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domingo, janeiro 05, 2020

A Ligação entre Ifá e o Culto de orixá (Òrìṣà)



A Ligação entre Ifá e o Culto de orixá (Òrìṣà)



A primeira informação importante para todos é que Ifá não está dissociado do culto de orixá (Òrìṣà). 
 

Isso foi uma constatação muito interessante e motivante para mim. Ifá é um culto distinto e que pertence a mesma religião (Yoruba) que tem um culto de Orixá. Aliás, a gente vai encontrar na religião Yoruba 3 cultos: o de Orixá, o de Ifá e o de Egungun.


São cultos distintos porque tem foco em divindades diferentes, tem liturgias distintas e tem objetivos complementares, mas, fazem parte da mesma religião, compartilham as mesmas divindades e a mesma teogonia. São separados mas vejo-os fazendo parte de um todo.


Não me perguntem como Ifá se integra com o culto do Candomblé Jeje - Não sei. Quando a pessoa vai a Ifá ela vai na religião Yorùbá, desta forma Ifá esta ligado às tradições religiosas com origem na raiz religiosa yorùbá. Aqui no Brasil temos o Candomblé Ketu, o Batuque e o Xangô (Ṣàngó).


O Candomblé Jeje representa uma outra religião dentro do Candomblé e um culto com divindades diferentes. O jeje tem Vodun e a religião Yorùbá tem Orixá. Conheço muito pouco desta religião, mas, o pouco que conheço me faz recusar esta abordagem medíocre que faz correlação de 1:1 entre Orixá e Vodun. Não concordo que isso seja assim as raízes religiosas são bem distintas.


Ifá é um oráculo Yorùbá. Está ligado a uma teogonia Yorùbá, a uma teologia Yorùbá e a divindades Yorùbá. Tudo em Ifá gira em torno de orixá e da teogonia Yorùbá que é diferente da teogonia do Jeje. Quem no Candomblé é de uma nação Yorùbá, se vira com facilidade, o pessoal de Jeje não sei como faz.


Isso significa que a pessoa de Candomblé Jeje não pode ir a Ifá?


Claro que pode, Ifá apesar de estar ligado a uma religião pode ser usado para todas as pessoas da face da terra independente da religião que elas tenham. Ifá não é um oráculo litúrgico, é um oráculo para tratar da vida das pessoas.


Além disso, Ifá não trata de orixá (Òrìṣà), ele trata da pessoa.


Se a pessoa é de Jeje, apenas saiba que vai sair de lá com indicação de coisas para fazer no contexto Yorùbá e de suas divindades. Apesar de Ifá ser independente do culto de Orixá (Òrìṣà), a maior parte das coisas que faz é através da intersecção dos orixá (Òrìṣà).


Se isso não for problema para ele, então não existe problema. Como estou falando aqui de ecumenização, ou seja, de integração de cultos, no caso do Candomblé temos que ter atenção na raiz da religião.


Claro que a maior parte das pessoas que conheço ou situações que vi indicam que isso não é problema. O que mais tem é “Doté de orixá” e casa de jeje que toca ketu e só faz orixá Yorùbá ou faz Vodun como se fosse orixá, só troca o nome. Raro é uma casa que seja Jeje, essa ortodoxia existe mais na nossa cabeça o mundo real é uma bagunça.


Se o Doté ou Doné já é de orixá então o resto todo também o será. A coisa começa da raiz, se a raiz começa com Orixá porque o resto será diferente?


Assim essa designação de Candomblé tem pouco sentido para muita gente sem conhecimento. Para eles é tudo igual.


Usando uma expressão que ouvi e gostei, o que temos mais e mais, é o Candomblé popular, não é o Candomblé de nação. As pessoas praticam de qualquer jeito e de qualquer forma. Raros são aqueles preocupados com religião e culto, preocupados com nação e ortodoxia, preocupados em dar consistência no papel da religião na vida das pessoas.


O Candomblé popular é aquele que acontece. As pessoas fazem e ganham dinheiro com ele.


Para aqueles que pensam que isso é um problema dos tempos modernos, não é, pelo contrário, os tempos modernos só melhoraram o Candomblé. A divulgação de informação, a facilidade de reconhecer erros, a penetração em uma camada da população mais preocupada em ter uma religião do que ganhar dinheiro com ela e a rejeição do modelo de submissão do candomblé, mudaram para melhor a qualidade do Candomblé.

