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segunda-feira, junho 10, 2019

O comércio em torno do jogo de búzios

O comércio em torno do jogo de búzios

(esse texto faz parte de um texto maior ainda em elaboração sobre o jogo de búzios) 

 

E o que é isso? Existem sacerdotes e feiticeiros. Existem pessoas dedicadas a sua religião de fato, que se focam em orixá (Òrìṣà) e nas suas liturgias, são pessoas com uma casa que tem atividade permanente dedicada a orixá (Òrìṣà) e atuam de forma ética e sacerdotal de fato.
Existem também os feiticeiros, aqueles que por ego ou importância comercial dizem ter uma casa de Candomblé (terreiro) mas que ali fazem uma prática mista, com consultas de umbanda com exu e pombo-gira, às vezes giras de Umbanda, porta aberta para fazer trabalhos de qualquer natureza ética, incluindo o malefício a outros. Mantêm uma atividade de Candomblé com Xirês voltados para atrair clientes e manter a sua relação social dentro da comunidade de sacerdotes.
Essas pessoas colocam sempre muito dinheiro na realização dos seus Xirês de Candomblé. Suas casas são arrumadas, os orixá (Òrìṣà) bem vestidos, muitos Ogans e um serviço farto de comida após o xirê.
A presença de outros sacerdotes é importante, para mostrar a sua inserção e relevância no meio, aliás essa troca de gentilezas, de sacerdotes frequentando a casa de outros, é assunto a parte para a psicologia. Existe um círculo próprio desses sacerdotes que devem convidar e serem convidados para os xirês dos outros. Nesses eventos, eles são recebidos com pompa e circunstância, se tornam vistos pela assistência e têm o seu ego inflado, porque são tratados como autoridades.
Mas isso é, majoritariamente, um jogo comercial porque esses grandes eventos nos quais existe um xirê (toque para os orixá (Òrìṣà) são sempre acompanhados de um serviço de comida para toda a assistência. Isso ocorre em dias festivos ou não, na verdade em dias festivos o aspecto laico é maior e, o foco, é a festa e não o orixá (Òrìṣà).
Esses eventos, pequenos ou grandes servem para mostrar à assistência a grandeza e poder do dono da casa. Uma casa próspera é a do sacerdote que trabalha mais, tem mais clientes, ganha mais dinheiro com o que faz e dessa forma sendo o mais bem sucedido será a melhor pessoa para se consultar. Se você tiver um problema para resolver a indicação é ir na casa da pessoa mais bem sucedida.
Os “eventos-Xirês” não existem para manter o axé da casa em atividades, trazendo os orixá (Òrìṣà) para abençoar as pessoas e a casa com sua presença, renovando o axé da casa. Eles existem como obrigação para o atendimento comercial do sacerdote e seus clientes de jogo, são parte da atividade comercial do jogo de búzios.
Esses Xirês são dessa maneira um evento feito para atender aos clientes do dirigente. Não dá para uma casa de Candomblé com foco religioso sustentar uma atividade como a que essas pessoas sustentam.
Um dos componentes, como já citei, desse complexo espetáculo de horrores é a presença de sacerdotes convidados, pessoas igualmente conhecidas, que mostram para a assistência que o dono da casa é conhecido e tem prestígio para trazer outros conhecidos e “famosos”. Os famosos podem também ser os clientes famosos. Tudo isso é parte do espetáculo comercial.
Os espetáculos legitimam o dono da casa, como legítimo e prestigioso sacerdote e também os convidados da mesma forma. Ao ir, os convidados, estão, na verdade, legitimando tudo o que o dono da casa faz. Mas, ao ir, os convidados, também estão se expondo para os consumidores de jogo de búzios. Esse é um círculo vicioso onde você convida e é convidado.
Para essas pessoas, ao se falar de fazer o Orixá (Òrìṣà) de alguém a primeira coisa que tratam é do tamanho da festa, porque a casa tem um padrão e se quiser fazer lá vai ter que pagar uma festa do porte que a casa faz. Essas casa estão continuamente em festa.
