de umbanda? Digo, caso alguem que tenha o certificado para as praticas, se esse pessoa vier a fazer mau uso, causando fofocas e desavenças ha alguem que pode interceder e fazer com que a pessoa ou deixe de atuar ou se adapte as reais praticas( eu creio que nao se deve prejudicar as pessoas com esses trabalhos e sim ajuda-las) ? 
 
Eu entendo que esta é a dúvida de muitos e existem algumas informações importantes que eu posso adicionar.  Não sou nenhum especialista no assunto e não vou aqui, para o alvio de todos, em discorrer sobre leis e direitos, mas, existem algumas informações e recomendações que podem ser feitas.

A primeira e mais simples é que, NÃO, não existe instituição ou organização religiosa que controle, avalie e puna qualquer atividade de pessoas que se alegam Umbandistas, Candomblecistas, Ifaistas, evangélicos ou qualquer outra estrutura religiosa. A Igreja Católica é uma das poucas instittuições que tem uma estrutura formal de controle e subordinação direta dos seus sacerdotes. Ela possui os ativos, a relação trabalhista e até a representatividade civil e política.

Apesar disso problemas ainda ocorrem, afinal é uma corporação como qualquer outra e tem os seus interesses, mas, se existe um desvio de membros em relação ao interesse da corporação, poderá haver uma intervenção e também sempre haverá o interesse da corporação de preservar sua imagem pública.


Mas poucas religiões são assim organizadas.


No caso da Umbanda, ha muuuuitos anos atrás, nos tempos de Vargas, haviam as federações que exerceram alguma influencia no estado  e controle sobre a prática e as casas. Algum controle,  se diga.  Mas, estamos em outros tempos e naquela época havia uma mão forte do estado Vargas sobre a sociedade civil, atuando através de aparelhos como federações, sindicatos e mais, uma polícia que como sempre, ou talvez mais do que nunca,  servia ao interesse do estado e de poderosos e não ao interesse da população (isso mudou ?).


Mas este período já se foi há muito tempo.  Nem isso existe mais hoje em dia e essas tais federações de Umbanda, que ainda existem por ai, não servem para nada, nada mesmo.  Nem para defender os interesses de seus associados.


No caso de Candomblé, que foi por muito tempo perseguido, muito mais do que Umbanda, esse tipo de controle jamais existiu. Havia apenas a perseguição e o enorme preconceito (muito  bem justificado).


Mas, muitos podem se perguntar, afinal, para que precisamos de controle e supervisão sobre a prática religiosa? Isso não deveria ser uma coisa do Bem?


Deveria, mas praticantes da Umbanda e Candomblé ha muito se dedicam ao Lado negro da religião.  A Comparação com a saga Star Wars é muito adequada. Existia, na saga, a "Força" que era a energia perene que existia no universo (igual ao axé?). Ela podia ser manipulada de 2 maneiras, pelo lado claro e pelo lado obscuro. Os mocinhos usavam o lado claro e os bandidos o lado obscuro.


O lado negro da religião é o dos feitceiros, dos fazedores de feitiços, dos que se preocupam em fazer amarrações, dos que oferecem benefícios e facilidades em troca de dinheiro, dos que vendem obrigações por valores milionários, dos que cobram o salário de um mes da pessoa para fazer um ebó ou limpeza. Enfim, todos aqueles que trocam favores por dinheiro são os representantes do lado obscuro.


Mas este não é um texto sobre ética religião e sim sobre o que você pode fazer para se defender.


Como eu disse, não existe controle sobre essa pratica. O estado não se ocupa disso, não existe regulação para a atividade e as próprias religiões também não se organizam para estabelecer isso. Mas esse problema sempre existiu e sempre houve solução. Não esperem uma solução religiosa, infelizmente não existe unidade ou organização que preserve a ética na religião.


Se alguém se sentir prejudicado com o trabalho de algum sacerdote existem inúmeros instrumentos da sociedade civil que protege a própria sociedade civil.


É importante alertar que liberdade religiosa é um direito pessoal, mas, não implica que qualquer outra lei já existente deixe de ser cumprida em nome dessa liberdade religiosa. Além disso, você pode praticar sua religião em sua casa, mas, se organizar uma reunião tipo um templo, uma igreja, um terreiro, estará submetido às regras normais da prefeitura de sua cidade que regula qualquer atividade, se submetendo aos bombeiros, à saúde pública e ao código de posturas.


Observe que o novo código civil estabeleceu o reconhecimento de 2 coisas, a primeira é a atividade sacerdotal a segunda a atividade do templo religioso. Se a pessoa procurar se ajustar a essas 2 regulamentações, primeiro a pessoal dele como sacerdote e em segundo da sua casa ou organização, estara bem amparado em relação à lei. Mas, se não tiver nem a primeira nem a segunda, vai estar muito exposto.


Vamos a um exemplo, se uma pessoa que decidiu fazer uma feitura, no Candomblé, por exemplo, se aborrecer com o sacerdote, poderá sair do roncó direto para uma delegacia de polícia, registrando queixa de formação de quadrilha, carcere pricadom tortura, maus tratos, pratica de curandeirismo, etc...


De nada vai adiantar o babalorixá ou iyalorixá falar que a pessoa fez por vontade própria. Se ele não estiver regularizado como um sacerdote ela não tem como se justificar e a lei será implacável. Já existem casos de condenação que levou à prisão do sacerdote e de seguidores.


Se alguém fizer o seu orixá e guardar as NFs de compra do material e registrar que deixou esse material  na casa do babalorixá, poderá ir lá com a polícia. Uma pessoa que pague por um ebó ou trabalho e tenha testemunha do que o babalorixá prometeu, caso não tenha resultado poderá processar a pessoa por roubo, estelionato, etc...


A ameaça de ser preso por pratica irregular de medicina, através de acusação de curandeirismo existia e continua a existir.


Pior, acusações podem ser feitas pela família da pessoa, não necessariamente pela própria.


Enfim, no que pese a religião não ter um controle ético, a sociedade civil esta bem protegida. Quem quiser pode requerer os seus direitos e trazer enormes problemas e dificuldades para a outra pessoa.


Devemos considerar que hoje em dia a regra é a pessoa não estar regularizada o que a torna um alvo muito fácil de ações e processos.


Ifá esta submetido aos mesmos problemas, pior, o babalawo deve se preocupar muito com o que diz e promete para a pessoa. Fazer uma consulta é uma coisa simples, mas, fazer ebós e trabalhos para se obter resultados é outra coisa. Em princípio o consulente deveria assinar uma autorização antes de se fazer qualquer ebó nele.