O que é a sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́)?
É um culto de unificação social e familiar, não divide pessoas, uni gêneros e cultos, não promove privilégios. Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) busca a solução dos problemas pela paz, amor e entendimento. Não promove conflitos, busca dissuadir e mudar para obter a solução.
É um unificar social, cria um ambiente de convivência para membros da família e comunidade, adultos e crianças, homens e mulheres. Ele pune o sagrado e o profano, o temporal como atemporal, o místico e o histórico.
Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) inspira a maternidade, incentiva a colaboração de gêneros, encoraja membros da comunidade a interagirem para minimizar os incidentes e o mal na sociedade humana.
Sua face mais conhecida é o festival público, vespertino e noturno que dura de 3 a 7 dias e conta com os famosos dançarinos mascarados. Realizar festivais é uma das estratégias importantes da prática da religião na religião yorùbá, porque envolve a religião abertamente com a comunidade.
A sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) é aberta a toda a sociedade participar, devido ao seu objetivo de promover a paz e o bem estar social. Pessoas de todos os cultos de Orixá (Òrìṣà) participam e os festivais são tolerados por cristãos e muçulmanos.
É um culto muito popular entre as mulheres, devido o tipo de problema que propõe a resolver, mas, homens também recorrem e participam do culto. As mulheres procuram fertilidade, os homens virilidade.
Não existe incorporação ou segredo. Os dançarinos dançam e são reconhecidos, as máscaras não escondem o rosto (diferente de Egúngún).
Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) é uma abordagem de amor e boas intenções e é bem diferente do caráter punitivo do culto de Oró.
A busca da Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) é pelo ìrẹ́pọ – harmonia social. O foco e no convencimento e não na punição.
1. Montar um local e oferenda para aplacar Ìyá Nlá
2. Dança e música para entreter o público e aplacar ajé (Àjẹ́).
A base da sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) é definida por algumas palavras importantes de significa complexo.
Ifọgbọ́ntaayéṣe
Estratégias sociais para promover paz, felicidade e união
Para isso depende de amor, tolerância e justiça, a religião que que tenhamos Ìwà.
O importante para a sociedade é a união: Àṣùwàdà
Uma das práticas da sociedade é o que eles chamam de Àyájọ́ Àṣùwàdà, que significa um encantamento coletivo para proteger a comunidade. Toas as coisas vivas vivem em comunidade, as formigas, os elefantes, as algas, as baleias, as plantas e árvores. A comunidade é a substância da bondade.
O indivíduo é importante, é a unidade da vida social, mas é parte de um todo e necessita estar junto de outros para se sentir inteiro e completo.
Existe através de Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) a orientação para cooperação entre jovens e velhos. Todos os membros da comunidade têm suas responsabilidades e a necessidade de respeito mútuo e cooperação. Ninguém é auto-suficiente.
Todos têm que cultivar as virtudes de:
· Confiança
· Caráter
· Coragem
· Moderação
· Precaução
· Perseverança
· Tolerância.
Aqueles que se desviam das normas ou código moral são punidos com
· multas
· ostracismo
· ridículo público
· castigos
Mas, o envolvimento feminino inicia através da divindade que é e referência nesse culto que é Ìyá Nlá, mas, alguns comentários importantes.
Na região yorùbá existem muitos mascarados e muito pouco padronização. Tudo lá é muito regional, considerando regiões pequenas, inclusive. O espalhamento horizontal gera bastante variação da mesma coisa, de forma que, ao analisar a questão Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) vamos esbarrar com vários modelos e mitos distintos e especializados. Em cada região ou cidade as coisas mudam. Assim, tratarei aqui do que é bem comum a tudo.
Voltando a divindade principal ela é Ìyá Nlá. Identificada também como Ilẹ̀, a terra, a mãe terra que representa o poder feminino, sua energia fundamental. Isso é muito interessante porque mostra também na religião yorùbá essa identificação da terra como uma divindade. Estamos tão acostumados a apenas lidar com Orixá (Òrìṣà) que acabamos esquecendo de outras divindades não Orixá (Òrìṣà), os inrumolé (Irúnmọlẹ̀). Ilẹ̀ é um inrumolé (Irúnmọlẹ̀), não é um Orixá (Òrìṣà).
Chamo a atenção sobre esse culto a terra porque isso está em muitas religiões não cristãs. A religião yorùbá tem muitas divindades Orixá (Òrìṣà), todos sabemos disso, são dezenas ou centenas. Conforme eu já comentei, a quantidade de Orixá (Òrìṣà) ou quem são não é relevante, o aspecto regional pesa muito e orixás mudam de nome ou surgem novos. Repito, quem ou quantos, não importa, o que importa é que Olódùmarè sempre coloca um Orixá (Òrìṣà) para nos cuidar, os Orixá (Òrìṣà) são seu vínculo com nós e vice-versa.
