Exu no Candomble III
A bibliografia
Dando segmento ao assunto, quero abordar rapidamente alguma referencias bibliográficas. Eu lamento muito a ausência de novos textos no BLOG, mas, como faço isso por devoção e prazer e não por comércio, eventualmente tenho menos disponibilidade em escrever.
Lembro a todos que até o momento não abordei o que é Exu no Candomblé. Eu, até o momento, falei o que não é Exu no Candomblé, justamente para poder caracterizar a baixaria e até mesmo patifaria que se faz com este tema hoje em dia.
Muita gente se interessa em fontes para que elas mesmas possam fazer seus estudos e interpretações, para estas pessoas, seguem dicas.
Avaliando a literatura nacional sobre Candomblé temos poucas referências. Iniciando por Verger, nos livros "Orixás" e "Notas sobre o culto de Voduns e Orixás" ele faz um trabalho sem significância. É uma abordagem boba, com poucas informações e que nada acrescenta ao entendimento do que seja a figura de Exu na religião Yoruba. Assim, não adiante procurar em Verger este entendimento.
Os demais livros de Candomblé, que não são muitos, sendo de autorias de babalorixás (os piores, com raras exceções) ou de antropólogos (herméticos e não feitos para o público comum entender), não valem a pena listar, uma vez que são igualmente sem relevância para quem busca entendimento. No máximo o que aparece é o lugar comum de comparar Exu a um arteiro inconsequente, incluindo o mito em que Exu aparece com o tal chapéu vermelho e preto. Esta é uma história tão conhecida como também boba e mal interpretada. Assim esqueçam.
A melhor referência, em português, ainda é o livro Os Nago e a Morte, de Juana Elbein, na minha opinião, é claro, porque tem uma abordagem ampla e equivalente as abordagens estrangeiras. Outro livro bom é "o duplo e a metamorfose", de Monique Augras. Contudo este livro é bastante influenciado pelo Os Nago e Morte.
O livro de da Juana, é um acontecimento no Candomblé. Todo mundo conhece ou fala. Pouca gente comum de Candomblé leu. Os acadêmicos ligados ao assunto não gostam, mais por conta da relação que tem com a autora. O título do livro tem pouco haver com seu conteúdo, ela se dedica na realidade a falar de Orixás, analisando e interpretando o seu simbolismo, provavelmente na primeira abordagem feita dessa maneira o que causou a ira (ou ciúme) de Verger e de Exu no qual ela se alonga quase todo o livro. Do significado da morte para os Yoruba (ou Nago) muito pouco ou nada e de Egungun um pouco.
Verger estrutura muito bem suas críticas, assim como Juana estruturou muito bem o seu livro, como o Próprio Verger reconhece. A questão é que parte das críticas esta ligada a aspectos pessoas da Juana que não conhecemos, uma vez que ele questiona o método que ela usava para obter depoimentos que confirmassem suas teses. Verger por sua vez se colocava angelicalmente como o antropólogo dedicado a apenas relatar o que pesquisava da forma como ouvia. Não tenho elementos para dizer se ele era assim, mas, se o fosse certamente será o primeiro antropólogo que assim procede, deve então receber um busto no Hall da Fama.
Certamente Juana procurou no sue trabalho fazer uma abordagem distinta da de outros. Verger também assim o fez quando procurou de fato as informações corretas e destruiu teses erradas que se alastravam aqui no Brasil no Candomblé. Por exemplo um dos expoentes do assunto Candomblé já foi Nina Rodrigues que era descrito como uma pessoa preconceituosa em relação aos negros. Dessa forma Verger fez um excelente trabalho para nós, um marco. Teve que dedicar a maior parte do seu tempo trazendo esclarecimento.
Contudo, tenho que concordar com a tese de Juana em sua resposta à Verger quando ele o acusa de relegar a religião africana a um primitivismo ingênuo e desorganizado. Somente recentemente vi o texto de resposta da Juana a Verger, mas, tenho que reconhecer que minha visão sobre a abordagem e críticas a Verger que ela fez são as mesmas que tenho. A religião Yoruba é uma religião sofisticada sim, está longe de ser uma coisa rural, animista e desordenada. Essa estruturação traz admiração a todos que a conhecem. Vi o livro de um autor que analisava religiões africanas em geral e a pessoa quando comentou sobre a religião Yoruba teve que reconhecer que, mesmo sem ser profundo conhecedor (não poderia o ser) ela estava muito acima do patamar que o seu nível de observação notava das demais.
