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sexta-feira, abril 03, 2015

Odù de Nascimento

Odù de Nascimento

Como se determina o Odù de Nascimento


Revisão 3 


O candomblé desenvolveu um hábito, sem sentido, de determinar Odù de nascimento através de números.

O processo é assim, a pessoa pega sua data de nascimento, faz umas contas com ela e determina um número entre 1 e 16. O número é associado a um Odù e assim você tem seu Odù de nascimento determinado por sua data de nascimento

Parece uma coisa conhecida? Sim, aplica o que chamamos de numerologia.

Contudo é uma prática sem nenhuma razão e que virou verdade apenas porque uma legião de pessoas, Babalorixás e Iyalorixás, que não entendem Ifá e, assim, não sabendo o que é um Odù, encontraram, ingenuamente, nessa numerologia uma forma de expressar o que não sabiam.

Mais ainda, não conhecem a teologia da religião.

Sim, na ausência de conhecimento e na falta de condições de buscar conhecimento se agarraram a uma coisa sem propósito (mais bem simples), que é traduzir um Odù através de uma operação aritmética.

Isso é muito simples e conveniente, porque substitui conhecimento e aprendizado por algo que qualquer criança pode fazer. Mas não tem propósito real. As pessoas em vez de aprenderem de fato, substituíram conhecimento por invenção. Claro que havia dificuldade para aprender, o conhecimento não era facilmente disponível e essa aritmética assim como outras explicações bobas sobre Odù acabaram surgindo.

Como todos passaram a adotar isso, essa aritmética idiota virou uma verdade. Sim, se todos repetem a mesma mentira, aquela mentira vira verdade no contexto daquelas pessoas. Foi isso o que ocorreu no Candomblé com essa questão de Odù.

Lembro a todos que o Candomblé inventou, sozinho um conhecimento que chamou de Ifá, incluindo Odù que é próprio dele, essa explicação estará bem detalhadas em um texto que está quase pronto.

Mas vamos ao que interessa que é a explicação de porque isso não faz sentido.

A primeira razão é teológica, Odù é um elemento que recebemos quando vamos a Olódùmarè tratar da nossa vida no Àiyé, nós estabelecemos objetivos e com isso Olódùmarè nos dá ferramentas para atingir a esses objetivos. Odù é parte dessas ferramentas, é a energia fundamental de Olódùmarè que recebemos, é o nosso axé (àṣẹ) pessoal. Esse axé (àṣẹ) que recebemos de Olódùmarè quando nos prostramos à sua frente é traduzido como um Odù.

Então atenção, o que é importante é a energia que recebemos e que é individual. Essa energia nos liga a Olódùmarè, todos nós seres vivos trazemos esta centelha divina dentro de nós que recebemos através de Olódùmarè, esta centelha divina, axé (àṣẹ), que recebemos de deus, Olódùmarè e que nos torna individuais e mais, que recebemos porque estabelecemos com ele os nossos objetivos com a nossa vinda ao Àiyé é traduzida na religião com o nome de Odù.

Tenho um texto neste blog que explica o que é Odù e quem quer entender melhor o conceito procure este texto.

Assim, vou repetir isso para ficar claro, Odù é o nome que, de alguma forma, traduz essa centelha divina que recebemos de Olódùmarè, o que é importante é que recebemos isso dele, individualmente. Essa energia nos dá capacidades diferentes em função de várias coisas, seja do nosso passado como futuro e, isso, é assim ajustado para o indivíduo que seremos no Àiyé e aos nossos objetivos.

Existe uma afirmação de que todos nascemos com um destino, mas, eu vejo de outra maneira. Não temos um destino estabelecido, temos objetivos estabelecidos, por nós mesmos e é isso que buscamos realizar na vida.

Os elementos que recebemos no órun (Ọ̀run) antes de virmos para o Àiyé são muito importantes e são consolidados no que a religião chama de Orí Inu, toscamente traduzido como nossa cabeça interior.

Não vou detalhar neste texto mais esse conceito de nascimento, o que ficará para o texto sobre a individualidade, mas, espero que fique claro que o entendimento nesta religião é que: somos indivíduos; que estabelecemos objetivos para cada vida que vivemos; que Olódùmarè nos dá elementos para essa vida; que entre estes elementos esta a ligação com um orixá (Òrìṣà); que outro elemento é sua centelha divina (axé (àṣẹ)) que é traduzida como Odù.

Assim nosso Odù de nascimento é isso, ele traduz aquilo que recebemos de Olódùmarè.

Por que ele é importante? E por que existe essa correlação entre essa energia e um Odù.

Porque no processo de nascimento nós perdemos a referência de nossas vidas anteriores e dos nossos objetivos. O processo de nascer de novo no Àiyé não permite que a gente traga isso do órun (Ọ̀run). Essa é a explicação mais simples que eu posso dar.

Observem que nós não somos apenas transportados do órun (Ọ̀run) para o Àiyé, são dimensões diferentes, não existe mais uma comunicação entre essas 2 dimensões e a forma que vir para o Àiyé é nascer de novo e esse processo não nos permite trazer junto todas as nossas lembranças e objetivos.