A perda de conhecimento que o Candomblé teve em sua prática hermética e em guetos era fruto de pessoas com poucos valores e ética, que se preocupavam somente com elas e mais nada. 

Tem gente que adora enaltecer, sem senso crítico, os "meus mais velhos", isso é uma moda no Candomblé, coisa da boca para fora, para platéia, mas nessas pessoas estão a origem de atitudes e práticas ruins. É falha a afirmação que antigamente o Candomblé era bom ou melhor. O Candomblé melhorou multo.

O ganho de qualidade, ética e moral do Candomblé tem sido muito grande e o salvou. Claro que todo crescimento e evolução tem seus defeitos e problemas, mas cada vez a gente tem coisas menos séria ou escandalosas para lidar. A transparência e o acesso à informação mudam tudo para o bem.

Ha muito tempo que já deixei de lado essa posição ingênua de que os "antigos" é que faziam certo. Coisa nenhuma, como eu disse, não sejamos ingênuo. Claro que até podiam entender muita coisa que não sabemos hoje (isso é uma ilação), como também desconhecer muitas coisas que sabemos hoje (isso é uma afirmação).

Sua incapacidade em preservar a religião é que levou a perda. Não tenho dúvida que essa mesma herança histórica comportamental foi a que expulsou o culto de orixá da África. A diáspora negra foi uma solução e não um problema. Ela permitiu que os Orixá se preservassem, porque se dependessem dos africanos já teriam acabado.

Essa herança cultural, histórica étnica é que fez com que eles não preservassem sua religião e continuassem submetidos e escravizados apesar do absurdo número de africanos no Brasil. Em lugares com uma proporção de 10 escravos para 1 branco, como que tudo ficava sem mudança? Eles, os negros, estavam mais preocupados em se dar bem, em se libertar e também ter escravos do que mudar algo. Essa história é pouco contada mas é real.

O Candomblé do início do século refletia o mesmo. Desunião e feudalismo.Uma casa de Candomblé era uma estrutura feudal, com um rei ou rainha declarado e os seguidores que deviam seguir o que ele falava sem piscar o olho.

Como menciona Parés no seu livro sobre a formação do Candomblé no Brasil, entre se submeter a uma casa de Candomblé, e ser uma escravo do dirigente e ir para uma irmandade católica e enfrentar algum preconceito mas pelo menos a possibilidade de inserção na sociedade, a maior parte preferiu o caminho da irmandade, senão o Candomblé seria a maior religião no país.

Alguém já pensou nisso? A população de negros era algumas vezes a de brancos, se os negros libertos optassem por sua religião o Candomblé seria a maior religião do Brasil.

Se o Candomblé não foi a religião de escolha é porque ele tinha e tem problemas viscerais sérios, mas, sem dúvida a necessidade de se estabelecer na sociedade fez os libertos procurarem a religião da sociedade e não manter sua exclusão ao adotar uma religião distinta. Claramente não buscaram a confrontação, mas, eu seria muito ingênuo em desconsiderar a falta de estrutura e a qualidade das relações no Candomblé.

Voltando ao tema principal, em ifá existem liturgias próprias de Ifá e que não encontraremos no culto de orixá. O Bàbáláwo trabalha de uma forma distinta do Babalorixá (Bàbálórìṣà), contudo, Ifá se apoia ou mesmo depende fortemente do culto de Orixá.


Sim, Ifá é o oráculo de Órunmila (Ọ̀rúnmìlà), mas o que ocorre em nossas vidas, a ação, passa por Ori e principalmente por Orixá. Orixá é a divindade que influencia nossa vida de forma positiva e é quem nos socorre como resultado da consulta a Ifá. Órunmila (Ọ̀rúnmìlà) não está dissociado dos demais Orixá (Òrìṣà), ele é o Oráculo, mas nossa vida ainda é orientada diretamente pelos Orixá (Òrìṣà).


A ação do Oráculo na nossa vida se inicia com Órunmila (Ọ̀rúnmìlà) e Exú (Èṣù), mas continua e se manifesta com os Orixá (Òrìṣà). Isso está no odu Oseotuwa. São os orixá os principais motores da nossa transformação e socorro. O Oráculo como intermediário e instrumento de diagnóstico determina ações que serão suportadas por Orixá e egungun.

