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segunda-feira, fevereiro 16, 2015

Os Bàbáláwo e o culto de Orixá Revisão 2

Os Bàbáláwo e o culto de Orixá

Revisão 2


O que impede um Babalawo brasileiro de trazer para dentro do seu Ifá as práticas que aprendeu no Candomblé ou no seu culto de orixá, para lidar com as divindades, de esú a egungun?

Nada

A questão é se essa pessoa aprendeu alguma coisa de fato que possa trazer. Nem todo mundo que era de Orixá sabe alguma coisa.

Antes de seguir, preciso fazer um comentário importante, que faz parte de nossa riqueza e complexidade. Não temos apenas 1 culto de orixá. O Candomblé é extenso e complexo mas ele não representa sozinho o culto de Orixá no Brasil e muito menos a religião Yoruba.

Além do Candomblé com sua complexidade temos ainda o Batuque, o Xango e o Mina. Posso até estar esquecendo de algum. A realidade é que a religião Yoruba e o culto de Orixá no Brasil é representado por mais de uma corrente. Como tenho origem no Candomblé, é natural para mim citar ele como a referência mas entendam que onde se lê Candomblé pode se ler os demais cultos e Orixá.

Já escrevi sobre essa complexidade, podem procurar no histórico do Blog.

Seguindo, o Bàbáláwo aprende a trabalhar o Ifá. Aprende a entender os Odù, aprende a trabalhar com seu Opon e instrumentos, aprende suas cerimônias ou liturgias de Ifá, mas, depois disso existe uma grande intersecção com o culto de orixá.

Voltando, é a mesma religião, assim Esu, Ori, Orixá e egungun são os mesmos.

Se a pessoa tem conhecimento de como se lida com essas divindades no seu culto de Orixá, se já aprendeu isso antes e sabe fazer, nada a impede de continuar a fazer. Somente a estupidez pode impedi-la.

Vejo isso de forma mais séria, se a pessoa era de Orixá, sabia o que fazer e fazia isso no seu culto, o seu primeiro compromisso é com a forma e formato que ela adotava no seu culto de Orixá. Isso vai de usos, limpeza e proibições.

Nada também impede que um Bàbáláwo brasileiro, procure o contato com uma casa de Candomblé ou de outro culto para realizar aquilo que não sabe ou aprender o que precisa. Não ignoro que aprender algo no Candomblé é bem difícil, falta a boa vontade para isso, mas o Bàbáláwo tem o que dar em troca.

Não podemos esquecer que para alguns orixás que ela vai lidar aqui no Brasil, como Ori, Oxumarê, Logun edé, Obá e por ai vai ele nem vai encontrar referência em Cuba. Se o Bàbáláwo não aprendeu no seu culto de Orixá ou tiver apoio, vai ficar sem saber.

Digo mais, o entendimento e a liturgia que temos para Ori no Candomblé é única e completa. Cubanos não tem a menor ideia, ou melhor, já tem, dizem que já sabiam mas não é verdade. Fazem ainda uma coisa qualquer bem mal feita. Os nigerianos não conheço, mas, não imagino que seja diferente. Por que uma pessoa vai procurar conhecimento liturgia de Ori fora do Candomblé?

Eu vejo como muito natural que os Cubanos apliquem no seu Ifá em relação a orixá o que aprenderam em sua terra e no seu culto de orixá, a santeria. É óbvio que eles devem fazer da forma como aprenderam. Também acho natural que se eles tem que ensinar algo a alguém que façam da forma como aprenderam.

Entretanto isso não descarta outras alternativas, a primeira delas será eles buscarem uma integração com o culto de Orixá da região que estão, como eles fazem em cuba com a Santeria. Se vão viver aqui não vão transformar isso aqui em Cuba, é o contrário eles tem que se adaptar aos nossos cultos.

Acho muito mais natural que os Brasileiros que entram para a tradição cubana, separarem a parte de orixá da parte de Ifá e os brasileiros devem procurar o seu apoio no Candomblé ou seu cuto de Orixá. O nosso culto de Orixá é muito bom, o melhor, mas, antes de tudo é o nosso culto de Orixá.

O pior, para mim é claro, é ver brasileiros que se esforçam para falar nossa língua com sotaque de cubano, isso mesmo…. Tem algo mais lastimável que ouvir brasileiro falando português como se fosse um cubano?