Mas aqui na sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) e Ògbóni surge, finalmente a importância da terra como um grande espírito.
Ìyá Nlá é Ilẹ̀, a terra, a mãe terra e como a terra é da criação do mundo é a energia fundamental feminina. A terra é a mãe principal, a mãe primordial, que alimenta os homens e a sociedade. Ela é a mãe generosa.
Mas, vamos relembrar um conceito importante do cosmo Yorùbá que é a dinâmica da interação entre opostos, assim na teologia temos Céu e terra, dia e noite, homem e mulher, corpo e alma, vida e morte.
De acordo com a teologia, o mundo físico evolui entre o bem e o mal.
No seu aspecto sombrio, a grande mãe Ògbóni, Ilẹ̀ se torna irascível e traz a morte a seus filhos. Nesse aspecto sombrio Ilẹ̀ vira Ọ̀gẹ́rẹ́. Temos acima visão ambivalente da sociedade frente a terra:
ile x Ọ̀gẹ́rẹ́
Isso é o potencial explosivo da relação homem-mulher em uma sociedade masculina a necessidade de exercer a diplomacia.
As sociedades Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) e Ògbóni se revestem dos mesmos objetivos, mas de forma um pouco distintas. Mas em qualquer caso, ambas as sociedades, com instrumentos um pouco diferente e objetivos taambém, querem:
Pacificação e equilíbrio do espírito feminino
A sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) surge da visão Ògbóni de que todos somos Ọmọ Ìyá, filhos da mesma mãe. A sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) tem o objetivo de sensibilizar a mãe natureza, Ìyá Nlá, para os problemas dos filhos desta, atraindo assim sua responsabilidade maternal.
Nos grandes festivais que duram de 3 a 7 dias e antes do qual são realizados o festival do Orixá (Òrìṣà) Yewájọbí da região associado ao festival.
Os festivais são bastante regionalizados, mas, eles tem em comum:
· Ìyá Nlá
· aplacar ajé (Àjẹ́)
· Orixá (Òrìṣà) Ọlọmọwẹ́wẹ́
· Àbíkú
· Mascaras
· Òjá
· Tornozeleiras
· Homens vestidos de mulher
Tudo isso é compatível com as descrições que temos nos versos dos Odù de Ifá.
Assim a divindade base da sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) é o poder feminino, representado por Ìyá Nlá, a mãe de todos, a terra primordia, a provedora, mas acima de tudo a mãe a energia feminina. A ambivalência faz com que essa energia feminina se manifeste de duas faces, a sombria, ou cobradora de atitudes e comportamento e a face doce de mãe protetora.
Ilẹ̀ vira Ọ̀gẹ́rẹ́, mas, mais uma vez, não se preocupem com nomes e em decorar nada e em imaginar que tem mais uma divindade, eu já expliquei sobre isso, a quantidade de divindades que existem é irrelevante, a cosmogonia existe para entendermos o conjunto.
O poder feminino pode se tornar agressivo sobre nós, mais uma vez, Ifá é a referência, os versos de osá (Ọ̀sá) Méjì explicam isso para o Bàbáláwo. Odù, com o beneplácito de Olódùmarè se torna aquela que tira o que deu, manifestando assim o mal teológico na religião.
Ajé (Àjẹ́) é assim, a manifestação do poder feminino em seu lado agressivo e sombrio e por essa razão é que existe uma ligação de Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) com ajé (Àjẹ́), ligação indireta. Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) trabalha para controlar a ira feminina, a energia feminina que se descontrola. Ajé (Àjẹ́) é a ira de Ilẹ̀.
Em uma sociedade machista como a Yorùbá, existe um grande potencial da relação homem-mulher se descontrolar.
Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) busca através de Ìyá Nlá o aplacamento do mal teológico, a grande mãe é quem protegerá seus filhos.
No processo de fazer isso o festival se desenvolve tendo no centro dele a união da sociedade em um momento de felicidade e dança. Os mascarados usam máscaras especialmente feitas por pessoas designadas e que, cada uma delas tem uma finalidade, as máscaras são contextuais, mas, isso não é o tema aqui.
Os elementos básicos da sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) para se proteger de ajé (Àjẹ́) e do mal teológico, são: os idés de metal, o pano de cabeça – Gẹ̀lẹ̀, o pano para carregar a criança – Ọja, os aros de metais nos pés – Idẹ e a dança.
Por toda a região yorùbá os aros de metal, mais de um, de ferro ou bronze, colocados nos pés é um conhecido elemento de proteção contra ajé (Àjẹ́). A presença do metal ou seu barulho feito enquanto dançam é a proteção contra ajé (Àjẹ́).
Esses aros são usados também em crianças para evitar a mortalidade infantil, visto que ajé (Àjẹ́) é responsável por isso.
