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quinta-feira, janeiro 03, 2013

Serão os Orixá (Òrìṣà) elementos da natureza ?


Serão os Orixá (Òrìṣà) elementos da natureza ?

Parte 2 de 4


A ORIGEM DO PROBLEMA NO SINCRETISMO RELIGIOSO


Uma das principais fontes para essa interpretação é o sempre danoso sincretismo religioso. É assim, as pessoas não querem pensar, não querem estudar, não querem entender, então simplificam comparando com alguma coisa que conhecem.
 

Este capítulo aqui é um pouco extenso e denso em informações, mas, é muito importante para entenderem de onde veio alguns preconceitos sobre a religião Yoruba.
 

Podem acreditar que, não existe nada que eu tenha lido ou ouvido, de autentico da religião, e quando digo isso me refiro a versos de Ifá, que remeta a ligação de òrìṣà (orixá) como sendo um elemento da natureza.
 

Vou me explicar adiante quando falar diretamente sobre isso, mas uma das origens disso, sem dúvida é o sincretismo, mal feito, com as tradições pagans da Europa, em geral, incluindo a Grécia, religiões politeístas, na qual o panteão dos deuses dessas tradições era associado com comportamento, especialidades e elementos. A própria palavra “panteão” que, hoje em dia, é ainda largamente usada para o caso Yorùbá é uma palavra que se aplica a religiões politeísticas, o que não é o caso da religião Yorùbá.
 

Estas religiões, de fato politeístas, tinham uma característica comum que era a de dedicar cada um dos seus deuses a uma especialidade. Isto era necessário porque os deuses representavam o mundo que viviam e não uma divindade transcendente. Nas tradições politeístas, não existe uma divindade maior que origina ou controla o todo com poder superior às demais, cada divindade ou deus tinha que ser responsável por um aspecto do universo. Assim a unidade era na verdade formada pelo conjunto de todos.
 

Essas religiões ou cultos criavam uma divinização que representava o mundo em que viviam. De uma maneira bem lúdica, o mundo era o divino e assim cada coisa dele ao invés de ter uma ordenação natural ou científica era regido pela vontade de um deus. Este modelo onírico substituía a ciência na explicação dos fatos que nos cercavam e requeria bastante trabalho das pessoas no culto a muitas divindades para terem uma vida tranquila. Você tinha que agradar a um exército de deuses para evitar problemas, uma vez que você não tinha um protetor próprio nem uma hierarquia, qualquer deus, uma força da natureza poderia interferir no ambiente, inclusive contrariando outro.
 

Isso fazia da vida das pessoas uma coisa muito trabalhosa, ainda mais porque a natureza era bastante imprevisível. Dessam forma poderia sempre haver um deus-natureza insatisfeito ou ofendido com qualquer coisa e trazendo prejuízos a você ou a sua comunidade. Não é a toa que esse modelo foi facilmente superado pelo modelo das religiões atuais, com um divino unificado e transcendente.
 

O poder dos deus-natureza era dividido e não havia preponderância de uma divindade sobre a outra, exatamente como na natureza, onde uma força conflita com outra. Uma poderia fazer ou desfazer o que outra fez e o homem devia prestar algum tributo a todas se quisesse ter paz na sua vida. O modelo também não integrava o homem ao divino.
 

Este é o modo da natureza, as forças se equilibram pela harmonia ou pelo conflito. Claro que a existência de cada deus estava associado a necessidade de alguém controlar alguma coisa e por isso a necessidade de muitos deuses. O sentido da palavra panteão, que é usado incorretamente para a religião Yoruba, é este, esta vasto conjunto de deuses controladores da ordem.
 

Este modelo de religião, politeísta, bastante ancestral e lúdico, é bastante ultrapassado no contexto da civilização humana, tanto que foi abandonado sendo trocado não por uma religião em especial mas por muitas outras que ofereceram um modelo muito mais humanista, centrado na figura do homem.
 

O modelo politeísta é superficialmente conhecido por todos. As pessoas de fato não entendem as suas implicações. Conhecem suas histórias e narrativas mas não se aprofundam de fato na questão da relação divino-homem. Por esta razão não compreendem porque ele não se aplica religião Yorùbá.
 

Existe também a simplificação que as pessoas fazem sobre o conhecimento. O mundo é complexo, são muitas forças atuando, pensamentos diferentes, filosofias conflitantes ou complementares. Entender o meio que vivemos, sejam as pessoas ou a sociedade é bastante complexo. Contudo as pessoas fingem que são inteligentes e buscam simplificações para que possam se passar como cultas. 

A maior parte das pessoas só consegue lidar com conceitos binários ou ternários e dessa forma fazem uma similaridade estúpida de uma religião com outras baseada em 2 ou 3 características. Infelizmente as coisas são mais complexas que isso e é muito reduzido a quantidade de pessoas que consegue trabalhar com modelos conceituais e filosóficos.
 

Classificar a religião Yorùbá dentro deste modelo, politeísta, somente porque existem muitas divindade (e não apenas uma) e entender que essas divindades são forças da natureza porque a religião é exercida na natureza, é desprezar a sua complexidade e atualidade.
 

Claro que algumas coisas, além da ignorância e da preguiça mental aceleraram esse sincretismo da religião Yoruba com as antigas correntes politeístas. Na África eles observavam o povo colocando oferendas em pedras, árvores ou em rios, e conduzindo ritos em rios, morros e florestas. Então, a conclusão de muitos foi bastante óbvia, esses africanos cultuam pedras e rios..... As divindades que eram homenageadas ficaram então associadas com aqueles elementos ou como se fossem os deuses-natureza. 