Esta é a religião Yoruba. Esta é a teogonia. Assim, Ifá não é isolado ou independente ele se integra aos demais cultos de forma bastante natural.

Minha posição é que o nosso dia a dia pertence a nossa relação com Orixá (Òrìṣà). Ifá não pertence ao nosso dia a dia, não pertence ao dia a dia de ninguém. O culto das pessoas, o culto importante é o culto de Orixá (Òrìṣà).


Claro que o Babalawo tem uma forma própria de fazer o que precisa com seus Odù e Opon, mas algumas coisas podem ser ditas:


— existem situações de oráculo que indicam diretamente ou por bom senso que o consulente deve procurar o culto de orixá;


— a maior parte das oferendas à orixá pode ser feita da forma como a pessoa já faz no culto de orixá.


O acesso aos Orixá é determinado quando se especifica o ebó ou oferenda que é necessário. Não lembro se já falei aqui sobre a anatomia de uma consulta a Ifá, creio que sim. Após determinar o Odù que traz a mensagem a pessoa, o Bàbáláwo determina qual o ebó que será necessário para fazer aquilo se manifestar na vida da pessoa.


Nesta fase da consulta podem ser determinados ebó de Ifá com tabuleiros, cerimônias específicas de Ifá e as oferendas a Orixá. Sim, no caso da rama cubana o Bàbáláwo sempre determina que orixá esta respondendo em socorro aquela pessoa. Isso não é nada diferente do que um babalorixá faz no seu culto de orixá com o merindinlogun.

Nesta etapa é determinado o que o Orixá precisa para ajudar a pessoa. O que quer que seja oferecido ao Orixá se torna uma oferenda a orixá e não mais importa como será feita. 

O Bàbáláwo pode fazer da forma como sabe, mas o consulente, se for de um culto de Orixá e souber o que fazer, também pode fazer a sua maneira ou de qualquer maneira que se chegue ao orixá. É aqui que entra o culto de orixá.

Os Bàbáláwos cubanos vão fazer isso da forma como aprenderam, seja em Ifá ou na Santeria, não tem problema nisso. Mas não pode haver qualquer tipo de objeção aos brasileiros poderem fazer isso da forma como aprenderam no seu culto de Orixá ou através de uma casa de Orixá.

O divino é o mesmo. Você pode através de cada religião e culto aprender formas distintas de atingir ao divino. Essa é a função da religião. Os cubanos aprenderam de uma forma e farão como sabem. Os brasileiros dos diversos cultos de Orixá podem ter alternativas a estas formas.

Mas aquele que diz, como já ouvi, que a forma se fazer uma oferenda para um determinado Orixá é somente do jeito dele representa a voz do ignorante. Pior um pouco, não respeita a sua religião ou não entende que faz parte de uma única religião.

Estou usando aqui a referência dos cubanos mas isso vale para os nigerianos e seus filhotes de criação brasileiros. É a mesma coisa.

Dessa maneira, consolidando o que eu já disse: Ifá pode ser usado por qualquer pessoa independente da religião. Ifá é religião e faz parte de uma religião. Não existe consulta em Ifá que não resulte em uma oferenda a algum orixá (Òrìṣà) como caminho para socorrer aquela pessoa. 

É totalmente sem sentido a afirmação de que Ifá não é religião ou que seja independente do culto de orixá (Òrìṣà). É religião, apesar de poder ser aplicado a qualquer pessoas, deus esta para todos e não para apenas um conjunto de gente selecionada.


Além disso, existe muita coisa que de forma real é resolvida através de um Bori ou de liturgias ligadas a Ori. Antecipo em dizer que meu entendimento e relação com Ori é bem calma e equilibrada, tem gente que só fala de Ori e diz que tudo é Orí, mas, essas pessoas que assim falam entendem pouco da teologia. Tem muita coisa importante e muitos caminhos, Ori é um deles para determinadas situações.

Mas se você precisa fazer algo através desse caminho, lamento, só vai ter no culto de Orixá, aliás, só vai ter no Candomblé. Esqueça os cubanos, esqueça santeria e esqueça Ifá. Não sabem nada, não entendem e não sabem fazer.