Como eu disse, antes, mulheres recorrem a sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) para terem fertilidade e protegerem seus filhos de mortalidade infantil, estes são, talvez os 2 principais motivos que as levam à sociedade. O aspecto de proteção de mortalidade infantil liga a sociedade a 2 divindades, ajé (Àjẹ́) como já citei e aos Àbíkú. Existe uma grande proximidade da sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) com a questão dos Àbíkú.
Junto as manifestações da sociedade existe sempre o chamado Orixá (Òrìṣà) Ọlọ́mọwẹ́wẹ́, que é um nome genérico dado a mais de um Orixá (Òrìṣà) que está ligado a crianças e a sociedade egbé (Ẹgbẹ́) órun (Ọ̀run). Em muitos lugares antes do festival Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) é feito o festival dedicado ao Orixá (Òrìṣà) Ọlọ́mọwẹ́wẹ́ da região.
No sentido de buscar essa proteção existem duas cerimônias interessantes que eu próprio já lancei mão, com sucesso. A primeira é a de lavar as crianças no Rio na primeira hora da manhã quando as águas do Rio ainda não foram tocadas. Quem já esteve e um Rio nesse horário sabe que a água é completamente diferente.
A cerimônia no rio, de lavar as crianças, deve contar com a intervenção do Orixá (Òrìṣà) Ọlọ́mọwẹ́wẹ́ e é usada para prevenir doenças e afastar a morte. Lembro que além do rio estar ligado a Orixá (Òrìṣà) feminino, vários, também o rio está ligado a sociedade egbé (Ẹgbẹ́) órun (Ọ̀run).
A segunda é uma cerimônia radical de fertilidade, quando a mulher precisa muito de filhos e é feita usando imagens de madeira Eré. A mulher e o marido vão dançar no mercado, vestidos de forma especial e usando as imagens.
Minha experiência em ambos os casos foi muito positiva, isso funciona de fato.
O aspecto da dança é importante quando lidamos com ajé (Àjẹ́). Faz parte da ritualística de oferecimento para ajé (Àjẹ́), dançar e cantar, ajé (Àjẹ́) gosta quando se dança, é uma manifestação importante que traz o aplacamento de ajé (Àjẹ́). Existem cantigas específicas que se faz para ajé (Àjẹ́) quando se oferece para elas e no caso da sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́), que busca o aplacamento de ajé (Àjẹ́) para toda a comunidade a dança o momento de alegria e interação é o fator determinante.
O clima do festival é festivo, as pessoas interagem, como eu disse devem se gostar e se amar. Ajé (Àjẹ́) ao perceber esse ambiente muda sua face obscura para sua face alegre e vai trazer a solução que as pessoas esperam. Isso não é invenção, esse aspecto mutável de ajé (Àjẹ́) esta documentado no Odù Ogbè osá (Ọ̀sá), como eu disse para aprender teologia as pessoas precisam estudar teologia e isso os Bàbáláwo tem acesso devido a Ifá.
Como Bàbáláwo eu conheço e já vi muita gente fazendo coisas para ajé (Àjẹ́) porque a oráculo recomendava, mas, infelizmente a maior parte do que vi era de placebos, as pessoas não buscavam informação e não sabiam o que fazer e, o que faziam não tinha nenhum efeito. Elas lidavam com ajé (Àjẹ́) como se estivessem lidando com outros espíritos, ou Egúngún ou Orixá (Òrìṣà) e isso é inefetivo.
O uso dos Idẹ é um clássico associado a Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́). Mais uma vez, um clássico desconhecido por muitos. Historicamente existem referências que esses Idẹ seriam originalmente de búzios e estariam ligados a Olookun, mas, depois, com o desenvolvimento da metalurgia do bronze foram convertidos para bronze, com alguma ligação com Óxun (Ọ̀ṣun) nisso, um Orixá (Òrìṣà) ligado tanto a água quanto às crianças.
Os Idẹ são um símbolo importante e são usados por todos os mascarados e pelas crianças ainda no berço. O barulho é um proteção contra espíritos ruins, contra o mal. Ikú é afastada colocando-se uma galinha viva, arrepiada que deve ficar cantando. O barulho metálico afasta o mal, os Àbíkú são afastados por barulho. No Candomblé, a pessoa que está passando pela feitura usa como proteção um Xaorô, um guizo amarrado com palhas aos seus pés.
Desta maneira, a sociedade Gélede (Gẹ̀lẹ̀dẹ́) é orientada a cuidar da coletividade, de atenuar as tensões e de buscar o equilíbrio da energia feminina quando ela se descontrola. A presença dos homens como dançarinos é devido a duas coisas, primeiro a isso, os homens agradando a Ìyá Nlá para obter a sua misericórdia e por outro eles substituem as mulheres que não querem fazer o pesado trabalho de dançar e carregar máscaras e roupas. Não existe proibição de que mulheres também sejam dançarinas.
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