Poucos se deram ao trabalho de fato de entender porque aquilo era feito e qual o significado daquilo. Somem nisso o desprezo por uma sociedade tribal e a impossibilidade de entender uma língua estranha. Junte isso ainda ao uso de métodos e ética científica inadequada e teremos como resultado o que foi feito. Simples e ao mesmo tempo bastante estúpido. Isso levou os europeus a taxarem as religiões de animistas e de politeístas.
Mas, estamos no século XXI e não mais no século XIX.


Como eu tenho repetido é uma forma de preconceito com o povo e a sociedade africana, desprezando a sua capacidade de gerar uma religião equivalente às demais ocidentais e orientais. O modelo politeísta dos deuses-forças-da-natureza, não se aplica a religião Yorùbá.

7 comentários:

  1. Grande anseio em ler as partes 3 e 4, saudações!

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  2. Muito bom compreender melhor a cosmogonia Yurubá. Mas ainda há um conceito que gostaria de entender melhor: Orí. Há diversas informações em seus textos (já li todos), mas seria tão bom um texto só para explicar o que é Orí. Não consigo achar uma explicação clara! Ajude-nos! rsrs

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    1. E se puder indicar livros seria ótimo, pois quando digo não encontrar explicação clara, não falo do blog, quero dizer que não encontro em lugar nenhum e ninguém sabe explicar.

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    2. Ricardo,

      Irei nesta sequência publicar sobre a cosmogonia Yoruba. concordo com você, Faltam referências.

      Vou publicar a cosmogonia em partes. A primeira que estou terminando para seguir esta publicação diz respeito ao cosmo, mas não vai incluir o conceito de Ori, cobrirá as divindades e os espaços.

      Ori gasta um pouco mais de tempo e é o aspecto mais importante da religião porque coloca o homem no centro e implica nos conceitos de objetivo de vida, prosperidade, morte, renascimento e oráculo. Não adianta fazer uma coisa idiota com uma definição singela sem utilidade de Ori sem explicar o contexto do homem na religião. É nisso que Ori se enquandra.

      os Yoruba usavam a mesma palavra para definir muitas coisas. Por exemplo, axé, tem vários usos. Ifá tem uns 5 usos distintos. O mesmo ocorre com ori. Além de se referir a nossa herança genética-espritual também envolve a divindade protetora. Muitos autores nem usam ori para isso chamam de Guardião e protetor, ou algo assim.

      A gente chega lá. O cosmo já vai ser um grande passo. Estava revendo a bibliografia, mas ela não ajuda muito. contudo o livro do Jose Beniste, Orun Aiye é muito bom para isso.

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  3. Anônimo16:36:00

    Ola Marcos,

    feliz ano novo, muita saúde e alegria.

    Esta essa série esta bem bacana, parabéns.

    Tem uma frase que você escreveu que ao meu ver é o principal problema das pessoas que lidam ou tentam entender/estudar a religião Yoruba "A maior parte das pessoas só consegue lidar com conceitos binários ou ternários".

    Abraços, Anderson.

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  4. rsrsrs Anderson é isso ai!

    Todo mundo quer simplificar tudo a uma visão maniqueísta das coisas e é muito mais complexo. Para quem sabe ingles vou passar um link abaixo de um site que fala de religião. Hoje ela já esta bem mais complexo e completo e por ele a gente entende como é complicado comparar religiões.

    http://www.religioustolerance.org/relcomp.htm

    veja que existem várias dimensões para se comparar.

    No link a seguir uma visão mais simplificada

    http://www.religioustolerance.org/comp_rel.htm

    Eu gostaria de chamar a atenção para o seguinte pedaço que esta nesta página, eu não tinha visto isso antes, mas bate extamento com o que eu tenho escrito:

    Original:

    Monotheism: The belief in a single God. Examples include Islam, Judaism, and Sikhism). Within Christianity, most denominations consider themselves to be monotheistic, even though they teach the existence of three separate persons in the Trinity. Some believe that religiously inspired violence is often found among monotheists.

    Traduzido:

    Monoteísmo: A crença em um Deus único. Exemplos incluem o islamismo, o judaísmo, e sikhismo). Dentro do Cristianismo, a maioria das denominações consideram-se monoteístas, mesmo que eles declarem a crença existência de três pessoas distintas na Trindade. Alguns acreditam que a violência de inspiração religiosa é freqüentemente encontrada entre monoteístas.


    Eu creio, que a invenção da trindade foi no primeiro concílio cristão o de Nicéia, patrocinado pelo Constantino e onde surgiu a trindade como uma solução para a divinização de cristo. Isso resolveu um problema e criou outros. Os protestantes, judeus e mulçumanos não veem assim. Da mesma forma os santos da igreja são nada mais nada menos de que um culto a ancestres. Enfim, trindade, santos e anjos, tornam o catolicismo uma religião muita mais próxima de outras.

    Mas fica claro pelo próprio site que monoteista é somente as abraamicas. Assim a pergunta se é monoteista ou politeista é claramente idiota e tem finalidade de externar um preconceito. Respondam sempre que é monoteista, porque se o catolicismo é monoteista qualquer outra pode ser.


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    Respostas
    1. Anônimo21:44:00

      mas, prestarao atencao no comentario: ... alguns acreditam que a violencia de inspiracao religiosa e frequentemente encontrada entre os monoteistas, ou seja os abraamicos

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