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quarta-feira, março 28, 2012

Qualidade de Orixá

Qualidade de Orixá

Eu não gosto de fazer polêmicas inúteis ou provicativas, mas, não tinha como comentar este assunto. A internet hoje em dia é muito incrível, ela se transformou em uma ferramenta comum e aberta e qualquer pessoa pode gerar conteúdo.  Isso é positivo, mas, abre a possibilidade das polêmicas ou convivências de pontos de vista divergentes. Claro que também permite a publicação de muita bobagem.

Além disso hoje em dia convivemos com mais de uma tradição da mesma religião. São tradições estrangeiras que competem com a visão da tradição do Candomblé sobre temas religiosos. O Candomblé que nunca pode ser questionado agora possivelmente vai ter que se dar ao trabalho de explicar suas teses. Isso claro traz um problema porque os Babalorixás e Iyalorixas não se dão a trabalho de ser preparar para isso, sempre foram acomodados a falar coisas que ninguém questionava.

Mas o trabalho não é difícil. Tem que principiar por se entender primeira a própria religião e depois responder ao que as demais tradições falam. Tradições essas que serão os Lukumi e os Nigerianos. Os africanos são representantes de uma religião quase morta na terra deles. a Nigéria é dominada por Católicos e Islamitas, pouca gente lá sobrou da religião dos Orixás. Os que conhecem mesmo dificilmente vão vir aqui no Brasil, certamente ficarão lá cuidando de suas obrigações. Com certeza quem viaja para se aventurar aqui é quem sabe menos e quer ganhar mais. Por outro lado os brasileiros que se mentem nesta tradição não vão ter tempo para aprender nada e assim a tradição Yoruba vai ter muito pouca gente com propriedade para se manifestar aqui.

Os Lukumi tem uma tradição da diaspora muito influenciada pelo sincretismo. Além disso claramente o Candomblé é muito mais consistente e tem vínculos muito mais próximos e fortes com a tradição africana original. Para mim é muito sem noção brasileiros que tem acesso a uma tradição como o Candomblé se interessarem pelas teses Lukumi.

Mas, voltando ao tópico do texto, li recentemente uma posição contrária a existência de qualidade de Orixá. Claro que a colocação da pessoa era bem simples no sentido de dizer que isso não existe e que todo Orixá é o mesmo. Esta afirmação dificilmente seria contrariada por alguém do Candomblé, porque quem sabe o que é, sabe e a gente não se preocupa em explicar para quem não sabe. Basicamente a atitude é ouvir aquela afirmação e deixar para lá, afinal se ele entende assim, que fique com seu entendimento.

Eu penso que este tipo de atitude não contribui e também vi várias pessoas se manifestando concordando com a pessoa. Bom, como hoje em dia todo mundo pode dizer o que pensa, eu também posso.

O Candomblé não tem esse entendimento de que é tudo a mesma coisa. A mesma coisa são dois caminhões cheio de chineses, como a gente brinca no dia a dia. A qualidade de Orixá é um dos pilares do Candomblé e uma das partes mais importantes dos segredos da religião.

Sim existem qualidades de Orixá. 

Seria esta uma religião muito simples se tudo fosse igual, se a gente tivesse uma meia dúzia de Orixás e cada um fosse de um e por ser daquele Orixá corresponderia a um arquétipo de personalidade. A Umbanda que não entende nada pensa assim, mas, não é assim a religião de verdade de Orixá. Acho que as pessoas pensam que Orixá é igual a símbolo do zodíaco.

Neste sentido nós também poderíamos simplificar mais ainda e dizer que não tem Orixá, que é tudo a mesma coisa e que tudo é Olodumare e que Orixás são manifestações distintas de Olodumare.

A qualidade de Orixá é importantíssima para um iniciado e faz parte do processo de individualização da pessoa no Aiye. Não somos todos iguais, somos todos indivíduos únicos e diferenciados. Todos nascemos a partir de uma mesma base. A matéria fundamental que nos estrutura é a mesma, mas, no nosso caminho de vinda para o Aiye, o mundo físico, vindo do Órun, o mundo espiritual, nós trazemos a personalização.

A matéria elementar sofre a adição da matéria do nosso Orixá. Depois de nossa ancestralidade que nos liga com nossa linhagem. Depois das ferramentas necessárias para levarmos a cabo no nosso destino pessoal.  Devemos entender o nosso "destino" como um objetivo de vida que para ser atingido vai precisar de instrumentos. 