No Odù Ìworì Méjì existe uma explicação teológica (metafórica) para isso que um dia vou abordar. É uma história, como muitas e que requer uma análise para ser entendida, metáforas e parábolas traduzem uma ideia e não um fato literal. Mas ela justifica o seguinte: os 2 espaços são separados (órun (Ọ̀run) e Àiyé); não podemos ir e vir entre os 2 espaços; ao existir essa separação não foi possível trazermos do órun (Ọ̀run) conhecimentos prévios que tínhamos; nosso sucesso dependerá do nosso desempenho na vida sem essa ajuda.

A questão é o processo de nascimento não permite carregarmos de forma explícita o conhecimento do que estabelecemos para esta nossa nova vida.

É neste momento que entra o oráculo de Ifá. Ele é o único elemento de comunicação entre o órun (Ọ̀run) e o Àiyé. É através dele como informamos a Olódùmarè nossos problemas e através dele que recebemos ajuda, visto que Olódùmarè tem um compromisso, uma aliança com o nosso sucesso em nossa vida. O oráculo é parte desse compromisso.

Assim, apesar de não termos a capacidade de lembrar o que estabelecemos para a nossa vida, o oráculo de Ifá nos permite acessar isso e através deles obtermos orientação de como proceder.

A razão disso, teológica, é que Órunmila (Ọ̀rúnmìlà) é a divindade que é testemunha de nossa conversa com Olódùmarè, antes de nascermos.

Os yorùbá tem uma figura de construção que o universo é uma grande cabaça com 2 metades. Uma das metades é o mundo espiritual, o órun (Ọ̀run) e a outra metade é o Àiyé o mundo físico. Muitos devem conhecer esse conceito relacionando eles a duas divindades, mas, esqueçam isso, entendam, é isso que eu estou explicando agora, o universo é composto de 2 espaços. No meio deles, ligando um ao outro fica o opon (Ọpọ́n Ifá), o instrumento do Bàbáláwo que liga e permite a comunicação entre eles.

Pode parecer uma ideia pretensiosa junto aos outros cultos, mas esse é o conceito teológico que Ifá estabelece. O universo é a cabaça, as 2 metades são separadas e unindo ela existe o opon (Ọpọ́n Ifá) que nos permite interagir.

Isso tudo faz todo o sentido teológico para mim, justifica o oráculo de ifá, seu objetivo e seus instrumentos. Mais do que apenas dogmas e mitos a religião tem que ter consistência no que propõe como modelo.

Então, continuando nossa saga pelo Odù de nascimento, como o que recebemos de Olódùmarè como centelha divina é uma energia que pode ser traduzida como um Odù, então o oráculo de Ifá pode nos ajudar a entender os nossos objetivos na vida porque ele tem a capacidade de se comunicar com a gente através de Odù.

Fica claro o conjunto?

De novo, recebemos de Olódùmarè uma centelha vital que vai ao encontro de nossos objetivos de vida, os objetivos que pedimos a ele. Essa centelha vital pode ser traduzida como um Odù. Órunmila (Ọ̀rúnmìlà) é divindade no controle do oráculo de Ifá e foi testemunha desta conversa e o oráculo de ifá se comunica como Bàbáláwo através de Odù.

Assim, através de Ifá podemos saber que Odù recebemos para a nossa vida, o Odù de nascimento, e através do entendimento deste Odù podemos ter pistas dos objetivos que estabelecemos para a nossa vida.

A determinação do Odù de nascimento de uma pessoa SOMENTE pode ser feita entre o terceiro e o oitavo dia de nascimento. Ela é realizada por um Bàbáláwo porque é o único que pode usar o oráculo de Ifá. Não pode ser realizada depois disso.

Assim, somente neste período pode ser saber o Odù de nascimento. Quem não fez isso neste período nunca mais saberá o Odù de nascimento. Quem quiser saber o Odù de nascimento do seu filho que procure um Bàbáláwo neste período. Depois disso não é mais possível.

Por que um Babalorixá (Bàbálórìṣà) não pode fazer isso? Porque ele não tem o poder para trabalhar com os 256 Odù e o Odù de nascimento não é apenas um dos 16 principais e sim um dos 256 Odù.

Existem 2 cerimônias importantes que um recém-nascido deve passar através de Ifá que visam determinar o Odù de nascimento e também a ascendência daquela criança (se pelo lado da mãe ou do pai), seus orixá (Òrìṣà).

Uma vez entendido isso vamos a parte das negativas.

Não existe o menor sentido de associar o dia de nascimento ao Odù de nascimento. Isso não faz sentido TEOLÓGICO. Você recebe o Odù de Olódùmarè e isso não está associado a dia que você nasce.

Esta é uma coisa determinada previamente a sua vida, fase de planejamento da vida e não será determinada pelo acaso do dia de nascimento.

Baseado nas explicações que dei qual o sentido de o dia do nascimento determinar o seu Odù? No meu entender nenhuma.