A ideia de integração não é absurdo ou irreal, pelo contrário. Para ser efetiva depende também do Candomblé se abrir para entender o que Ifá pode lhe trazer e como Ifá não concorre com eles. Ifá é muito pequeno para concorrer com os diversos cultos de Orixá, mas, adiciona um valor perdido, um culto que esquecemos.

Ifá não é imprescindível, mas, agrega valor.



O Culto de Orixá dos cubanos, o Santo.


Para aqueles que não conhecem a estrutura que estou comentando, existem algumas coisas que devem ser explicadas. A primeira é que existe um culto de orixá e o culto de Ifá, são segmentos diferentes e especializados. O de orixá cuida de orixá e tem um aspecto bastante abrangente na vida das pessoas, porque Orixá é muito abrangente no nosso dia a dia. O culto de ifá cuida apenas do oráculo de ifá.

Santero cuida de santo (orixá pelos cubanos) e Bàbáláwo cuida de ifá. Lá em cuba a informação que tenho é que de forma geral os babalawo tratam do culto e liturgias Orunmilá e exu. Os santeros de orixá. Isso não é uma regra, é uma convenção deles. De fato, não é o correto que essas coisas se cruzem. Babalawos não fazem santo e santeros não consultam ifá. Essas afirmações sempre trazem discórdia e polêmica, entretanto a gente deve dizer o que tem que dizer, cabe aos outros explicarem suas ações.

O culto de orixá em cuba chama-se lukumi, ou santeria e é bastante padronizado, existe uma unidade, uma “regla”. Além disso a ilha deles é muito pequena para ter muita variedade. No Brasil o culto de orixá é coberto pelo conjunto do candomblé, pelo Batuque, pelo Xangô do Nordeste e pelo Tambor da Mina (espero não ter esquecido de algum). Como eu disse em outra postagem, a religião Yoruba no Brasil é um conjunto amplo de tradições e não uma unidade. Cuba é uma ilha muito pequena e com uma população muito reduzida se compararmos com o Brasil. Somos um continente em termos de tamanho e eles, comparativamente, um estado pequeno, um pouco pior, porque são uma ilha.....

A complexidade cultural e religiosa deles é muito pequena. Eles fazem apenas muito barulho. Muito barulho pouca informação e pouco conteúdo. Os cubanos, de Ifá ou da Santeria jamais vão entender o nosso culto de Orixá. É muito vasto e complexo para eles. Como disse em outro texto eles vão ter dificuldade aqui no Brasil de entenderem o que é um Orixá de verdade. No Candomblé quando alguém incorpora com orixá nos vemos Orixá mesmo, para eles cubanos, a incorporação é muito mais rara e eles veem como um egun na pessoa, eles não acreditam que Orixá incorpora em ninguém.

As pessoas que não são de Candomblé ou nunca viram poderiam incorporar as ideias deles por falta de conhecimento e experiência. Nós sabemos com o que trabalhamos e sabemos fazer a diferença.

Nós aqui temos um diferencial muito importante, a Umbanda, que tem um amplo espectro de guias, de vários níveis de evolução e energia, indo dos mais elementares e baixos até aos mais próximos de orixá, mas tudo isso em um sistema hierarquizado e muito bem organizado. A Umbanda é uma religião brasileira, não é parte do Candomblé ou de outro culto de orixá, mas, consegue funcionar e integrar a sua hierarquia a este culto.

Temos eleguns e Iyalorixás que já passaram por várias casas de orixá e também pela Umbanda. Nós aqui conhecemos egun em todas as suas formas de manifestação no Aiye e sabemos fazer a diferença entre orixá e egun. Os médiuns e eleguns sabem diferenciar, explicar definir e filtrar com quem trabalham. Estamos em outro patamar de entendimento do supernatural.

Além disso incorporar com Orixá é a regras para os eleguns dos cultos de Orixá, temos um longo processo de iniciação para que isso ocorra, não fazemos iniciações em 7 dias. Nossa experiência nos faz saber com o que lidamos e mais, nos faz saber a diferença entre essas coisas. Eles, os santeros não tem nada disso.

Lembro que a Umbanda foi um grande divisor de águas neste contexto religioso. Ela acabou com a feitiçaria banto, o chamado baixo-espiritismo cuja prática era dominada pelo charlatanismo e feitiçaria de poucos propósitos, para uma forma de práticae culto na qual ideais e dedicação substituíram o mercantilismo. A Umbanda reuniu dentro dela uma ampla hierarquia de espíritos e os colocou debaixo da mesma ideologia religiosa, além de estabelecer uma ordenação hierárquica da prática no nível espiritual. Apesar de carecer de uma melhor formatação para os praticantes que se sentem atraídos pelo aspecto exterior do Camdomblé, em relação ao mundo espiritual ou supernatural a Umbanda trouxe opções e organizou sua prática.