Um dos elementos é a energia espiritual que necessitaremos para o que pretendemos realizar, o nosso axé pessoal,  que será traduzido pela energia de um Odu. O Ori é também um desses instrumentos e que esta ligado a nossa capacidade de ser prósperos no Aiye mas que também traz um fator de aleatoriedade a nossa capacidade de ter sucesso em nossos objetivos ou destino.

O Orixá é outro desses componentes. Temos vínculo com um Orixá que é o Orixá de Ori. Além desse Orixá temos vínculos também com outros que compõe o que chamamos de "enredo" da pessoa. Observe que no Candomblé não existe a abordagem de Pai e Mãe espiritual. Isso é coisa da Umbanda que não entende NADA de Orixá. É coisa também de Lukumi, que entende do jeito deles....

Nós temos apenas UM Orixá de Ori. Esta é a visão correta porque é a do Candomblé e é também confirmada pelos versos. A escolha desse Orixá passou pela escolha de nosso próprio destino. Este Orixá existe para nos ajudar e proteger e esta ligado com o destino que escolhemos para nós mesmos. Ele será um Orixá cujo axé, ou capacidade de transformar axé, irá facilitar o nosso caminho.  A linhagem tem forte influencia na escolha de um Orixá. Primeiro vem o Orixá da família. Se ele é adequado, possivelmente será ele o nosso Orixá. O processo de escolha do Orixá no Órun não é aleatória como muitos dizem, é um processo direcionado para o nosso destino e para os nossos próprios vínculos de linhagem.

Pessoas de uma mesma família tendem a ter Orixás comuns.

Além do Orixá que escolhemos teremos um segundo Orixá, o juntó que poderá ser de qualquer gênero. Este é outro ponto importante e que distingue a abordagem do Candomblé que entende de fato de Orixá, das demais. O juntó pode ter o mesmo gênero do Orixá principal. . Esses dois formam o nosso principal pilar, mas além deles poderemos ter vínculos fortes com outros Orixás, seja por questões de família como também para compor o nosso enredo.

A qualidade de Orixá surge desta combinação. Tomando como exemplo para este texto o Orixá Oxun, a forma como uma Oxun se manifestará naquela pessoa será configurada através do enredo que compõe aquela pessoa, ou seja com a combinação de forças complementares, como o seu Odu de Ori, o seu juntó (fortemente) e os demais Orixás que participam ativamente do seu enredo e da nossa capacidade de transformar, emitir a manipular axé.

Assim, existe desta maneira, a individualização da pessoa no Aiye. A existência genérica passa a ser particularizada tornando o indivíduo um ser único. O seu axé de vida é composto por esta configuração espiritual feita para que ele possa a executar o seu destino de vida. A Oxun genérica, que é apenas uma matriz base, se torna uma Oxun particularizada, composta pelas energias que se adicionam a ela através do enredo.

Cada orixá vai adquirir uma qualidade que pode variar do fun-fun para o azul (negro), passando pelo vermelho ou como muitos dizem de Oxala a Exu. O axé de Olodumare, através do Odu vai trazer as coisas que a pessoa será mais bem sucedida em fazer e os elementos que deve se aproximar ou se afastar. Como elementos entenda cores, materiais e alimentos.

Estas combinação de energias e de axé gera a qualidade que é a forma como aquele Orixá se manifesta através daquele indivíduo. Assim o Orixá principal adquire a sua qualidade e o indivíduo tem ainda mais características de individualização através de seu enredo.

As proibições são as coisas que não somam energia ao seu axé e que inclusive enfraquecem o seu axé. Somos uma usina de transformação e geração de axé. cada usina é feita para gerar um tipo de axé e para isso processar um tipo de elemento. Os elementos, na forma de alimentos, podem ser os adequados, neutros ou contrários para gerar o nosso axé.

Isso influencia então fortemente também os materiais que usaremos no igba do nosso orixá, nos alimentos que usaremos nas suas oferendas, na forma de vesti-lo, etc..

Assim, no Aiye o Orixá sempre se manifesta através de uma de suas qualidades. cada elegun é uma pessoas distinta e o Orixá aqui no Aiye sempre será diferente. Ao olharmos um Orixá manifestado sempre estaremos vendo uma qualidade de Orixá e não um Orixá genérico. É claro que a informação de qualidade só interessa ao elegun, ao babalorixá e a casa, para o leigo, é tudo Oxun.

Oxun só é única nas nossas orações, mas imagens e figuras ou aos olhos do leigo.