Considerando que as pessoas não nascem mais de forma natural, qual o sentido de o dia de nascimento significar alguma coisa?

Quando eu aprendi Yorùbá e depois Ifá, entendi que aquela aritmética não tem o menor sentido para os yorùbá.

Então, a primeira informação para quem quer aprender: NÃO se determina Odù através de números. A segunda informação: não existe relação entre Odù e números.

Em Ifá, que é o oráculo original, não se usam números, apenas símbolos gráficos. Sem dúvida Odù envolve alguma complexidade. Não é um significado simples, é um contexto, com um significado complexo, mas, não é complicado, entretanto não vamos tratar desse significado aqui, apenas da forma como se apresenta.

Em Ifá, um Odù é determinado usando-se somente 2 tipos de instrumentos sagrados: o opele (Ọ̀pẹ̀lẹ̀) e os ikins. A manipulação destes instrumentos de Ifá vai materializar a representação de um Odù no Aiye, e esta representação se traduz por uma marca gráfica, composta por 2 colunas. Cada coluna tem 4 elementos e esses elementos podem ser 1 traço vertical sozinho ( I ) ou 2 traços juntos ( II ). No total, 8 elementos gráficos, em 2 colunas, lado a lado, formam um Odù.

Essa é a representação de um Odù.

O processo para determinar isso é manual. Feito pelo Bàbáláwo e por seus instrumentos. A manipulação do instrumento gera uma figura e esta figura recebe uma representação gráfica.

Não existe dentro de Ifá, seja com o ikin ou com o Opele nenhuma correspondência de número com Odù. Não existe nenhuma forma de se determinar um Odù através de um número. O Odù nasce, sempre, como uma marca gráfica composta. Se existe um número associado a Odù, estes seriam 1 e 2, usados para contar os ikins... e estariam associados a todos os Odù, mas isso apenas para criar as marcas gráficas.

Sob o ponto de vista da sociedade Yorùbá, não existe aritmética decimal. Números são substantivos, palavras.

Em nenhum momento, qualquer Odù, é associado e um número.

Essa relação foi inventada fora de Ifá, fora da religião Yorùbá, provavelmente no novo mundo (ilação minha). Isso é apenas uma prática de numerologia. Eu não tenho como entrar no mérito ou não dos que acreditam ou praticam numerologia, pelo contrário, existe uma mística sobre números enquanto símbolos. Mas no que diz respeito à religião Yorùbá isso não ocorre.

Os números são palavras, substantivos e a aritmética é coisa de árabes.

Em algum momento da história alguém associou uma coisa a outra, tenho quase certeza que isso é bem recente e está ligado ao uso dos búzios uma vez que em Ifá não existe como se associar número a Odù. Por isso que eu digo que deve ter surgido no novo mundo. Aqui nas tradições da diáspora, os jogos de búzios são muito populares.

Dessa maneira, concluindo essa abordagem de números: não existe nenhuma relação entre um Odù e um número; os yorùbá não tinham aritimética, elas não faziam contas de somar; um Odù é uma representação gráfica e os instrumentos do Bàbáláwo não usam números.

Desta forma não existe nenhuma possibilidade de os yorùbá terem criado uma ligação com data de nascimento de um calendário gregoriano, que eles nunca conheceram, com um Odù através de uma aritmética criativa.

Como explicado anteriormente não existe base teológica que justifique que o Odù de nascimento seja determinado somente na hora do nascimento.

Vamos para o próximo passo nesta explicação.

A determinação do Odù de nascimento somente pode ser feita em uma data específica e pelo Bàbáláwo porque são eles que usam Odù no oráculo de Ifá.

Existe uma cerimônia para isso e pouca gente conhece. Assim tenha certeza que a pessoa sabe do assunto, seja ele cubano ou africano.

Quem lida como os 256 Odù é o Bàbáláwo. Assim Babalorixá (Bàbálórìṣà) e Iyalorixá (Ìyálòrìṣà) não tem iniciação para lidar com os 256 Odù e muito menos determinar Odù de nascimento seja através de continhas como de jogo de búzios.

Se essas pessoas estão fazendo isso por ai é porque elas são ou estão mal informadas, não entendem corretamente a teologia da religião. Podem ter aprendido que isso era possível de ser feito assim e estão seguindo com isso.

Mas cuidado, tem Bàbáláwo que diz que determina o Odù de nascimento em consulta comum de ifá, mas, está apenas enganado ou enganando. Vamos entender que se ele diz que faz isso ele não entendo sobre o que está falando.

Da mesma forma não acredite também em Bàbáláwo que determina seu orixá em jogo. Isso é uma idiotice tão grande quanto os Babalorixás que fazem a mesma coisa com búzios.

Lembrem-se, Babalorixá (Bàbálórìṣà) ou Iyalorixá (Ìyálòrìṣà) não determinam Odù e dessa forma não podem determinar o Odù de nascimento. Como o Odù de nascimento só pode ser determinado no nascimento, qualquer pessoa que diz que faz isso depois do nascimento através de jogo de búzios ou mesmo de Ifá está mentindo.








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