A capacidade e a complexidade da Umbanda em lidar com o mundo supernatural é muito grande, muito superior ao dos cultos de orixá. Mas a Umbanda pode se integrar perfeitamente com os cultos de orixá, sem prejuízo da Umbanda e dos cultos de orixá, é um ecumenismo não um sincretismo.

Claro que a capacidade das pessoas varia muito e gente inábil faz dessa capacidade de integração e complementação um desastre, criando os monstros que temos por ai, como os Omoloko, Umbanda traçada e Angolas.

Em muitos aspectos a presença da Umbanda prescinde a necessidade do culto de egungun para nós no Brasil. O Culto de egungun existe, mas fora a parte de curiosidade e culto de orixá e a Umbanda o substitui. A Umbanda nos trouxe uma enorme compreensão do mundo supernatural que existe entre a energia mais baixa de um espírito perdido à energia mais elevada de um Orixá. Os Orixá de Candomblé ou dos outros cultos não pertencem a Umbanda, mas encontram nela uma base e uma continuidade.

Sem dúvida nenhuma a Umbanda nos fez ter uma prática religiosa muito melhor e superior. Saímos do animismo fetichista africano, que dominava a nossa cena urbana do princípio do século XX para uma religião brasileira que organizou o mundo supernatural.

O que os cubanos têm em cuba é o Palo e a macumba, principalmente o primeiro. O Palo é o baixo-espiritismo, como tínhamos ha mais de 100 anos atrás. Dessa maneira, mais uma vez eu digo que nossa complexidade cultural e religiosa é desconhecida pelos cubanos. Se algum dia eles conseguirem entender o Candomblé, o que não vai ocorrer porque eles cresceram com formatação ideológica da Santeria na cabeça, eles não vão conseguir saber o que é a Umbanda. As bases de comparação dele são muito pobres, seja a Santeria como o palo e similares.

Suponho que muitos de vocês devem estar se perguntando porque o texto tomou esse rumo e onde quero chegar. O que busco explicar aqui é o que já falei muitas vezes. Temos uma complexidade cultural e religiosa aqui muito grande e autossuficiente. Nós temos a ensinar e não a aprender com os cubanos. Eles trazem para o Brasil uma prática de orixá muito mais pobre do que a que temos, em relação ao que temos aqui, a opção nativas deles é um retrocesso.

Em relação ao culto de Ifá, o que eles trazem é adequado. Como tudo de Cuba eles simplificam e misturam coisas, mas Ifá é Ifá mesmo, em cuba, Nigéria ou no Brasil.

O culto de Ifá tem 2 tradições religiosas diferentes. A cubana e a nigeriana. Apesar de ambas serem ifá, elas tem diferenças litúrgicas.

Aqui no Brasil não tínhamos ifá. Hoje temos o ifá cubano e o nigeriano, a escolha e podemos fazer o nosso Ifá Brasileiro, retirando a parte Santeria do Ifá deles e melhorando a parte Yoruba, principalmente rezas e histórias de Odù.

Assim espero que neste ponto do texto, fique claro para os leitores que:

  • O culto de orixá é distinto do culto de Ifá. 

  • Os sacerdotes não são os mesmos. 
  • Temos no Brasil uma prática bastante antiga de orixá que é muito consistente e nos permite saber claramente como é que deve ser feito o culto a orixá. Podemos não ter histórico de ifá, estamos aprendendo isso, mas o que diz respeito a orixá é de nosso completo domínio.
  • Dentro do Ifá, além de liturgias e conhecimento específico de Ifá existe a necessidade de se fazer coisas para Orixá.
  • Os Babalawos brasileiros podem aplicar no seu Ifá as práticas de orixá dos cultos de Orixá
  • Existem diferenças grandes no culto de Orixá do Brasil e de Cuba.

Os Santeros e os Santos


Lembro a todos que "santo" é a forma como os lukumi (santeros) cubanos chamam os orixás. A santería é bem diferente do candomblé, apesar de terem como origem a mesma religião yoruba.