Assim lamento contrariar as outras tradições, mas, sim existem qualidades de Orixá e, mais, tudo o que vemos no Aiye são qualidades de Orixá.


4 comentários:

  1. Marcos como sempre seus textos s�o �timos. Este tema � pol�mico e extrutural. PARABENS.

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  2. Anônimo23:46:00

    Olá Marcos, ai ai...rss. Aqui to eu novamente com aquela misturança na cabeça que só você tem o dom de fazer...rsss. Vamos lá, no início de minha busca por conhecer melhor os Orixás, bem no início até quase a metade deste tempo, calculo aí quase quinze anos, aprendi que Orixás tinham qualidades... Estas qualidades os tornavam indivíduos totalmente distintos uns dos outros. Assim, uma qualidade de Oxum era ligada aos rios de água doce, outra ao encontro da água doce com o mar, e por aí surgiam diversas divindades.

    Convivi com esta crença durante muitos anos e mesmo achando intimamente isto confuso, permanecia tentando digerir tamanha diversidade. Com o passar dos anos, antes da Babalaomania, conheci alguns Babalorixás que possuíam outra visão, diziam que Oxum era Oxum em qualquer lugar, a mesma na terra e no céu! Isso soou como um mantra para meu entendimento, ainda mais, quando a explicação do enredo/juntó (a mesma dada por você), somava-se a primeira e tudo pareceu muito mais claro. Entenda-se esta soma como um tipo de energia que um iniciado pode vir a ter, devido a soma do seu Orixá principal, com os seus outros de enredo. Assim a pessoa que é de Oxum e tem como juntó Xangô, tem uma Oxum individualizada com um determinado tipo de axé, a que tem Oxum com Iansã tem outro tipo de axé, e novamente por aí vai. Isto não quer dizer que estas Oxums sejam notoriamente diferentes. Apenas estão adaptadas a cada ori, e por conseqüência, sofrendo variações aqui na aiye, terra.

    Quando conheci pela primeira vez um Babalaô e um Igbé Ifá, aprendi exatamente o que descrevi logo acima, sobre Orixá individualizado, tanto na terra, quanto no céu. Em seguida a este aprendizado, conheci outros babalaôs de tradição africana, tanto da família Aworeni, quanto Agboolá, e foi-me passado que Orixá é um antepassado divinizado, assim como no culto de Egungun. Isto me gerou alguma confusão, pois no meu primeiro contato com Ifá, aprendi que Orixá, Orixá mesmo, só os fun-funs. Os outros deveriam ser chamados de Irunmoles. Como podes ver, sou apenas um buscador. Trago mais dúvidas que respostas amigo...rsss. Um forte abraço. Ire O!

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  3. Anônimo23:49:00

    Desculpa não ter assinado o texto Marcos, sou o Dan Omo Oxalufã.

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  4. Dan,
    se você conversar com Nigerianos sobre Orixá vai ter vários problemas. O primeiro é o que eles sabem, muitas vezes quase nada. O culto lá quase sumiu e também é muito regionalizado assim a pessoa pode até ter uma idéia de um mas não tem de outro.
    Os Nigerianos estão inclusive importando conhecimento de orixá do Candomblé além também de adotar o nosso próprio padrão de culto.
    Então vai encontrar gente que pode falar o que não sabe. Ele vai parecer "sabido" só porque é Nigeriano.

    Outro aspecto é o fato dos Nigerianos desprezarem o culto de Orixá no novo mundo. Eles tem essa coisa da ancestralidade da religião deles e eles tem certeza que somente eles podem ter orixá. Eles fazem barbaridades em Ifá e orixá no resto do mundo porque para eles é só uma brincadeira mesmo. Eles não estariam fazendo nada de errado com Orixá porque só eles tem orixá.

    Grande parte deste sentimento esta na questão da ancestralidade.

    Sim muitos orixá são ancestres divinizados. Nós sabemos isso. Mas existem Orixá que não poderiam o ser é a questão dos irunmoles e dos eborás. A gente sabe isso aqui. Se eles não sabem, azar deles. Não se confunda.

    Eu resolvi escrever este texto sobre qualidade para dar uma luz de bom senso nisso. Assim a gente sai desta afirmação idiota que oxum é a mesma Oxum e vai para o que importa, que é entender porque nós consideramos a qualidade em um orixá. Procurei uma explicasse que também fosse diferente dessa coisa idiota de regionalizar o Orixá.

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