O principal objetivo dos feiticeiros é de fato vender obrigações e adquirir filhos de santo. Uma obrigação é muito mais cara do que um jogo e alguns ebós e além disso transforma a pessoa em cliente para o resto da vida.
O importante para esses feiticeiros travestidos de sacerdotes é ter esta atividade vistosa de Candomblé para justificar sua posição. Para eles o importante é atrair clientes e transformar clientes em filhos de santo, na verdade, é o comércio de feituras de orixá (Òrìṣà) que concorre com o comércio principal que é o do jogo de búzios e das consultas com guias de umbanda, normalmente exu e pombo-gira.
Não existe nenhuma razão para uma casa de Candomblé ter dentro de suas atividades o trabalho com essas entidades de Umbanda. Isso não faz parte e apenas mostra que o foco da atividade da casa é comercial. As consultas estarão associadas ao uso de um oráculo de búzios rasteiro, feito para, mais uma vez, dar legitimidade de Candomblé a atividade comercial do sacerdote.
O que ocorre é sempre uma dobradinha, ao consultar o guia de umbanda, ele as vezes pede algum trabalho ou faz alguma coisa ali presente, mas, normalmente indica que a pessoa deve procurar o pai-de-santo em outro horário para ele fazer um jogo de búzios, permitindo ao pai-de-santo cobrar duas vezes (ou uma, as vezes a consulta é de graça ou de baixo valor, sob a alegação de que a Umbanda é caridade), uma pela consulta ao exú e outra pelo jogo de búzios que é de onde vão sair os trabalhos a serem feitos.
O jogo de búzios vira então apenas um complemento da consulta que foi feita pela entidade de Umbanda, sendo usado para indicar os trabalhos cobrados a serem feitos. Esse é um formato muito comum e ruim, é orientado para o comércio.
Todos os sacerdotes que vi serem questionados em porque mantinham consultas e trabalhos com exu e pombo-gira junto com sua dita atividade de Candomblé alegaram a mesma coisa, um discurso comum, que eram muito gratos com aquelas entidades e que não poderiam abandoná-las.
Isso é uma total bobagem.
Elas já teriam virado as costas para elas no momento em que decidiram ir para o Candomblé, onde não existe o trabalho com esses guias.
Eles mantêm os guias por alguns motivos. O primeiro deles é puramente comercial, ganham dinheiro através desse guias de forma muito mais simples do que com uma casa de Candomblé. Além disso dinheiro sem ética porque esses guias são usados para trabalhos sem finalidade ética.
Outro é despreparo. Nada ou pouco sabem de Candomblé e se não tiverem esses guias de Umbanda não vão ter nada para fazer. Outro é porque dizer que são de Candomblé é apenas alegórico, eles gostam de poder dizer que são de Candomblé mas que amam a Umbanda e querem ter e usar todo o aparato decorativo que o Candomblé pode oferecer e que não encontram na Umbanda.
Essas pessoas não amam e nunca amaram a Umbanda. Elas amam o dinheiro.
As indicações da baixa qualidade da relação do sacerdote com o divino passam por isso que expliquei. Esses xirês realizados com muita opulência, seja para festas ou saídas de orixá (Òrìṣà), com muita aparência sempre são uma indicação forte de que aquilo é palco para a casa atrair pessoas. Pessoas que fazem trabalhos de qualquer natureza ética são apenas feiticeiros. Pessoas que anunciam em jornal, gastando assim muito dinheiro na sua promoção terão obrigatoriamente a necessidade de ganhar dinheiro com o que fazem.
Não vou entrar aqui no mérito das dificuldades em ter uma casa de Candomblé funcionando junto com guias de Umbanda, dificuldades do ponto de vista do supernatural.
Os fatores que indicam um bom ou mal lugar para consultar búzios são muito evidentes e simples, alguns podem não saber do que eu disse ou não terem prestado atenção, mas, podem se perguntar, se isso é assim evidente porque as pessoas continuam a ir nessas pessoas? Simples, se merecem, elas estão em busca também da falta de ética.
Não se pode falar de Jogo de Búzios no Candomblé sem falar sobre esse contexto comercial e esse é o motivo de eu citar isso tudo.

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