Idowu e Mbit são exemplos de africanos que passando por uma dificuldade absurda conseguiram publicar livros que buscavam trazer esta visão sistêmica. É natural que pessoas aqui no Brasil, a partir do trabalho esclarecedor de Verger, busquem um outro rumo para suas abordagens, um rumo que ou Verger não teve tempo de fazer ou não teve motivação. Por exemplo cito o trabalho de Verger sobre o culto de Iyami que até hoje é a melhor obra sobre o tema. Neste trabalho ele além de citar os versos ele faz analises excelentes. Gostaria que ele tivesse dedicado mais tempo ao tema, mas, mesmo assim nada que preste foi feito depois dele.
Juana pode ter sido a precursora de outros autores que deram um rumo um pouco diferente buscando um entendimento estrutural e sistêmico que toda religião tem que ter. Sempre vai existir uma distância entre a verdade, o fato e o que um Antropólogo escreve. Sempre foi assim e sempre será. Ainda hoje ocorre o mesmo, com gente ruim escrevendo, com gente que não entende sobre o que escreve, com gente que estabelece sua ideologia e procura fontes para justificar isso.
Para as pessoas da religião que querem entendê-la de uma maneira que seja útil para o dia a dia, deve se ter sempre um cuidado muito grande com o que se lê, seja de Verger, seja da Juana seja de quem for.
Considerando que fiz algumas críticas a autores de livros sobre Candomblé eu preciso fazer alguns comentários. Dos autores nacionais, além dos já citados, Reginaldo Prandi tem uma obra ampla com livros muito bons, gosto muito do trabalho que ele faz. José Flávio, já falecido, é outro com livros bons, mas muito pontuais em alguns assuntos. José Beniste, que não é acadêmico é sem dúvida o melhor autor nacional sobre o tema. Além de ser uma pessoa que faz parte ativa da religião é dedicada e muito cuidadosa, tudo dele é bom.
Saindo da lingua nativa, "Olodumare, God in Yoruba Belief", de Idowu, traz uma abordagem reduzida, porém sem a influência ruim da diáspora e já traz Exu como um elemento importante do cosmo Yoruba. "Yoruba beliefs and sacrificial rites", de Omosade, também segue a mesma linha, mas o seu conteúdo é muito influenciado pelo livro do Idowu.
Os livros mais antigos sobre a religião, feitos por Idowu, Mbiti, Omosade e Parrinder são muito similares entre si. Cada um acrescenta novas informações ao contexto religioso, mas entre si, parecem ser referencias cruzadas.
A melhor abordagem para Exu, vem com o livro do Wande Abimbolá, "Ifa an exposition of Ifa literary corpus". Nele, no estilo de Ifá, através de versos de Odu, Abimbolá explica a real natureza de Exu. O filho dele, Kola Abimbola, escreveu um livro chamado "Yoruba Culture", no qual mostra o cosmo Yoruba. Esta é uma visão moderna e integrada do Cosmo, compartilhada com seu pai.
Na coleção "Ifism", Osamaro Ibie, também traz uma visão muito mais lúcida de Exu. No que pese ele ter, pessoalmente, ainda uma visão de Exu fortemente influenciada pelo Cristianismo, o que ele coloca nos livros traz uma visão distinta e lendo as histórias a gente passa a compreender o papel de Exu e adquire uma visão distinta da que ele expressa quando comenta.
Uma referência interessante existe no livro Yoruba Thelogy and tradition: The worship, de Ayo Salami.
Seguindo esta ordem na qual eu relacionei os livros em Inglês, você vai ter um bom auto-entendimento da posição de Exu na religião Yoruba.
Se a única opção é ler em português, então se concentre no livro da Juana. Mas tenha calma, leia devagar e várias vezes os últimos capítulos ligados a individualização, que são os ultimos.
A partir do próximo texto eu vou passar o meu entendimento sobre a figura de Exu no cosmo Yoruba. Tenham certeza de que será a minha visão e não simplesmente um copiar e colar de trechos dos livros que eu já li. Certamente esta visão estará baseada no que eu li no que eu considero a melhor visão e a mais consistente.
Não tenho vergonha em dizer que tenho muita dificuldade em ler Os Nago e a Morte, releio, volto...é uma ciência.
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