A quantidade de orixás em Cuba
Não é objetivo deste blog falar sobre os Lukumi (santeria) uma vez que falta propriedade, pesquisa e objetivo para isso. Mas, existem alguns aspectos colaterais que podem ser abordados.
Em sequência ao texto sobre orixalização do panteão (não gosto desta palavra, panteão, mas, uso) Yoruba, tenho alguns poucos comentários a fazer sobre os Santeros.
Cubanos apareceram aqui com uma profusão de Orixás em contraponto com os nosso meros 16 e suas qualidades e isso pode impressionar algumas pessoas a caírem no canto da sereia deles. Também misturam tudo com Odù como se fossem especialistas nisso e o mais comum é ver santero falando mais de Odù do que os próprios Babalawo de lá.
Aliás nada mais justo, apesar de os Babalawo cubanos falarem que Ifá em cuba tinha milhares de Babalawo vindos da África e que eles sempre tiveram Ifá, basta gastar 10 minutos de estudo e descobrir que: Somente iam para cuba pessoas muitos jovens (adolescentes); Adesina foi quem primeiro fez a primeira consulta de Ifá; os Lukumi )de orixá) foi quem mandaram alguns cubanos para a África para aprenderem o Ifá, já no século XX; o primeiro tratado cubano de Ifá foi escrito por um Santero, Pedro Arango na década de 50.
E nós, aqui, com nosso culto de Orixá tradicional e quase não falando nada sobre nada.
Em relação a quantidade de Orixás, de fato os cubanos impressionam, como um ilha tão pequena (do tamanho do estado do Rio de Janeiro), com um povo tão pequeno (equivalente a cidade do Rio de janeiro), conseguiu arrumar tanto Orixá assim para cultuar?
As melhores fontes para se falar dos cubanos são eles mesmos.
O índice de analfabetismo entre os cubanos era enorme, não sei hoje, dizem que lá é um paraíso, mas até a década de 50 e e 60, os principais dirigentes do culto Lukumi eram completamente analfabetos, aliás um panorama não muito diferente do nosso. O grupo de letrados na ilha não era grande e dentro da religião deles, bem restrito.
O acesso a informação na ilha estava concentrado em poucas pessoas que mantinham uma biblioteca e acesso a obra de pesquisadores, essas pessoas eram os donos do conhecimento e respeitados pela posição que tinham na sociedade e por saberem ler.
Nesse período houve uma produção de livros e textos assinados por dirigentes Lukumi que nem sabiam ler, isso foi produzido por esses, menos famosos, que usavam o nome dos conhecidos para publicar material.
Nesse período também vários aspectos da teologia dos Lukumi foram incrementados com informações estrangeiras. Foram adicionadas ao culto coisas externas obtidas em livros de pesquisadores. Pelo que entendi faltava bastante coisa la no culto deles....
Um exemplo de uma coisa RUIM, foi o culto de oduduwa, que claramente foi copiado de um livro ruim feito por um pesquisador Evangélico, que ou não entendeu o que viu ou fez de propósito e depois isso foi reproduzido por outros. Oduduwa em cuba esta associado ao obscuro. Isso é uma enorme bobagem, Verger fez essa pesquisa e mostrou isso, eu já escrevi sobre isso aqui.
O erro sobre Oduduwa
Assim como isso ocorreu com Oduduwa que foi incorporado ao conjunto de "orisha" que os cubanos cultuam várias outras coisas foram inseridas tardiamente para "completar" o culto deles e ficar mais consistentes.
Vai dizer que Oduduwa já era cultuado antes? A tá, e ficou igual ao descrito no livro ruim do pesquisador evangélico?
Isso ocorreu aqui? Sim, mas em escala bem menor, visto que temos um conjunto compacto de orixá e, na maior parte da vezes, com finalidade específica de conceituar o que já se fazia e mesmo assim com muita reação.
Observem que os Lukumi tem inclusive uma denominação diferente de "osha" e "orisha". De fato eles pouco se entendem. Vejam 2 fontes:
Fonte 1
"La diferencia entre "Oosha" y "Orisha" es que se le llama "Oosha" a la "Deidad" en su estado de existencia en el comienzo de la "Creacion-Iwade" y cuando esa "Deidad" es coronada en sus "Hijos o Seguidores" en nuestras cabezas se le llama "Orisha", devido que ya esta puesta en nuestra maquina de creacion "La Cabeza" que fue la encargada de Organizar y repartiles las tierras y seguidores a estos."
Fonte 2
Los Orishas son las Entidades o Deidades pertenecientes a La Tierra de Ifá; en tal sentido, queda claramente dicho que esas Entidades o Deidades son las que pueden ser fundamentadas y consagradas por Los Babalawos.