O Bori feito através de Ifá é muito ruim, vergonhoso mesmo. Mal feito, mal elaborado e inefetivo, um placebo. Foi uma invenção dos cubanos que nem sabiam o que era Ori.Ja passei por isso e já participei de vários. Muito ruim, atualmente, não me chamem para isso, não vou.

Tem muito Bàbáláwo obtuso que fala aos 4 cantos que Ifá não é religião, mas, esse mesmo Bàbáláwo entende que orixá (Òrìṣà) é? Se entende então eu lembro que quase sempre Ifá passa por Orixá (Òrìṣà).

Apesar de ser religioso e de passar por orixá (Òrìṣà) como instrumento de manipulação do divino, do supernatural ligado ao divino, Ifá não muda sua religião. Você pode ser de qualquer religião, se consultar em Ifá, fazer ebó (Ẹbọ) e continuar na sua religião e na sua vida. Ifá não é proselitista.

Ifá não trata da vida religiosa de iniciados. Você pode ser de uma casa Jeje, Ketu ou Batuque e ir a Ifá. Você deve tratar coisas da sua vida. Para tratar questões de sua formação religiosa procure uma casa de orixá (Òrìṣà). Não traga para Ifá suas questões religiosas porque é inadequado e impróprio um Bàbáláwo tratar disso.

O Bàbáláwo é autônoma para fazer oferendas a orixá (Òrìṣà), ele não depende do culto de orixá (Òrìṣà) mas ele não deve se inserir em questões religiosas para as quais não tem conhecimento, formação e muito menos propriedade para falar. Se fizer isso só vai causar problema para ele e para a pessoa.

É muito ético um Bàbáláwo que recebe uma pessoa já iniciada em orixá (Òrìṣà) indicar que a pessoa procure sua casa para fazer as coias de orixá (Òrìṣà) que a consulta recomenda.

Se o Bàbáláwo fizer ele não cometerá nenhuma violação ética, mas ele não deve ser intrusivo, se ele não sabe o que pode ou não fazer com um iniciado então não faça nada.
Uma casa de ifá, um Bàbáláwo deveria ter ligação com uma ou mais casas de Candomblé, isso seria útil para ele para poder indicar pessoas.

Em relação aos 2 cultos, as casas de Candomblé não precisam de Ifá para seus trabalhos, o Candomblé tem seu oráculo, mas, todos sabemos que nem todo Babalorixá (Bàbálórìṣà) ou Iyalorixá (Ìyálòrìṣà) é fluente no uso do oráculo, assim, uma casa de Orixá (Òrìṣà) poderia, sim, contar com a ajuda de um Bàbáláwo para uso do oráculo, não junto a clientes, mas auxiliando o dirigente.


Não se trata de o Bàbáláwo ensinar algo ao Babalorixá (Bàbálórìṣà) ou mesmo de corrigir coisas que ele faz ou indicar coisas diferentes, trata-se do Bàbáláwo fazer apenas aquilo que ele sabe fazer que é usar o oráculo.


Alguns podem estranhar eu dizer isso do Bàbáláwo, mas, é isso mesmo. O que o Bàbáláwo sabe fazer é usar um oráculo, esse é o único trabalho e missão dele. Ele usa o oráculo com mestria e executa os ebós e oferendas indicados. É isso o que um Bàbáláwo faz, mais nada, o resto se houver é invenção.

Se a pessoa quer mais e acha que apenas cuidar do oráculo é pouca coisa, então esta no culto errado. O Bàbáláwo faz apenas isso e, minha opinião é que já é o suficiente para uma vida,.


Usar um oráculo para ajudar pessoa é muito difícil. Você tem que aprender muita coisa, mas muita coisa mesmo. O Bàbáláwo só faz isso, aprender com interpretar o oráculo e como resolver o problema das pessoas. Bàbáláwo que está interessado em fazer mais do que isso é apenas um comerciante vendendo bugiganga e placebos.

O que ocorre é que tem um exército de Bàbáláwo que não conhece os versos de Ifá, que não conhece teologia yoruba, que não conhece folha. Essas pessoas decoram tratados e saem repetindo as interpretações (ruins) já feitas. Para essas de fato, só cuidar de oráculo será pouco, vai acabar logo o que fazer.







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