As pessoas precisam entender que os caminhos de evolução é que determinam o formato final e não a origem. Não adianta terem tido a origem no mesmo lugar se tomaram caminhos diferentes na sua evolução. Se comparado com o Candomblé, com o que conhecemos de Orixá, a santeria tem uma forma muito distinta de ver orixá, tem uma teogonia um pouco diferente, tem Orixás que eles criaram lá, etc.

No meu modo de ver eles se comparam a umbanda omoloko que a gente tinha ou tem por aqui, não no aspecto de incorporação, porque lá isso é menos comum, mas no entendimento da religião e das divindades como uma mistura do original com uma coisa própria deles, extremamente sincrética. O culto de orixá deles, a santeria, incorpora muito a sociedade deles e em demasia o catolicismo, dificilmente alguém do candomblé, que se aprofundar, poderá se identificar com a forma como eles entendem e lidam com orixá.

Você não vai encontrar neles coisas muito básicas no nosso entendimento, como xirê, conceito, teologia e pratica de Ori, qualidade de Orixá, o conceito de terreiro (a comunidade), o conceito e processo de feitura de orixá e até mesmo a necessidade da incorporação do orixá para a sua presença no Aiye.

O Candomblé é um culto no qual a presença do orixá incorporado, no Xire, dançando com as pessoas e até mesmo cantando (como ocorre em algumas tradições) é primordial. Existem tradições brasileiras, dentro do Candomblé e fora dele (como o Xango do nordeste) no qual o Orixá incorpora e convive com as pessoas longas horas.

O Candomblé tem convenções ou dogmas no qual em determinados momento ou liturgia o Orixa ira se manifestar para fazer ou receber o que fazem. O Elegun de orixá é uma figura importante.

Nada disso faz parte da Santeria. As coisas dele são feitas de “cara limpa”, eles rezam ou cantam e pronto, está feito. Você tem que acreditar (haja fé...).

Outras diferenças importantes poderiam ser destacadas e incluem a visão do culto de egun dentro do culto de orixá deles. Eles acham normal, orixá e egun para eles estão muito próximos e ligados. Para nós são distantes, 2 cultos separados.

Vocês podem então estar se perguntando, porque nos santeros isso está tão próximo e com a gente tão distante?

Simples, para eles não tem Orixá incorporado, é um egun de uma mãe de santo ou pai de santo que incorpora na pessoa. Por isso que egun e orixá estão tão próximos para eles e tão distantes para nós. Por isso é que eu chamo o nosso de orixá e o deles de “santo”.

Além disso eles lá tem o Palo, uma forma de macumba e tem também a macumba dos Bantus, que aqui acabou e foi substituída pela Umbanda. Lá eles tem a forma de macumba pré-umbanda, e sendo uma ilha pequena com um povo reduzido essas coisas se misturam. Sem dúvida a Santeria tem muita influência do Bantu, dos Cambinda, coisa que não ocorre no Candomblé.

A Umbanda foi também um processo muito forte que acabou com o universo de macumbas, quimbandas e feitiçarias que existiam.

Não estou neste momento fazendo nesse momento qualquer juízo de valor sobre essas diferenças. Estou apenas destacando que existem diferenças fundamentais que, para quem não tem intimidade com a teologia pode não ser percebida ou parecer importante, mas, para mim, me faz dizer que são água e óleo.

Essa diferença teológica gera uma questão importante e que está sendo desprezada largamente por todos podendo trazer consequências ruins para nós no Brasil. Nós podemos fazer uma auto-crítica e achar que temos coisas a melhorar e corrigir no candomblé, essas coisas dizem respeito principalmente a comportamento das pessoas e organização, mas, não temos nada a mudar na religião e no culto de orixá. São muitos anos de uma prática consistente que apresenta resultados concretos.

A santeria não adiciona nada ao candomblé, não temos nada a adicionar, mudar ou copiar. Repito eles são uma outra “coisa”. Eles do jeito deles e nós do nosso.

Se os cubanos estão felizes com o que fazem ótimo para eles. Por gentileza digam a eles que sejam felizes assim e digam mais, digam que eles não tem capacidade ou propriedade para comentar nada do candomblé.

Não coloquem na mesma cabaça a Santeria e o Candomblé.

O que os Babalawos cubanos trouxeram para cá, para lidar com a parte orixá, foi essa santeria e é em relação a isso que temos que ter cuidado.







Texto anterior na sequencia: A ligacao entre ifa e o culto de orixa






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