Los Oshas, por consiguiente, son aquellas Entidades o Deidades de la Religión de la Osha, y evidentemente son consagradas por Los Iworos, Iyaloshas y Babaloshas.
Los Oshas son las Entidades que pueden ser “Asentadas” o “Coronadas”, es decir, aquellas entidades que tienen Ceremonia de Kari-Osha o Yoko-Osha.
(observem aqui, a enorme necessidade de separar o que o Babalawo faz e o que o Babalosha faz, isso é uma constante no culto cubano, existe uma separação de mercado lá, a tal "regla" define o que cada um faz e como)
Vejam que com essa confusão toda como é que eles vão chegar aqui e entender e comentar sobre o Candomblé e as demais tradições religiosas afro-brasileiras?
Esse é meu ponto aqui.
Não existe nenhuma condição dessas pessoas falarem sobre o que veem porque lá é tudo diferente. Muito diferente do que é aqui e muito diferente dos Yoruba também. Vejam por exemplo a parte musical. A tradição religiosa afro-cubana seguiu rumos muito próprios dela mesma.
Falta ao cubanos, propriedade, conhecimento e auto-crítica para falar de Candomblé. Eles fazem uma coisa lá que não tem paralelo aqui. O que fazemos de Orixá não é igual ao que eles fazem e entendem. É igual a uma pessoa, aqui, de Umbanda dizer que sabe de Orixá.
Mas isso é apenas um aspecto para destacar que a falta de entendimento vem da inserção tardia disso no culto deles. É muito fácil entender o que ocorreu em Cuba, os cubanos são as melhores fontes para tudo.
Voltando ao início, os cubanos de fato tem um amplo conjunto de "orisha" (já nem sei mais como que dizer).
Contudo, uma pequena parte disso são que eles chamam de orixá de cabeça. Um grande número desses orixá que eles cultuam só aparecem nas mesas (comida) ou em "assentamentos" feitos mas que nunca vão ter resposta de orixá para aquilo. Tipo eles fazem uma sopeira e dizem, pronto, o orixá tal esta aqui (??!?).
Não custa lembrar a todos que a iniciação deles é de 7 dias e que não existem nenhuma necessidade de incorporação de orixá neles, iniciação é iniciação e ponto, aliás isso lá é raro e já vi muito cubano, no início, criticando incorporação aqui, pelo motivo de que as de lá são fajutas, assim eles não acreditam nas daqui.
De fato isso enriquece muito o enorme comércio de assentamentos de orixá que eles tem. Para quem não sabe, como resultado de um jogo os cubanos distribuem assentamentos para todo mundo, é um comércio próspero.
Um autor cubano explica que lá eles sabem fazer bem Iemanjá e Oxossi e o resto que ainda é feito é muito parecido. Uma Iyalorixá que eu conheci e que participou dos quartos de santo cubanos disse que o processo de feitura deles, comparado com o nosso é parcial, eles começam a coisa mas não sabem terminar, vão até uma parte.
Aqui no Candomblé isso tudo é muito diferente, o conjunto de orixá que cultuamos é o que temos os ritos para fazer nas pessoas, alguns orixá foram, sim, transformados em qualidade, mas, mesmo assim tem cuidado muito especial na sua feitura. Essa discussão de orixá é qualidade é idiota, nada acrescenta.
Veja o exemplo a Aganju, aqui uma qualidade de Xangô, lá um orixá diferente, associados a vulcões. É não tem nenhum vulcão perto de Cuba. La na região Yoruba também não tem nenhum vulcão, assim, quem afinal criou um orixá associado a uma coisa que nunca viu ???
No Candomblé, os orixás que não temos "folha" para fazer perdem a nossa atenção, viram um referência e nós aqui não distribuímos assentamentos para ninguém, orixá aqui é em casa de orixá e se é orixá tem que virar e ser testado.
Dessa maneira essa é a diferença fundamental, eles lá inseriram orixá para colocar em mesa e vender assentamento, aqui a gente não vê sentido nisso, orixá é aquele que se faz na cabeça dos iniciados e se não temos a folha para fazer não vira culto.
Não se impressionem com essa diferença da quantidade de orixá, isso não significa qualidade.
E, mais importante, lá é muito, mas muito diferente daqui. Não vejo como um cubano entender o que ocorre no Candomblé.
Acho o culto afro-cubano bem bacana, aprendi coisas bastante interessantes com eles e o culto deles é bastante integrado a história deles e ao povo de lá, os cubanos, mas, sem nenhuma referência possível com o que fazemos aqui.
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